Pergunta ao Governo

Ponto da Situação da Manutenção das Infraestruturas em Portugal

Destinatário: Ministério do Planeamento e das Infraestruturas

Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República

Para lá de notícias mais ou menos fundamentadas ou especulativas, como as que recentemente vieram a público sobre a Ponte 25 de Abril, ou mesmo sobre o viaduto Duarte Pacheco (que não devem ser ignoradas), o País já conheceu o colapso da ponte de Entre-os-rios em Castelo de Paiva. Como então se reconheceu, tornou-se necessário e inadiável proceder a uma avaliação mais vasta das infraestruturas do País, potenciando os meios existentes, designadamente o LNEC e assegurando os investimentos necessários. A queda que agora se verificou de um viaduto rodoviário em Itália no passado dia 14/08, que provocou elevado número de vítimas, enormes prejuízos materiais e grandes constrangimentos de tráfego que se prologarão no tempo, veio reacender justificadas preocupações que o PCP tem exposto regularmente.

Agora, depois da tragédia, o presidente do Governo italiano já anunciou que comunicou oficialmente à empresa Autostrade que deu início ao procedimento para terminar a concessão da gestão das estradas italianas.

A política de direita dos governos PS, PSD e CDS, também adoptou em Portugal um modelo semelhante ao da situação italiana, com concessões rodoviárias, em regime de parceria público privada, e a crescente externalização das actividades de projecto, construção, fiscalização, reparação e manutenção da infraestrutura, para além de uma contracção no investimento público. Um caminho onde as questões da manutenção e segurança são vistas essencialmente como um custo e não como algo a salvaguardar imperativamente. Esta matriz comum decorre das imposições da UE, da submissão dos Estados aos ditames do grande capital europeu, com a transferência para privados de sectores estratégicos.

Esta matriz, aplicada nas últimas dezenas de anos, inclui a drástica e persistente redução da manutenção das infraestruturas de transportes rodoviárias e ferroviárias, umas vezes com o próprio Estado a propor a redução das despesas com a reparação e manutenção de Infraestruturas (como aconteceu com as «renegociações» das PPP no tempo do Governo PSD/CDS) outras vezes por acção ilegal dos grupos económicos detentores da concessão ou do contrato, que sacrificam a nossa a segurança ao seu lucro, numa acção ainda assim coberta pela cumplicidade passiva de quem nos sucessivos governos promoveu a falta de fiscalização e garantiu a impunidade (aspecto de que é exemplo o Estado de degradação das «passagens hidráulicas», nos troços concessionados da A14 e A41, de que só se tomou pública consciência depois de abatimentos de piso em autoestradas concessionadas).

Paralelamente, assistiu-se nos últimos anos a uma brutal redução do próprio investimento em infraestruturas, e ao desmantelamento da capacidade pública de projecto, execução ou fiscalização, de que a situação da IP Engenharia é o mais recente reflexo. Estas práticas acarretaram um lapso de transmissão geracional do saber técnico, agravado pela dispersão da actividade remanescente por diversas empresas, pelo fomento do mundo precário das subcontratações e pela imigração de técnicos e especialistas. Com a crescente apropriação pelo capital internacional destas actividades, transfere-se para fora do país capacidades técnicas, o comando de opções estratégicas e até o foro judicial.

Hoje, o essencial da manutenção da infraestrutura ferroviária e rodoviária é executado por empreiteiros privados subcontratados pela IP, sendo a própria fiscalização crescentemente subcontratada. Os custos para o Estado dispararam, mas degradou-se a segurança e a fiabilidade. As empresas públicas estão exauridas, com os quadros operacionais abaixo das necessidade e sem verbas para a manutenção de infraestruturas de transporte a ponto de haver até prorrogação de contratos de manutenção ao mês. Intocável só mesmo o rentismo das PPP, que absorvem mais de mil milhões de euros por ano.

É que actualmente, perto de 90% dos recursos públicos canalizados para as Infraestruturas são desviados para o pagamento das rendas das PPP, que representam menos de 10% da rede viária. Com os restantes 10%, ao abandono ou quase, fica o restante da rede viária (mais de 90%), as respectivas pontes e viadutos e ainda as responsabilidades transferidas para o Estado pela manutenção das estradas concessionadas.

E isto num quadro em que os Institutos públicos da área da engenharia da construção, como o LNEC, detentores de enorme património tecnológico na construção e manutenção de infraestruturas, são igualmente subvalorizados, subaproveitados e economicamente asfixiados. As suas atribuições devem estar muito para além das solicitações avulsas com que os sucessivos governos a eles recorrem para salvarem a face em casos politicamente sensíveis, como no caso do novo aeroporto de Lisboa da Ota para o Campo de Tiro de Alcochete (mas a quem já não recorreram para o estudo da hipótese Montijo).

Pela deficiente manutenção das infraestruturas, o país está assim flagrantemente exposto pela política de direita a acontecimentos semelhantes à tragédia de Itália.

Assim, vimos por este meio requerer ao governo, através do Ministério do Planeamento e das Infraestruturas, os seguintes elementos:

1. Documentação elucidativa dos compromissos contratuais sobre a manutenção das infraestruturas entre cada uma das concessionárias de autoestradas e o Estado, e das alterações introduzidas pelas renegociações ocorridas nos últimos anos;

2. Documentação elucidativa dos compromissos contratuais sobre a manutenção da Ponte 25 de Abril e Ponte Vasco da Gama entre a Lusoponte e o Estado;

3. Documentação elucidativa dos subcontratos da IP para a manutenção da infraestrutura ferroviária.

4. Documentação que enquadre o papel atribuído pelo Estado ao LNEC no âmbito da manutenção das infraestruturas de transporte designadamente nas que são geridas por empresas públicas e nas que estão concessionadas em regime de PPP.

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