Projecto de Resolução N.º 161/XII-1ª

Pelo desenvolvimento do transporte ferroviário no distrito de Coimbra

Pelo desenvolvimento do transporte ferroviário no distrito de Coimbra

O país está confrontado com uma profunda recessão económica e uma dramática situação social. Uma realidade que, sendo inseparável de mais de 35 anos de política de direita, do processo de integração capitalista na União Europeia, da natureza do capitalismo e da crise, é brutalmente agravada com a concretização pelo actual governo do programa de agressão e submissão que PS, PSD e CDS subscreveram com o FMI e a União Europeia.
Depois de uma década de estagnação económica com períodos recessivos - registando a pior evolução de toda a Zona Euro - a concretização nos últimos meses das chamadas medidas de austeridade, submetidas à ditadura do “défice” e aos interesses do grande capital, colocam no horizonte, não a resolução dos principais problemas do país, mas uma prolongada recessão económica e enorme regressão das condições de vida do povo português durante as próximas décadas.
O sistema de transportes está intimamente ligado com a situação económica e produtiva de qualquer região, podendo constituir um mecanismo potenciador do crescimento económico ou, em situação de desinvestimento, impedir o desenvolvimento económico e social de regiões inteiras. A par de assegurar as deslocações pendulares ou esporádicas das populações permitindo o acesso ao local de trabalho, aos cuidados de saúde, aos estabelecimentos de ensino, os transportes, nomeadamente o ferroviário, tem um papel fundamental na busca de ganhos do ponto de vista ambiental e do bem-estar nos aglomerados urbanos sendo uma forma activa de combate ao congestionamento nas vias de acesso às cidades. Esta política deve ser coerente em todo o território nacional e nas ligações ao estrangeiro, nunca descurando as deslocações pendulares de trabalhadores, nas relações interurbanas e de transporte de mercadorias.
O Distrito de Coimbra tem, segundo dados de 2011, 430 mil habitantes e uma área de 3947 km2. O sistema ferroviário de transportes servia apenas 7 dos 17 concelhos do distrito: Coimbra, Lousã, Miranda do Corvo, Montemor-o-Velho, Cantanhede, Figueira da Foz e Soure.

As ligações que mais se destacavam no plano distrital são a Linha do Norte que atravessa o Distrito de Norte a Sul, a linha da Figueira da Foz à Pampilhosa, o Ramal de Alfarelos e o Ramal da Lousã.
A Linha da Pampilhosa/Figueira da Foz consiste numa ligação de 50,4 km, originalmente fazia parte da linha da Beira Alta desde a estação da Figueira da Foz atravessando entre outras as freguesias de Maiorca, Alhadas e Santana, tendo também paragem na freguesia de Arazede. No concelho de Cantanhede com apeadeiros nas freguesias de Cadima, Cordinha, Murtede e tendo a sua ligação à rede ferroviária nacional na estação da Pampilhosa.

O percurso desta linha abrange freguesias destes dois concelhos onde residem mais de 30 mil habitantes. Tem, por isso, um papel fundamental para as suas populações ao assegurar o acesso à capital do Distrito e à Figueira da Foz. Poderia ser também potenciado como uma ligação privilegiada do Porto da Figueira da Foz ao território nacional e a Espanha.

Em 2007 verificaram-se obras de requalificação desta linha, contudo a electrificação da linha nunca foi concretizada e a qualidade do serviço permanece muito deficiente. O Governo assumiu também o compromisso de uma nova intervenção em 2008 ao nível da plataforma com substituição do balastro, das travessas danificadas e a parte dos carris que estão degradados, sem que tenha sido concretizado. Também a electrificação deste Ramal nunca foi efectuada. Esta linha (Pampilhosa – Figueira da Foz) encontra-se encerrada desde 5 de Janeiro de 2009 sem perspectivas de reabertura, com consequências gravosas e desastrosas para os utentes e regiões afectados. É urgente a reabertura e modernização deste Ramal pela resposta de mobilidade que assegura a estas populações, e pela possibilidade de estimular o desenvolvimento e o progresso económico e social desta região.

