Intervenção de

Política orçamental e Grandes Opções do Plano para 2008 - Intervenção de Honório Novo na AR

Relatório sobre a orientação da política orçamental, apresentado pelo Governo
Grandes Opções do Plano para 2008

 

Sr. Presidente,
Sr. Ministro,

Quer nas GOP quer no relatório de orientação da política orçamental os senhores prevêem uma taxa de desemprego, para 2007, de 7,5%.

Sr. Ministro, não quero discutir se os desempregados são 470 000 (o número virtual oficial) ou se são cerca de 600 000. Nem sequer quero discutir o novo fenómeno migratório que faz com que, neste momento, cerca de 100 000 portugueses estejam a trabalhar em Espanha ou que muitos milhares entrem naquilo a que se costuma designar como os novos campos de escravatura da União Europeia, sem que o Governo «mexa uma palha» para evitar esses campos de escravatura. Fiquemo-nos pelos 7,5% que os senhores propõem para o desemprego este ano.

A questão que lhe coloco é a seguinte: sabendo que no primeiro trimestre os números oficiais do INE (Instituto Nacional de Estatística), confirmam a existência de 8,4% de desemprego, gostaria que me explicasse, a mim e ao País, como é possível prever para este ano uma taxa de desemprego de 7,5%.

Que espécie de milagre é que os senhores esperam que aconteça daqui até ao fim do ano para fazer baixar a taxa de desemprego de 8,4% para uma média anual de 7,5%.

Gostaria ainda de lhe colocar uma outra questão. Todos sabemos que os senhores são capazes de «vender a alma ao diabo» para cumprir o défice orçamental - já deram provas suficientes disso. Agora até se aprestam para introduzir «novos truques» de desorçamentação, exactamente os mesmos truques de desorçamentação que criticaram ao Dr. Durão Barroso e ao Dr. Santana Lopes!

Gostava de perceber o que os senhores pretendem fazer relativamente ao PIDDAC este ano. Recentemente, foi divulgada uma cativação suplementar de 10% de muitas das verbas do PIDDAC para este ano. Sabemos que o PIDDAC já estava ao nível das verbas previstas em 1997 e, portanto, a questão que se coloca é evidente: onde é que o Governo pretende chegar com mais estes cortes no PIDDAC? A que níveis de não investimento pretende chegar? Pretende paralisar completamente o investimento público no País? Pretende paralisar o País só para cumprir o défice orçamental?

Sr. Ministro, gostaria ainda de lhe colocar uma questão relativamente à recente decisão de subida das taxas de juro pelo Banco Central Europeu. Quem ouviu o Sr. Ministro ou o Governador do Banco de Portugal ficou convencido de que os senhores nada tinham a ver com esta matéria. Ora, na minha opinião, perdoem-me que diga, isso é só meia verdade. Em primeiro lugar, porque o Sr. Governador do Banco de Portugal participa directamente nestas decisões,...

portanto é responsável. Em segundo lugar, porque o senhor e o Governo também são politicamente responsáveis.

Por que razão o Sr. Ministro não propõe a revisão do estatuto do Banco Central Europeu? Porque é que não chega ao ECOFIN e diz: «Não, o Banco Central Europeu, em vez de se preocupar apenas com a inflação deve preocupar-se também com o crescimento económico e com o emprego»?

Por que razão o senhor, que assume daqui a uns dias a presidência do ECOFIN, não coloca esta matéria tão sensível e prejudicial para Portugal e para os portugueses na agenda da Presidência portuguesa?

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

As Grandes Opções do Plano para 2008 (proposta de lei n.º 134/X) mostram bem a desvalorização crescente com que o Governo continua a encarar este debate, que podia e deveria constituir um momento político relevante, quer quanto à definição das principais opções e orientações do Governo quer quanto à afectação dos meios financeiros necessários à respectiva concretização.
Está bem acompanhado o Governo nesta desvalorização, sobretudo nesta Câmara, como aqui se percebeu pelas intervenções do CDS e do PSD, ou seja, da direita desta Câmara.

Como mais uma vez acentua o Conselho Económico e Social (CES), no seu parecer sobre as Grandes Opções do Plano, o Governo não disponibiliza informação sobre execução de médio prazo, particularmente no que respeita às suas metas e objectivos quantificados, não define as principais linhas de actuação política previstas, através de uma calendarização e quantificação de objectivos, e não articula, como deveria fazer e não faz, com os restantes planos e programas de âmbito mais restrito. Estas são as críticas do CES, que nos merecem total concordância.

