Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Prescrição por DCI como regra no Serviço Nacional de Saúde

Institui a prescrição por DCI como regra no Serviço Nacional de Saúde
(projecto de lei n.º 464/X/I2.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O PCP, há muitos anos, tem vindo a propor nesta Assembleia iniciativas para instituir a prescrição por princípio activo como regra também no ambulatório, tal como já se verifica no internamento hospitalar.
Aliás, a primeira vez que a legislação referiu como regra, embora muito mitigada, a prescrição por DCI foi na Lei n.º 14/2000, exactamente na sequência de um projecto de lei do PCP, apresentado na VIII Legislatura, o qual recuperava um outro que foi apresentado na VII Legislatura.
Por isso, dizemos que sim. É vantajoso, é útil, é necessário instituirmos a prescrição por denominação comum internacional, por nome genérico, por princípio activo no nosso Serviço Nacional de Saúde, em todas as suas vertentes, designadamente no ambulatório.
Sabemos que a instituição da prescrição por DCI não é nenhuma solução milagrosa para todos os problemas da política do medicamento, mas também sabemos que, ao contrário do que alguns dizem, ela não é nenhuma solução diabólica que vai deixar em grande crise a situação do consumo de medicamentos, a situação do tratamento dos medicamentos.
Entendemos que deve haver uma excepção, sim, para as situações em que fundamentadamente os médicos entendam que não é mesmo possível abdicar de um medicamento de determinada marca. Mas isso deve ser uma excepção e não uma norma de tal maneira instituída que transforme a excepção em regra.
Consideramos, ainda, que, nesta situação, o preço de referência deve ser o preço de venda ao público que o medicamento receitado e imposto pelo médico efectivamente tem, para que o utente não seja prejudicado por uma decisão que não é sua.
Sabemos que, ao longo dos últimos anos, houve algum avanço no consumo de medicamentos genéricos e até houve algum avanço em matéria de prescrição por princípio activo por parte de um conjunto de médicos, mas estamos muito aquém daquilo que é necessário.
Sabemos, ainda, que se exigimos garantias, a montante, no processo de prescrição até à venda do medicamento, também temos que ter garantias, a jusante.
Não queremos que aquilo que pode ser o condicionamento do uso de determinado medicamento no
momento da prescrição se transfira agora para o momento da venda. Por isso, é preciso — temos algumas soluções no nosso projecto, outros partidos também têm, acho que as devemos discutir em comissão, na especialidade — que se encontre um sistema de pesos e contrapesos para garantir que ninguém se apropria da decisão que deve ser do utente, e esse é o ponto fundamental.
No nosso projecto, apresentamos, igualmente, uma diferenciação entre a entrada em vigor destas normas para os princípios activos onde há medicamento genérico e os princípios activos onde não há medicamento genérico.
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Também queria referir-me a esta informação do Sr. Deputado Rui Prudêncio para dizer que, nesse comunicado, falta indicar que parte dessa diminuição de despesa foi transferida para os bolsos dos utentes, dos doentes, e muitos deles não gastaram mais dinheiro pela simples razão de que deixaram de poder comprar esses medicamentos.
Sobre os outros projectos de lei que estão em debate, quero dizer que apoiaremos o do Bloco de Esquerda, que é diferente do nosso mas que vai no mesmo sentido, bem como o do PSD, para possibilitar uma discussão na especialidade, embora sem deixar de dizer que, com tanta excepção no projecto de lei do PSD, quase que faz lembrar aquela frase do Churchill e também a canção do Sérgio Godinho que para o PSD a prescrição por DCI é o melhor de todos os sistemas, à excepção de todos os outros.
É a sensação que dá, ao ler o projecto de lei do PSD.
Finalmente, queria dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que aquela DCI que está prevista na lei e de que o PS tanto fala é uma DCI de contrafacção! Porque uma DCI que, a seguir, põe a marca não é uma verdadeira prescrição pelo princípio activo! É uma prescrição por marca, que também tem o princípio activo, e essa é a diferença entre o que está em vigor e aquilo que nós propomos.
Por outro lado, queria também dizer ao Sr. Deputado Rui Prudêncio que, pela nossa parte, entendemos que essas fundamentações devem ser fiscalizadas. Quem fiscaliza — perguntava o Sr. Deputado. É o INFARMED. Como fiscaliza? Está previsto no nosso projecto de lei: por amostragem das fundamentações, feitas nas excepções invocadas pelos médicos. E isso não é desrespeito pela autoridade dos médicos, é um procedimento normal de qualidade na prescrição, que, aliás, já devia existir, com DCI ou sem DCI, há muito tempo no nosso País.
O problema é que rejeitar a prescrição por DCI é trazer mais despesa para o Estado e, em simultâneo, mais despesa para os utentes.
E é isto que o PS continua a defender, é isto que o PS continua a querer. Veremos se, com estas iniciativas legislativas, conseguimos chegar a um bom ponto de equilíbrio entre os diversos interesses em presença, mas que defenda, sobretudo, o interesse público e o interesse do utente, que é esse o objectivo do projecto de lei do PCP.

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