Com uma extensão de cerca de 18 Km, o Ramal de Alfarelos corresponde ao troço ferroviário que liga a Estação de Alfarelos (na Linha do Norte) e a Bifurcação de Lares da linha do Oeste. Este Ramal liga também às estações e apeadeiros até à Figueira da Foz.
O Ramal da Lousã foi inicialmente concebido para chegar a Arganil tendo mesmo sido estudada a hipótese de ligação à Covilhã, através da Linha da Beira Baixa. A sua extensão era de 37 quilómetros, percorrendo o concelho de Coimbra desde Coimbra-B até Ceira entrando depois no concelho de Miranda do Corvo, percorrendo desde a estação de Trémoa até próximo do Padrão, servindo depois o concelho da Lousã até Serpins. No total, o Ramal da Lousã era composto por 17 apeadeiros num percurso geograficamente sinuoso e com exigências de qualidade no que ao material circulante diz respeito. Em 1992 foi extinto o transporte de mercadorias prejudicando objectivamente os interesses económicos da região. Este Ramal registava mais de um milhão de utentes por ano, numa região com mais de 50 mil habitantes que conta há mais de um século com este meio de transporte. A ligação entre Serpins e a estação de Coimbra-Parque era efectuada 17 vezes por dia, em pouco menos de uma hora.
Em 2010, as obras no âmbito do Projecto Metro Mondego foram iniciadas com o arranque dos carris e regularização do canal do Ramal da Lousã. Apesar da inclusão do Ramal da Lousã no Projecto Metro Mondego ser uma opção desajustada desde logo porque pressupõe a aplicação de uma solução eminentemente urbana a uma linha de montanha, com a dissolução da Sociedade Metro Mondego e com o abandono do projecto ficou também ao abandono o Ramal da Lousã com óbvios prejuízos para as populações dos concelhos de Coimbra, Lousã e Miranda do Corvo, obrigando o recurso ao transporte rodoviário com degradação na mobilidade destas pessoas na região e no acesso à cidade de Coimbra, recentemente a CP admitiu a possibilidade de deixar de assegurar o financiamento do transporte rodoviário alternativo. Coloca-se assim a premência da reposição dos carris e a electrificação desta linha centenária e até estar concretizada é essencial continuar a assegurar os transportes alternativos.
Importa notar que, a electrificação e modernização do troço Vale Prazeres-Castelo Branco custou cerca de 30 milhões de euros e tem um comprimento semelhante ao do Ramal da Lousã. Assim, este é mais um argumento que nos leva a concluir pela irracionalidade do Projecto-Metro em detrimento da electrificação, pois custaria dez vezes mais que electrificar e modernizar a linha, para além da irracionalidade ambiental de encerrar linhas ferroviárias quando existem directivas comunitárias e recomendações no sentido de potenciar o transporte ferroviário.
O Governo recentemente respondeu a uma pergunta do PCP sobre este problema afirmando que

A Eurodeputada do PCP Ilda Figueiredo dirigiu recentemente uma pergunta à Comissão Europeia sobre as possibilidades de financiamento da obra de reposição e electrificação do Ramal da Lousã, tendo em conta que foi aprovada recentemente uma resolução que visa baixar a comparticipação dos Estados nos projectos co-financiados pela UE. Dadas as características do projecto, nas vertentes ambiental e de melhoria dos transportes, o financiamento da UE poderá chegar aos 95% do projecto, e o Estado português financiará apenas 5% do total da obra.

