Projecto de Resolução N.º 253/XII

Recomenda ao Governo a adoção de medidas de combate aos efeitos da crise no setor cultural

Recomenda ao Governo a adoção de medidas de combate aos efeitos da crise no setor cultural

A produção artística e cultural é um elemento fundamental para a concretização do projeto constitucional e para a materialização de uma vertente democrática que o Partido Comunista Português considera basilar, a Democracia Cultural.

O atual Governo, a pretexto da crise internacional do sistema capitalista, faz produzir constrangimentos em todas as esferas da vivência democrática através de limitações diretas e indiretas, quer seja pela via da legislação, quer pela da diminuição crescente do financiamento a um vasto conjunto de serviços públicos.

O Serviço Público de Artes e Cultura em Portugal está submetido a uma estratégia de desfiguração e de desmantelamento, subordinadas que estão todas as opções políticas dos sucessivos Governos, sejam conduzidos por PSD ou PS, com ou sem o CDS, aos grandes interesses privados que encontram na livre produção e fruição cultural e artística um obstáculo ao seu projeto de domínio económico e de hegemonia ideológica. A total mercantilização da cultura, a massificação de uma monocultura orientada exclusivamente para o empobrecimento da criatividade individual e coletiva e para a obtenção de lucro, são opções do atual Governo que convivem mal com um tecido cultural vivo e atuante, crítico e interventivo, livre e popular.

O Serviço Público de Artes e Cultura tem uma forte componente de financiamento público, através do Orçamento do Estado, às estruturas de criação artística e à produção cinematográfica. O Estado não é programador cultural – salvo conhecidas e importantes exceções – mas é o garante da liberdade de criação e, consequentemente, de programação. Através do apoio do Estado às estruturas artísticas é assegurada a independência e autonomia da criação artística e cinematográfica dos interesses privados ou das lógicas estritas de mercado. É aliás, esse apoio do Estado à produção e fruição culturais, o único garante da capacidade de inovação nos padrões de fruição artística, permitindo uma evolução constante que tenderá a desacelerar perante constrangimentos orçamentais que inviabilizam a existência de muitas companhias, grupos e outras estruturas. Através de limitações orçamentais, o Governo procede a uma verdadeira censura financeira à liberdade de produção cultural.

Fruto dessas políticas de desvalorização das expressões culturais populares, do trabalho artístico e criativo, tende a consolidar-se uma certa hegemonia mercantil, dominada por grandes empresas que, muitas vezes, tampouco respeitam os direitos de milhares de autores, atores, bailarinos, intérpretes e técnicos.

Como agravante do cenário descrito, surge o desaproveitamento de fundos comunitários para a área da Cultura, devido especialmente a opções políticas mas também a uma incapacidade e desajuste vocacional das estruturas das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional. Projetos de programação artística, formação de técnicos, divulgação e produção artística, que significam compromissos com terceiros, ficam muitas vezes congelados por atrasos ou inexistência de respostas administrativas por parte destas estruturas desconcentradas de Governo.

Só uma rutura com o curso de submissão e com o Pacto de Agressão assinado entre PS, PSD e CDS e FMI/UE poderá criar as condições para uma alteração significativa no rumo da política cultural praticada em Portugal pelos sucessivos Governos. No entanto, respostas imediatas a preocupações sentidas e à evidente instabilidade que se sente no tecido cultural e artístico podem ser dadas, impedindo que se venha a verificar um encerramento em massa de diversas estruturas, companhias, grupos e projetos cinematográficos que se encontram em perigo na sequência das políticas assumidas pelo atual Governo até à data.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República os Deputados abaixo- assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo que:

1. Realize, em conjunto com as estruturas de criação artística, um levantamento das necessidades de cada uma dessas estruturas, atualizado anualmente e sobre o qual seja elaborado e divulgado relatório anual.

2. Crie um mecanismo de financiamento anual para os custos de estrutura a acrescer ao financiamento plurianual previsto na legislação em vigor, com base no referido relatório e mediante prestação de contas das estruturas de criação artística.

3. Assuma nas responsabilidades plurianuais do Estado perante as estruturas de criação artística, todos os compromissos e estabeleça prazos de reembolso faseado dos montantes até aqui diminuídos a estes contratos.

4. Crie um Grupo de Trabalho que envolva as estruturas de criação artística e organizações representativas de trabalhadores do setor, a funcionar junto do Secretário de Estado da Cultura, para elaborar uma proposta de fórmula de financiamento, de acordo com o número anterior.

5. Crie as condições para que no próximo ano aumentem substancialmente as verbas de investimento programado da DGArtes e do ICA, para financiamentos através de contrato-programa, particularmente tendo em conta a possibilidade de utilização de verbas provenientes de fundos comunitários e o seu previsto aumento a partir de 2014.

6. Aumente a capacidade de fiscalização da Autoridade para as Condições do Trabalho e a incidência da sua ação inspetiva no sector das artes e do espetáculo, nomeadamente no que toca à fiscalização da aplicação do Regime Jurídico previsto na Lei n.º 4/2008, de 7 de Fevereiro.

7. Crie os mecanismos necessários para o imediato desbloqueio de financiamentos e reembolsos a projetos aprovados no âmbito de fundos comunitários a estruturas de programação e de produção artística e cultural.

Assembleia da República, em 9 de Março de 2012

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