Projecto de Resolução N.º 277/XII

Preços máximos nos combustíveis, travar a especulação

Preços máximos nos combustíveis, travar a especulação

1.A IMPARÁVEL ESPIRAL DOS PREÇOS DOS COMBUSTÍVEIS

Na segunda-feira, 26 de Março tivemos uma descida no preço dos combustíveis de um cêntimo no valor da gasolina e no gasóleo. Na segunda-feira, 2 de Abril tivemos uma subida de 2,5 cêntimos na gasolina e nova descida do gasóleo de 0,5 cêntimos. No entanto estas flutuações verificam-se num percurso de ascensão e sentido único, de brutal agravamento dos preços. Desde o início do ano que o preço do litro do gasóleo subiu 6.7%, enquanto a gasolina 95 subiu 11.0%. No seu conjunto, os combustíveis líquidos subiram em média nestes últimos 3 meses 9%. Em 2011 a subida do valor médio relativamente a 2010 do litro do gasóleo foi de 19,2%, enquanto a gasolina 95 subiu 12,6%, quando o IPC variou de 3,7%!

Estamos perante os mais altos preços dos combustíveis de sempre, ultrapassando-se os valores de 2008!

Os preços em Portugal dos combustíveis líquidos, continuam a ser dos mais elevados entre os países da União Europeia, sendo em geral, superiores à média dos preços comunitários em euros, e antes e depois de impostos/taxas. Se os preços forem expressos em PPC - Paridades de Poder de Compra, os valores em Portugal serão ainda mais elevados.

Segundo a APETRO (Informação, 11Março2012) na análise dos preços médios em 2011, “No conjunto dos 27 países da União Europeia, Portugal apresentou em relação à gasolina, o 6º preço médio sem impostos (…).Em relação ao preço com impostos, Portugal apresentou o 5º preço médio (…). No preço da gasolina sem impostos, Portugal esteve 0,030 € por litro acima da média da UE, e 0,019 € por litro acima da média da zona Euro. No preço da gasolina com impostos, esteve 0,053 € por litro acima da média da UE e 0,034 € por litro acima da média da zona Euro. Em relação a Espanha, Portugal apresentou um preço médio antes de impostos na gasolina muito semelhante, inferior em 0,001 € por litro. O preço com impostos em Espanha foi de 1,139 € por litro, ou seja menos 0,227 € por litro do que em Portugal. (…)

No caso do gasóleo rodoviário, em relação ao preço sem impostos, Portugal apresentou o 3º preço (…). Em relação ao preço com impostos apresentou o 10º (…). No preço do gasóleo sem impostos, Portugal esteve 0,048 € por litro acima da média da UE e 0,041 € por litro acima da média da zona Euro. No preço do gasóleo com impostos, esteve 0,002 € por litro acima da média da UE e 0,019 € por litro acima da média da zona Euro. No caso do gasóleo, Portugal apresenta mais 0,048 € por litro no preço sem impostos em relação a Espanha. (…). Em relação ao preço com impostos, Portugal está 0,103 € por litro acima do de Espanha (…)”

Desde 2003, com a privatização da GALP e a liberalização dos preços dos combustíveis, que o povo português e a própria atividade económica estão sujeitos ao contínuo agravamento dos preços. Entre 2004 e 2011, a variação acumulada de preços foi de 59,4% na gasolina e 93,6% no gasóleo, para uma variação do IPC de 18,5%! Subidas de preços, que assim contribuíram para o aumento do custo de vida e a perda de rendimento e competitividade de milhares de empresas, designadamente, MPM Empresas, sectores produtivos e transportes.

2.OS “LUCROS EXCESSIVOS” DAS PETROLÍFERAS

Não é apenas no sistema electroprodutor que há, as ditas “rendas/lucros excessivos”, a que a demissão do Secretário de Estado da Energia deu visibilidade. Como o PCP há muito denuncia as “rendas/lucros excessivos” existem no negócio dos combustíveis líquidos. Um mercado monopolizado/oligopolizado na produção e na distribuição grossista e de retalho, por empresas, cujas faces mais visíveis em Portugal são a GALP, a REPSOL, a BP e a CEPSA/TOTAL, pertencentes a grupos monopolistas, nacionais (onde se destaca o Grupo Amorim) e estrangeiros. As quatro empresas em 2009, representavam no retalho, em volume 76% e em valor 78%, do consumo, sendo que a GALP por si só significava, respetivamente, 36% e 37%!

