Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

"PSD e CDS preparam-se para aprovar um assalto aos reformados e pensionistas"

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Estabelece mecanismos de convergência do regime de proteção social da função pública com o regime geral da segurança social, procedendo à quarta alteração à Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, à alteração do Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de dezembro, que aprova o Estatuto da Aposentação, e revogando normas que estabelecem acréscimos de tempo de serviço para efeitos de aposentação no âmbito da Caixa Geral de Aposentações
(proposta de lei n.º 171/XII/2.ª)

Sr.ª Presidente,
Sr. Secretário de Estado,
Imagine que deposita todos os meses, durante toda a sua vida de trabalho, 30 ou 40 anos, uma parte do seu salário para a sua reforma e entrega esse valor a uma entidade em quem confia: o Estado português.
Imagine que agora está aposentado, que lhe foi atribuída uma pensão de reforma e que ajusta a sua vida em função do rendimento que lhe foi atribuído pelas regras legais em vigor.
Imagine também que vem este Parlamento retirar 10% da sua reforma para a qual poupou durante toda uma vida de trabalho.
Pergunto: sentia-se ou não roubado com esta proposta de lei, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Secretário de Estado fala das regras de atribuição, fala dos problemas financeiros da Caixa Geral de Aposentações de uma forma pouco rigorosa — e já falaremos nisso na nossa intervenção de fundo.
Pergunto: os reformados aposentaram-se de acordo com as regras legais em vigor? Quem é que criou essas regras legais? A situação financeira da Caixa Geral de Aposentações é culpa dos trabalhadores, Sr. Secretário de Estado? Que culpa têm os trabalhadores pela situação criada? Que legitimidade tem o Governo para roubar 10% das reformas dos atuais e futuros reformados?
Sr. Secretário de Estado, terceiro conjunto de perguntas. O Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas, numa já célebre conferência de imprensa sobre as pensões de sobrevivência, deu a entender que estas pensões apenas seriam cortadas a partir dos 2000 €. É ou não verdade que uma pessoa que receba da Caixa Geral de Aposentações uma pensão de sobrevivência de 500 € vai ter um corte de 10% sobre essa mesma pensão?
(…)
Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
A presente proposta de lei, que o PSD e o CDS se preparam para aprovar, é um assalto aos reformados e pensionistas da Administração Pública deste País.
O Governo não usa uma arma de fogo ou, sequer, uma faca, mas usa uma lei para tirar aos reformados e pensionistas do nosso País algo que não lhe pertence.
A verdade é que o Governo PSD/CDS quer cortar nas atuais e futuras reformas dos trabalhadores da Administração Pública, que descontaram todos os meses para o direito a uma reforma digna.
Alterar a fórmula de cálculo das reformas para cortar 10% nas futuras reformas e 10% nas reformas superiores a 600 € que já estão a ser pagas, ou seja, retroativamente, é uma imoralidade, é indecente, é um roubo.
Com a presente proposta de lei, PSD e CDS estão a violar um contrato de uma vida inteira de trabalho e descontos. Estão a violar a segurança e a confiança depositadas no Estado por milhares de trabalhadores.
Assim, não temos qualquer dúvida em afirmar que a presente proposta de lei viola, de forma grosseira, a Constituição da República Portuguesa.
Importa também lembrar que o Governo violou a Constituição ao não respeitar o direito à negociação coletiva suplementar, enviando este diploma para a Assembleia da República antes de fechar o processo de negociação com os sindicatos.
Além de cortar nas reformas a partir dos 600 €, o Governo PSD/CDS corta também nas pensões de sobrevivência pagas pela Caixa Geral de Aposentações, não a partir dos 2000 €, anunciados pelo Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas, mas, sim, a partir dos 419 €.
É isto que está na lei e isto não foi desmentido pelo Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.
Este caminho não tem qualquer justificação, não tem qualquer sentido de justiça e tem apenas como consequência agravar a pobreza entre os reformados.
Se, agora, cortam 10% nas reformas e nas pensões de sobrevivência, no Orçamento do Estado, mantêm a dita contribuição extraordinária de solidariedade, mantêm o saque fiscal, que afeta, e muito, os reformados, mantêm congeladas grande parte das reformas, aumentam a idade de reforma de todos os trabalhadores do nosso País e, entre outras medidas, aumentam o custo de vida. Assim, o efeito conjugado destas medidas implica cortes nas reformas na ordem dos 20% ou, mesmo, 30%.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao contrário do que o Governo afirma, a presente proposta de lei não faz qualquer convergência com o regime previsto na segurança social nem sequer trata de garantir a sustentabilidade financeira da Caixa Geral de Aposentações. Esta proposta de lei é mais um violento assalto aos rendimentos dos reformados, que descontaram uma vida inteira de trabalho.
Quanto ao défice da Caixa Geral de Aposentações, importa repor a verdade. E a verdade é que o Estado, por via de sucessivos Governos, não entregou os descontos que devia ter entregue.
Outra razão para a descapitalização da CGA prende-se com o facto de, por opção do Governo, este ser um regime fechado, onde não são admitidas novas inscrições desde 2005, logo, não aumentam as contribuições e as despesas não param de subir.
E, por fim, entre muitas outras razões, importa salientar que foi por opção de sucessivos Governos que diversos fundos privados ou, melhor, prejuízos privados entraram na Caixa Geral de Aposentações, acumulando um passivo que, apenas com o fundo de pensões da PT, representa mais de 331 milhões de euros em 2012.
Assim, não só é falsa a argumentação da descapitalização, como o é a da convergência. Os trabalhadores da Administração Pública ficam com um regime pior do que existe na segurança social. Repito: os trabalhadores da Administração Pública ficam com um regime bem pior do que o que existe na segurança social.
Independentemente disso, podemos afirmar que os trabalhadores não têm qualquer culpa, pelo que não devem ser eles a pagar os problemas.
Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Pagar as reformas que são devidas aos trabalhadores não é uma despesa, é uma obrigação. As pessoas descontaram e, aquando da sua reforma, têm o direito a receber o que lhes é atribuído pelas regras existentes na altura.
Aos reformados dizemos que há alternativas. Em vez de se cortar 10% nas reformas, corte-se 10% nos swaps, corte-se 10% nas PPP multimilionárias, corte-se 10% no BPN, no BPP ou no BANIF, corte-se 10% ou mais nos juros agiotas ou nos benefícios fiscais da banca e dos grandes grupos económicos.
PSD e CDS não tocam nestes grandes grupos económicos, porque verdadeiramente estão ao seu serviço e é por isso que roubam a quem menos pode e menos tem para entregar de mão beijada aos mais ricos e poderosos do nosso País, dinheiro que é de todos.

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