Projecto de Lei

PEC - Pagamento Especial por Conta

 

Elimina o PEC - Pagamento Especial por Conta - para as micro e pequenas empresas
[Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro]

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O Pagamento Especial por Conta, vulgarmente designado por PEC, foi inicialmente criado através do Decreto-Lei n.º 44/98, de 3 de Março, que aditou ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas dois novos artigos, ao tempo os artigos 83.º-A, ("pagamento especial por conta", actual artigo 98.º), e 74.º-A ("crédito de imposto relativo ao pagamento especial por conta", actual artigo 87.º). Mais tarde, através do Decreto-Lei 198/2001, de 3 de Julho, o então Governo do PS procedeu a algumas alterações a estes dois artigos, designadamente através de uma nova redacção do artigo 87.º, que na prática passou a inviabilizar a devolução célere e imediata, quando existisse, do crédito de imposto relativo ao pagamento especial por conta. Como é público e notório este regime fiscal tem sido alvo, desde então, de forte e justa contestação por parte da generalidade das empresas em Portugal, em especial as micro e pequenas empresas.

O PEC é desde a sua criação um verdadeiro imposto antecipado, entregue ao Estado por conta da tributação de lucros ainda não verificados e muitas vezes nunca verificáveis. Na realidade, desde a criação do Pagamento Especial de Conta que as PMEs passaram a financiar o Estado por antecipação, situação sobretudo gravosa para as micro e pequenas empresas já que as suas disponibilidades de tesouraria são reconhecidamente diminutas e os seus lucros médios raramente atingem valores capazes de gerar tributação próxima dos valores fixados pelo regime do PEC.

Verificou-se que o mínimo estipulado para o Pagamento Especial por Conta, (fixado entre 1998 e 2002 em 500 euros), constituía um esforço muitas vezes impossível de suportar por milhares de micro empresas de natureza quase familiar. Não obstante esta realidade, e a reboque da aprovação do Orçamento do Estado para 2003, o então Governo PSD/CDS-PP procedeu a um brutal aumento do valor mínimo do Pagamento Especial por Conta, (geral, sempre obrigatório e independente dos resultados reais das empresas), de 500 euros para 1250 euros, isto é, um aumento de 250%! Aí se fixou então o valor mínimo do PEC, desde 2003 até 2009, ano em que foi um pouco diminuído, para 1000 euros.

Recorde-se que o PEC tem que ser sempre entregue pelas empresas, adiantadamente, mesmo nos casos em que estas têm prejuízos, ou em que os lucros verificados são de montante demasiado diminuto para gerarem tributação daquele valor. Nem nestas situações, contudo, as empresas ficam dispensadas de entregar ao Estado os valores do PEC, ou podem efectuar acerto de contas com créditos de imposto anteriormente entregue mas efectivamente não devido.

Acresce que, num processo quase kafkiano, a devolução dos valores do Pagamento Especial por Conta a que as empresas têm direito, (por causa de prejuízos verificados ou por causa de lucros insuficientes para serem tributados pelos montantes previamente entregues), não é feita de forma imediata, antes é sujeita a um procedimento profundamente burocrático que faz com que a devolução seja espaçada e distribuída no tempo de forma absolutamente inaceitável e profundamente lesiva dos interesses das empresas. Para essa devolução ser feita, a empresa que requerer a devolução do que de facto lhe pertence, tem mesmo que requerer à Administração Fiscal uma inspecção às suas próprias contas, feita a expensas da empresa requerente. Sucede, em muitos casos que o montante em crédito é inferior ao custo das inspecções, o que na prática significa que as empresas não requerem essas inspecções e só acedem de facto aos créditos de imposto muito tempo depois de eles terem surgido e lhes ser devido.