Rendas que garantem e tornam absolutamente intocável e constante o escandaloso lucro das empresas petrolíferas. A GALP, obteve em 2011, 591,0 milhões de euros de lucros, depois dos 611 milhões de euros de lucros em 2010, tendo entre 2004 e 2011 arrecadado 5 342,3 milhões de euros!

Mais do que qualquer “eficácia de gestão”, estes lucros representam a descapitalização do sector produtivo, o esbulho dos orçamentos familiares, a fragilização da competitividade do país.

A vida confirmou como era falso o argumento de que a liberalização do setor – como querem agora impor na energia elétrica e no gás natural - traria a baixa dos preços. O que continuamos a assistir, é a cartelização monopolista/colusão tácita de preços, já que os preços praticados são idênticos entre os diferentes fornecedores e as empresas acompanham-se umas às outras. Mas com a liberalização melhoraram significativamente os resultados das petrolíferas. A GALP quintuplicou a média anual dos lucros, do período 2000/2003 (138,8 milhões de euros) para o período pós-liberalização, 2004/2011 (667,8 milhões de euros)!

Se tudo continuar como está – com as diversas dinâmicas especulativas em torno do preço do petróleo à escala internacional - o PCP não tem dúvidas de que para manter intocáveis e até alargar os lucros das empresas petrolíferas que operam em Portugal, o custo do litro da gasolina poderá ultrapassar este ano os dois euros e o do gasóleo 1,7€.

3.A INACTIVIDADE E IMPOTÊNCIA DO GOVERNO E DA AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA

Perante a subida vertiginosa dos preços dos combustíveis a Autoridade da Concorrência continua a fazer um discurso conhecido “não é uma situação que permita verificar a violação das regras da concorrência” e o Governo apesar das sucessivas declarações do Ministro da Economia e do Emprego sobre a criação de uma rede de baixo custo, nada concretiza. Pior, o primeiro-Ministro afirma a impotência do Governo para corrigir a situação e o Ministro da Economia e do Emprego responde a Pergunta do Grupo Parlamentar do PCP, exatamente como fazia o Governo PS/Sócrates com os painéis nas autoestradas!

As justificações são conhecidas e também, as mesmas de sempre, a subida da cotação do petróleo, a desvalorização do euro e a variação da fiscalidade.

Mas o extraordinário, é que tendo-se procedido a uma revisão da legislação da concorrência – uma das ditas “reformas estruturais” – não se tenha avançado na adoção do conceito de “posição dominante coletiva”/”oligopólio dominante”, o que permitiria outra intervenção no mercado dos combustíveis. Os partidos que suportam o governo PSD e CDS/PP inviabilizaram inclusive uma proposta do Grupo Parlamentar do PCP nesse sentido, inspirada na jurisprudência dos Tribunais Europeus, segundo a qual “uma posição dominante pode ser detida por duas ou mais entidades económicas, juridicamente independentes uma da outra, na condição de, do ponto de vista económico, se apresentarem ou atuarem em conjunto num mercado específico, como uma entidade coletiva”.

Na continuidade de anteriores propostas, o Grupo Parlamentar do PCP, propõe à Assembleia da República que recomende ao Governo que proceda à criação de um sistema de preços máximos compatível com o poder de compra dos portugueses e os níveis de produtividade inferiores da economia nacional face à Zona Euro, desenvolva um sistema de preços diferenciados para sectores económicos específicos (agricultura e pescas, táxi, reboques e pequena camionagem de mercadorias) e promova a instalação de redes de combustíveis alternativos (GPL, GNC e GNL) da gasolina e do gasóleo.

Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

I)REGIME DE PREÇOS MÁXIMOS

A criação, pelo Governo de um sistema de preços combustíveis líquidos (gasolina, gasóleo e fuel) ou gasosos (GPL, GNC e GNL), regulados, que tendo em conta a viabilidade económica das empresas abrangidas e o possível ajustamento da carga fiscal, estabeleça um mecanismo de preços máximos, que tenha como referência os respetivos preços médios antes de impostos na Zona Euro:

1. O preço máximo em cada mês para os combustíveis líquidos em cada mês ou gasosos em cada semestre, será calculado pela DGEG tendo em conta o valor médio correspondente na zona euro, durante o período anterior;

2.Os preços para os consumidores domésticos serão estabelecidos a partir daqueles preços máximos corrigidos por fator que tenha em conta a paridade do poder de compra dos países da zona euro estabelecido pelo Eurostat;

3. Os preços para os sectores produtivos e dos transportes serão estabelecidos a partir daqueles preços máximos corrigidos por fator que tenha em conta os respectivos diferenciais de produtividade face à zona euro;

4. No desenvolvimento do ponto anterior serão estabelecidos preços diferenciados: (i) gasóleo profissional para os subsectores do táxi, reboques e pequena camionagem de mercadorias; (ii) atualização das bonificações do gasóleo verde para a agricultura, pecuária e florestas e as pescas; (iii) será criada uma “gasolina verde”, assegurando um preço efectivo idêntico ao do gasóleo verde, para a pequena pesca e pesca artesanal;
5.O Governo legislará conforme as recomendações atrás referidas no prazo máximo de 60 dias.

II) REDES DE BAIXO CUSTO (LOW COST) E DE COMBUSTÍVEIS ALTERNATIVOS

Tendo em conta uma resposta urgente à presente situação, e independentemente dos ajustamentos que se vierem a mostrar necessários no quadro da regulação proposta, o Governo decidirá das seguintes medidas, no prazo de 30 dias, permitindo diversificar o uso de matérias-primas energéticas e uma rápida redução da fatura:

1.Instalação da Rede Nacional de Baixo Custo no prazo máximo de 6 meses. Imposição às gasolineiras, a começar pela GALP, de venda nos seus actuais postos, de combustíveis de baixo preço (“low cost”) e de os fornecer aos postos independentes, conforme as suas solicitações. (Como acontece num posto/GALP em Setúbal e nas Grandes Superfícies – diferenciais, segundo a AdC, de mais de 10 cêntimos/litro).

2.(i) Instalação de uma Rede Nacional de GNC – Gás Natural Comprimido, garantindo no mínimo um posto de abastecimento público por distrito; (ii) reforço da rede de GPL – Gás de Petróleo Liquefeito; (iii) adequação da actual legislação respeitante a veículos a GNC e GPL, facilitando o seu licenciamento, circulação e estacionamento, no quadro de necessárias normas de segurança; (iv) criação de condições para o uso do GNL – Gás Natural Liquefeito, pelos transportes rodoviários pesados (passageiros e mercadorias).

III) AVALIAÇÃO DE PROBLEMAS CONCORRÊNCIAIS NO MERCADO DE COMBUSTÍVEIS

1.A realização de uma auditoria global e independente ao mercado dos combustíveis nos diversos escalões da cadeia de valor: aquisição do petróleo bruto, produção/refinação, transporte, armazenamento, comercialização por grosso e retalho, que esclareça: (i) a formação do preço final dos combustíveis e dos lucros das petrolíferas; (ii) o diferencial de preços existente entre as diferentes categorias (tipo e qualidade) de combustíveis vendidos nos postos de abastecimento;

2.Uma iniciativa junto dos órgãos da União Europeia para avaliação e verificação da conformidade com as regras da concorrência dos mecanismos de formação das cotações Platts/ NWE/Roterdão dos produtos refinados à saída das refinarias europeias no norte da Europa que servem de referência á fixação dos preços à saída da refinaria em Portugal (e também das cotações Platts/MED/Lavera para a zona do Mediterrâneo).

Assembleia da República, em 3 de Abril de 2012

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