Intervenção de Rui Fernandes, membro da Comissão Política do Comité Central, XIX Congresso do PCP

A política de defesa nacional. A NATO e a independência nacional

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Camaradas,

Os quatro anos decorridos desde o nosso XVIII Congresso ficam marcados, no que às questões da Defesa Nacional e Forças Armadas dizem respeito, pelo prosseguimento do processo de desarticulação das matérias que enformam a condição militar e do pretexto da crise para justificar novos cortes em direitos sociais e profissionais dos militares, ao mesmo tempo que se mantêm intocáveis as missões e integrações externas ao serviço do imperialismo.

Trata-se de opções ideológicas claras que acompanham as sucessivas e inacabadas transformações porque têm passado as Forças Armadas nos últimos anos, transformações essas, com incidência na sua natureza, nas suas missões e no seu papel na sociedade portuguesa.

As forças armadas deixaram de ser entendidas pelos sucessivos Governos como um instrumento do Povo Português para a defesa do seu território, da sua integridade e da sua independência, para se tornarem em mero instrumento de política externa ao serviço dos desígnios militaristas da NATO e dos objectivos de militarização da União Europeia.

Três aspectos centrais emergem como objectivos da política em curso:

O primeiro, é o de através do Conceito Estratégico de Defesa Nacional dar corpo ao conceito de segurança nacional não como um sistema em que diversos vectores concorrem para o bem-estar, o desenvolvimento, a paz, a segurança e a tranquilidade, mas antes para um sistema em que o objectivo é abrir para a participação das forças armadas em missões internas de policia em confronto com o consignado na Constituição da República Portuguesa;

O segundo, o de desmantelar e desmembrar a estrutura e a organização para sobre essa realidade e justificando com ela, erguer uma outra com uma mais centralizada dependência do poder político;

O terceiro, envolver as forças armadas em projectos de partilha de forças e meios com outros países, justificando com a racionalidade, que a serem consumados, conduziriam à perda de capacidades próprias, aumentando deste modo as vulnerabilidades nacionais e as capacidades próprias de resposta.

Trata-se de uma política crescentemente em confronto com a Constituição da República e com largos sectores da Instituição Militar que partilham de uma sólida concepção sobre os princípios e os dispositivos constitucionais.

Trata-se de uma política que tem vindo a despir o território nacional da presença das forças armadas, mas estamos presentes no Afeganistão; que conduz à inexistência de navios e lanchas adequadas para a fiscalização, mas temos submarinos; que não paga a horas os fundos de pensões, ou os míseros complementos de pensão aos ex-combatentes e corta em direitos sociais, mas estamos na Bósnia e no Líbano e que consagra para 2013 para as missões externas 54 milhões de euros.

Política de direita essa que, no que às forças armadas e à política de defesa diz respeito, tem na NATO uma já histórica ligação, cada vez mais articulada com a «política externa e de segurança» da UE e, NATO essa, cada vez mais utilizada como braço armado imperialista de uma ONU crescentemente instrumentalizada.

Ganha por isso mais sentido, a posição de sempre do Partido de dissolução dos blocos político-militares, que é, na presente realidade, a NATO, em articulação com o objectivo da desvinculação de Portugal das suas estruturas, no quadro do inalienável direito de o povo português decidir da sua saída dessa organização.

A luta em torno deste objectivo e da elevação da consciência dos trabalhadores e do povo quanto à natureza belicista e intervencionista da NATO, assume cada vez mais importância. Uma luta que se insere na luta em defesa da Constituição da República, tendo presente que ela consagra a dissolução dos blocos político-militares, e luta essa que se constitui também como parte integrante da luta pela ruptura com a politica de direita que crie, também neste plano, condições para a desvinculação de Portugal das estruturas da NATO, no contexto da afirmação soberana do povo português a decidir do seu destino.

Camaradas,

Também nesta área se torna cada vez mais urgente e necessário a ruptura com o caminho que vem sido seguido. A defesa da soberania e da independência nacional são inseparáveis dos grandes objectivos de luta que nos estão colocados na presente situação: a defesa da democracia política, uma política social que responda aos problemas dos trabalhadores e do povo, o desenvolvimento económico de acordo com os interesses nacionais, uma política cultural que combata a colonização cultural e salvaguarde os instrumentos fundamentais de afirmação do Estado. Tal como os direitos se defendem exercendo-os, também a soberania e a independência nacional se defendem afirmando-os num quadro em que estão em curso profundas mutações e se desenham novos condicionalismos ao nosso país, tendo como pretexto a crise.

Com profunda consciência da evidente e inevitável interdependência dos povos e nações, o nosso Partido rejeita entretanto a sua invocação para cobrir, escamotear e justificar inaceitáveis desigualdades, formas de hegemonia e dominação, imposição de modelos de organização social, económica e política, graves expropriações do inalienável direito dos povos a determinarem livremente o seu futuro e o seu destino. E, como se compreende, com particular acuidade isso é particularmente sentido nas forças armadas, quando um acordo assinado com entidades estrangeiras e justamente apelidado de Pacto de Agressão é instrumento de justificação para a ingerência no nosso país e na Instituição Militar.

Se o vasto conjunto de políticas adoptadas ao longo dos anos tiveram como consequência a degradação da condição militar, o incumprimento de legitimas expectativas e o desrespeito por princípios básicos que regem essa instituição, e foram, por isso, motivo de mal-estar, protesto e luta, essas razões ganharam uma outra qualidade e dimensão no presente quadro. É por isso que as iniciativas promovidas pelo movimento associativo militar têm tido dimensões e expressões nunca vistas nas últimas décadas.

Iniciativas que têm tido como matriz o exercício de direitos constitucional e legalmente protegidos e que têm na defesa da Constituição da República portuguesa e na afirmação e defesa da soberania nacional o seu sentido fundamental; iniciativas que reafirmam a vontade de cumprir o desígnio de que estão incumbidos – servir Portugal e os portugueses, o povo de onde emanam e não qualquer governo; Iniciativas que rejeitam a continuada degradação da sua situação sócio-profissional e que afirmam o direito à insubmissão. Como temos referido, o movimento associativo sócio-profissional reforçou a sua importância como estrutura de afirmação e alargamento da consciência democrática dos militares, bem como de estudo, proposta e luta em torno dos problemas concretos que os afectam, tornando-se uma incontornável realidade, e erram os que o ignoram.

Portugal precisa de uma outra política de defesa nacional. Uma política que quebre os laços de dependência com o imperialismo, uma política que reforce a ligação das Forças Armadas ao povo e as apetreche de acordo com as possibilidades, prioridades e necessidades nacionais, uma política que respeite os militares, e dignifique a Instituição. Uma política ao serviço de Portugal e dos portugueses.

Viva o XIX Congresso!

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