Desde o momento em que foi criado o PEC, mas em especial nos anos subsequentes, os Governos acabaram por reconhecer, face à onda de indignação que a introdução e aplicação deste novo regime legal provocou em todo o País, que, quer a fixação de um valor mínimo para o PEC, sempre obrigatório e independente da situação real das empresas, quer a fixação arbitrária de valores por conta de lucros futuros calculados com base no volume de negócios do exercício anterior, carecia da existência de critérios oficiais de natureza científica, técnica e estatística, publicamente conhecidos, fixados por área e sector de actividade, que permitissem introduzir um mínimo de razoabilidade e justiça na determinação dos valores do PEC a entregar ao Estado, diferenciando mínimos e valores conforme a realidade concreta dos diferentes sectores de actividade empresarial.

Importa recordar que, não obstante este expresso reconhecimento e o compromisso público de que se iria proceder ao estudo e fixação de tais critérios técnicos, isso nunca se verificou. Não foi nunca feito, nem na VIII, nem na IX, nem tão pouco pelo Governo do PS, durante a X Legislatura, não obstante as sucessivas declarações de intenção de todos eles.

A injustiça da manutenção do Pagamento Especial por Conta para as micro e pequenas empresas é flagrante. Estas empresas abarcam todas aquelas que apresentam um volume de negócios inferior a dois milhões de euros, com um número de trabalhadores até 10 - as micro empresas -, ou que apresentam um volume de negócios entre dois e dez milhões de euros, com um número de trabalhadores entre 10 e 50. Há um ano, eram 250 625 empresas, das quais 238 536 são micro empresas. Estas empresas entregaram na altura ao Estado, a título de PEC, 229,6 milhões de euros, num total arrecadado de imposto, com esta origem, de 262,8 milhões de euros, no mesmo período. Através desta informação oficial percebe-se melhor quem na realidade financia por antecipação o Estado: enquanto as grandes empresas entregaram de PEC 7,1 milhões de euros, as médias empresas (volume de negócios entre dez e cinquenta milhões de euros, entre 50 e 250 trabalhadores) entregaram 26,1 milhões de euros de PEC e, como ficou atrás dito, as micro e pequenas empresas entregaram 229,6 milhões de euros no mesmo período temporal.

As consequências e as dificuldades de tesouraria, em especial criadas às micro e pequenas empresas, é uma realidade que os sucessivos Governos sempre se recusaram a atender e a reconhecer. Muitas micro empresas podem mesmo ter encerrado portas por causa das dificuldades, tornadas em muitos casos insuperáveis, para fazer face às obrigações de um regime fiscal injusto que há muito deveria ter sido revisto e melhorado, fosse através da determinação dos aludidos e sempre adiados critérios técnicos a aplicar por área de actividade, fosse através da admissão do princípio do acerto de saldos de imposto a favor das empresas ou então, e finalmente, na criação de mecanismos para proceder à imediata devolução de créditos de imposto adiantado ao Estado pelas empresas.

Da parte do PCP, apresentámos diversas iniciativas, mormente na anterior Legislatura maioria absoluta do PS para melhorar o regime da aplicação do Pagamento Especial por Conta. No final de 2008, apresentámos propostas para eliminar a aplicação do regime de Pagamento Especial por Conta às empresas sempre que o respectivo volume de negócios, no exercício anterior, fosse inferior a dois milhões de euros; propusemos, também, alterações ao Código do IRC para permitir a devolução imediata dos valores do PEC que superassem os valores das liquidações de IRC devido pelas empresas. Por este novo processo proposto pelo Grupo Parlamentar do PCP, os saldos favoráveis aos sujeitos passivos, quando existissem, passariam a ser devolvidos de forma integral, após declaração de responsável técnico ou revisor oficial de contas, em vez de o serem ao longo de diversos exercícios e, muitas vezes, só após uma inspecção realizada a pedido e a expensas da empresa detentora do crédito de imposto. Estas propostas, que aliás repetimos no âmbito do debate da Proposta de Lei n.º 247/X/4.ª, (o primeiro Orçamento Rectificativo apresentado pelo Governo em 2009), a terem sido aprovadas, tinham podido melhorar a situação de milhares de micro e pequenas empresas em Portugal, porventura tendo impedido a falência de muitas delas ao longo deste ano em que a situação económica e financeira afectou - e continua a afectar - de forma de forma particularmente violenta o País. E a verdade é que estas propostas podiam e deviam ter contado com o voto favorável de muitos que depois invocam em vão a defesa das pequenas empresas.

