Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

As políticas europeias e nacionais que conduzem ao empobrecimento

Sr.ª Presidente,
Sr. Deputado João Soares,
Estava a ouvi-lo a interrogar sobre que Europa é esta — a Europa que, nas suas próprias palavras, nos condena a uma austeridade que está a ter consequências sociais e económicas dramáticas e a conduzir a enormes tragédias sociais — e estava a pensar: se eu ou algum camarada da minha bancada, há uns tempos, chegássemos àquela tribuna e interrogássemos sobre que Europa é esta, o que é o Sr. Deputado não diria de nós. Diria: «Lá estão eles, os antieuropeístas, os que não gostam da Europa, os que são contra a Europa». Podemos dizer que, em certa medida, estamos vingados. Os senhores já reconhecem, ou seja, começam a reconhecer as consequências que este processo de integração europeia tem tido para Portugal.
O Sr. Deputado pergunta muito bem quando diz «que Europa é esta?». Simplesmente, esta Europa é aquela que os senhores, os partidos socialistas e os partidos do Partido Popular Europeu, aqui representado pelo PSD e pelo CDS, construíram, que endeusaram e vituperavam todos aqueles que tivessem uma interrogação que fosse acerca dos caminhos que esta Europa estava a seguir.
É bom que reconheçam agora, ainda que tardiamente, olhando para nós: «Os senhores, afinal, tinham razão quando alertavam para as consequências a que este processo de construção europeia poderia conduzir».
Efetivamente, os senhores não podem pôr-se de fora deste processo. Diria que seria bom que os partidos socialistas, inclusivamente o Partido Socialista, em Portugal, fizessem o que dizem e não fizessem o que fazem quando têm a possibilidade de fazer, quando estão no Governo.
Lembro-me, há uns tempos, das grandes esperanças que os senhores depositavam na vitória do François Hollande, que diziam que ia mudar completamente a face da Europa e as políticas europeias. Não mudou absolutamente nada, nem na Europa, nem em França, e, Sr. Deputado, em França, se mudou, foi para pior, infelizmente!
Depois, tinham esperança na eleição alemã, no sentido em que, finalmente, a Sr.ª Merkel iria — permita-se-me a expressão — ser posta na ordem e as coisas iam mudar de rumo. Não mudaram! Está o SPD no governo com a Sr.ª Merkel. O que é que mudou na política da Alemanha em relação à Europa? Não mudou rigorosamente nada, Sr. Deputado!
Portanto, quando o Sr. Deputado diz que há duas visões opostas sobre a Europa, há sim, Sr. Deputado, mas a oposição não é entre os partidos socialistas e sociais-democratas e os partidos do Partido Popular Europeu.
As duas visões que há sobre a Europa são daqueles que, como nós, entendem que devemos estar na Europa para defender os interesses de Portugal, do povo português e dos países economicamente mais frágeis da Europa, e daqueles que querem estar na Europa para fazer discursos muito piedosos a dizer que é preciso mudar muitas coisas, que o caminho que a Europa tem vindo a seguir é um caminho mau, mas, depois, na prática, absolvem as causas que conduziram a essa situação.
Termino com uma questão muito concreta, Sr. Deputado. O Partido Socialista aceitou o tratado orçamental nesta Assembleia e sabe as consequências que daí decorrem. Pergunto se os Srs. Deputados não acham que ao aceitarem este tratado orçamental, que condena à austeridade os povos da Europa, designadamente o povo português, não estão, no fundo, a dar razão à conceção exposta pelo Sr. Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, quando diz que estamos condenados a pelo menos mais 20 anos de austeridade.
O Sr. Deputado não acha que, ao aceitar o tratado orçamental, como aceitou, o Partido Socialista está a aceitar a condenação do povo português a uma brutal austeridade para as próximas duas décadas e meia?

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