A solução “Metro” como forma de resolver os evidentes problemas de trânsito e de mobilidade dentro da Cidade enfermou sempre de falta coordenação da estrutura do Metro com os Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra, assim como não garantia o carácter público do projecto como salvaguarda dos interesses das populações no que se refere ao fornecimento de serviço e preço. Com o abandono do projecto é essencial mais investimento público que garanta transporte público e acessível a todos na Cidade de Coimbra.
O abandono deste projecto deixa ainda cicatrizes profundas na Baixa onde ocorreram inúmeras expropriações e demolições. A baixa da cidade de Coimbra não pode permanecer neste estado sob pena de se agudizarem os problemas de segurança, de protecção civil e de urbanismo já sentidos, pelo que se impõe encontrar soluções para os problemas de segurança e de mobilidade causados pelo abandono das obras do Metro. Com o abandono deste projecto ficaram também sem solução os constrangimentos de trânsito e mobilidade no centro da cidade de Coimbra e na ligação aos Hospitais da Universidade de Coimbra.
O recente anúncio de encerramento das oficinas da EMEF na Figueira da Foz, únicas oficinas de manutenção actualmente existentes, depois do encerramento das oficinas de Coimbra, compromete a manutenção do material ferroviário circulante e consequentemente a qualidade do serviço de transporte ferroviário na região. A alternativa para o indispensável desenvolvimento da rede existe e passa designadamente pela recuperação e modernização das infra-estruturas ferroviárias na região, com a ligação da linha da Beira Alta (linha da Pampilhosa/Figueira da Foz) ao porto da Figueira da Foz; a aquisição de material circulante adequado ao tipo de procura e que possibilite um serviço de qualidade, rápido e seguro; a modernização e consolidação de um pólo da EMEF (actuais oficinas da Figueira da Foz) com o objectivo da prestação de um serviço de manutenção e reparação do material circulante, eficaz e com qualidade.

O transporte ferroviário assume uma dimensão indispensável e estruturante para o distrito de Coimbra, capaz de garantir um serviço público de qualidade para os utentes e em estreita ligação com as actividades económicas, apresentando fortes potencialidades de desenvolvimento económico e social para a região e para o país.

Assim, considerando os motivos acima expostos, e tendo em vista uma maior modernização e qualidade no serviço prestado às populações, a Assembleia da República, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, resolve recomendar ao Governo as seguinte medidas, pelo desenvolvimento do transporte ferroviário no Distrito de Coimbra:

1. Uma visão integrada do Distrito de Coimbra, que assente na prioridade do serviço público de transporte ferroviário, como base para a mobilidade das populações e das mercadorias;
2. Definição de um plano regional de transportes que integre todos os modos a operar na região e geridos por uma autoridade regional de transportes, com a prestação de um serviço ferroviário incentivador da sua utilização, com horários adequados às necessidades das populações.
3. Reforço do investimento nas infra-estruturas melhorando a sinalização, as condições de segurança e a velocidade comercial atingida.
4. Renovação da grande maioria das estações do distrito, com construção de interfaces com parques de estacionamento em condições de dignidade.
5. Modernização e consolidação de um pólo da EMEF (actuais oficinas da Figueira da Foz) com o objectivo da prestação de um serviço de manutenção e reparação do material circulante, eficaz e com qualidade.
6. Criação de um passe inter-modal, com tarifário acessível, que possa servir como um incentivo à utilização dos transportes públicos para as deslocações pendulares e que garanta a mobilidade como um direito das populações.
7. Reactivar a circulação e electrificar da linha Pampilhosa-Cantanhede-Figueira da Foz, assim como a concretização de intervenções e obras que permitam o transporte de mercadorias, dando seguimento à Linha da Beira Alta até ao Porto da Figueira da Foz e Linha do Oeste;
8. Melhoramento da circulação no Ramal Figueira da Foz/Alfarelos, com a introdução de via dupla e renovação da ponte ferroviária de Lares.
9. Reposição dos carris e electrificação do Ramal da Lousã, garantindo a ligação deste Ramal à Rede ferroviária nacional. Assegurando transportes alternativos até à sua concretização;
10. Construção de um novo interface que substitua Coimbra-B, garantindo a ligação ferroviária até à Estação de Coimbra-Parque, com via dupla, avaliando-se a solução em túnel, mantendo a ligação do Ramal da Lousã à rede ferroviária nacional.
11. Alargamento do Ramal da Lousã até à Linha da Beira Alta via Arganil, e à Linha da Beira Baixa pelo Ramal de Tomar.
12. Investir numa solução de mobilidade integrada para a cidade de Coimbra com garantia de transporte de gestão pública e acessível a todos, em articulação com os Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra.
13. Elaborar um plano de recuperação da baixa da cidade de Coimbra, resolvendo os problemas de segurança, de protecção civil e de urbanismo causados pelo abandono das obras do Metro Mondego.

Assembleia da República, em 22 de Dezembro de 2011

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