A situação financeira das micro e pequenas empresas, tem entretanto continuado a degradar-se, agravando ainda mais as dificuldades de tesouraria da generalidade das empresas.

Hoje é inadiável adoptar novas propostas de melhoria do regime do Pagamento Especial por Conta. Hoje, não basta já eliminar o PEC apenas para empresas com volumes de negócios inferior a dois milhões de euros anuais e impor a devolução imediata de saldos de imposto para todas as restantes. Hoje há que ir mais longe e proceder à eliminação do regime do Pagamento Especial por Conta para todas as micro e pequenas empresas, na sua acepção oficial em termos europeus, fazendo prevalecer o critério do volume de negócios anuais.

Por isso, o PCP propõe agora, aliás nos termos exactos do Programa Eleitoral com que se apresentou às eleições do passado dia 27 de Setembro, que as micro e pequenas empresas, todas elas com um volume de negócios até dez milhões de euros, fiquem dispensadas de entregar ao Estado o Pagamento Especial por Conta, mantendo-se o regime actual apenas para as empresas com volume de negócios superior àquele valor, onde se incluem a totalidade das grandes empresas, com valores de volume de negócios superior a cinquenta milhões de euros. Pode dizer-se que, com esta proposta, ficam isentas do Pagamento Especial por Conta, 250 625 empresas de um total de 253 388, isto é, 98,91% das empresas registadas no ano de 2008.

Simultaneamente, o PCP mantém, por alteração ao artigo 87.º do Código do IRC, o objectivo de, quando existir, permitir efectuar a devolução integral e imediata do crédito do valor do PEC entregue pelas restantes empresas ao Estado, sem qualquer ónus ou encargos para a empresa credora do imposto.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP, abaixo assinados, apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º

Alteração ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC)

Os artigos 87.º e 98.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, abreviadamente designado por código do IRC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, passam a ter a seguinte redacção:

"Artigo 87.º

Pagamento especial por conta

1. A dedução a que se refere a alínea e) do n.º 2 do artigo 83.º é sempre efectuada ao montante apurado na declaração a que se refere o artigo 112.º do próprio exercício a que respeita, depois de efectuadas as deduções referidas nas alíneas a) a d) do n.º 2 e com observância do n.º 7, ambas do artigo 83.º.

2. No caso de não se ter verificado, no ano em que foi pago o PEC, matéria colectável suficiente para deduzir integralmente o seu valor, o saldo existente será devolvido ao sujeito passivo pela Administração Fiscal mediante declaração do ROC e, para as empresas que não o tenham, do TOC, podendo as empresas ser sujeitas, sem ónus para os sujeitos passivos, a uma fiscalização a enquadrar no PNAIT.

3. [Eliminado].

Artigo 98.º

Pagamento Especial por Conta

1. Sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 96.º, os sujeitos passivos aí mencionados, com excepção dos que no exercício precedente apresentarem volume de negócios inferior a dez milhões de euros ou estiverem abrangidos pelo regime simplificado previsto no artigo 53.º, ficam sujeitos a um pagamento especial por conta, a efectuar durante o mês de Março ou, em duas prestações, durante os meses de Março e Outubro do ano a que respeita ou, no caso de adoptarem um período de tributação não coincidente com o ano civil, no 3.º mês e no 10.º mês do período de tributação respectivo.

2. [...].

3. [...].

4. [...].

5. [...].

6. [...].

7. [...].

8. [...].

9. [...].

10. [...].

11. [...].

12. [...]."

Artigo 2.º

Entrada em vigor

A presente Lei entra em vigor em 1 de Janeiro de 2010.

Assembleia da República, em 23 de Novembro de 2009

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