Mas este documento governamental merece alguns outros reparos e críticas, seja pela falta de transparência na forma de abordar alguns temas seja na omissão inaceitável de alguns dos problemas que hoje afectam Portugal e os portugueses.

Quanto às privatizações, por exemplo, o Governo aborda de forma discriminada as vendas de participações públicas concretizadas em 2006. Fala na GALP, na Portucel, por exemplo. Confirma uma receita de 1200 milhões de euros com essas privatizações.

Quanto ao Programa de Privatizações para 2007, ainda adianta uma receita estimada de 950 milhões de euros, sem contudo adiantar uma linha sobre as participações, em concreto, que pretende entregar ao capital privado.

No que diz respeito ao Programa de Privatizações para 2008, nem uma palavra, nem quanto à receita prevista e muito menos sobre o que o Governo pretende privatizar!! Será a TAP? Será a ANA (com ou sem o novo aeroporto)?

Pelos vistos, ficámos hoje a saber que poderá ser a empresa Estradas de Portugal, com o  objectivo intermédio, bem entendido, de desorçamentar, tal como fizeram Durão Barroso e Santana Lopes, única e exclusivamente, para cumprirem o défice orçamental.

Um outro assunto que as GOP não abordam é a questão relativa à política de distribuição da riqueza em Portugal.

Num país onde o fosso entre ricos e pobres é dos maiores da Europa, e onde os níveis de pobreza atingem valores que deviam envergonhar os responsáveis governamentais, o Governo apresenta as suas GOP sem dizer uma palavra sobre uma política salarial e de distribuição de rendimentos que permitisse ao País sair do último lugar do ranking da zona euro, no que se refere aos níveis salariais e ao poder de compra dos trabalhadores e da generalidade da população.

Uma outra questão a que as GOP 2008 passam completamente à margem prende-se com a coesão territorial. Sabe-se que o País diverge da média comunitária desde 2001! Sabe-se que, com níveis de crescimento medíocres ou manifestamente insuficientes, Portugal continua a divergir alegremente e continuará a divergir nos próximos anos.

Foi a isto que conduziu, no passado e no presente, a obsessão orçamental e o cumprimento cego da imposição do Pacto de Estabilidade.

Mas se o País se afasta da média comunitária, há zonas e regiões do País que se afastam não só da média comunitária como da própria média nacional.

Acentuam-se o declínio e a diminuição relativa e absoluta do PIB da Região Norte, da Região Centro, do Alentejo. Boa parte do País, quase todo o seu interior e parte significativa do seu litoral, apresenta valores de produção de riqueza que estão já entre os mais baixos da Europa a 27.

Os problemas de coesão interna e as questões relativas às assimetrias regionais que atingem o nosso País não merecem uma única palavra, nem nas GOP nem no Relatório de Orientação da Política Orçamental.

Aliás, os cortes nas despesas de investimento vão prosseguir. Foram os cortes nas despesas de capital, que, no fundamental, asseguraram o cumprimento e a superação do objectivo relativo ao défice em 2006, e foi a quase total paralisação do investimento público no País, a partir de Agosto de 2006, que permitiram ao Governo «deitar foguetes» e festejar em Bruxelas o cumprimento de um défice orçamental que continua a manter o País quase estagnado e os portugueses a perder direitos e qualidade de vida, a perder poder de compra e igualmente a perder o emprego.

Neste aspecto, espanta que os dois documentos que hoje debatemos possam continuar a insistir na diminuição da taxa de desemprego, em 2007, para 7,5%, quando só no primeiro trimestre se atingiu um valor record de 8,4%.

É esta a medida que permite avaliar as preocupações sociais de um Governo que se afirma socialista mas que, cada dia que passa, concretiza políticas que fazem «roer-se de inveja» toda a direita portuguesa. São estas políticas que importa denunciar, que importa combater.

São estas políticas que exigem a todos os democratas, a todos os homens e mulheres de esquerda e a milhares de socialistas eleitores e militantes verdadeiramente espantados e incrédulos com a prática governativa do seu Governo um esforço de convergência e de luta para que, mais cedo ou mais tarde, consigamos, de facto, mudar o rumo da política em Portugal.

 

 

 

 

 

 

  • Assuntos e Sectores Sociais
  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Regime Democrático e Assuntos Constitucionais
  • Assembleia da República
  • Intervenções