Intervenção de Paula Santos na Assembleia de República

PCP volta a propor a revogação das taxas moderadoras

O PCP voltou hoje a apresentar o Projecto de Lei que propõe a revogação das taxas moderadoras no acesso ao Serviço Nacional de Saúde. Paula Santos afirmou que as taxas moderadores representam um duplo imposto e que impedem o acesso a muitos milhares de portugueses aos cuidados de saúde, acrescido do facto de por todo o país, o governo continuar a fechar serviços de saúde.

O Projecto de Lei foi reprovado com os votos contra de PSD, CDS, PS e com os votos favoráveis de PCP, PEV e BE
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(projecto de lei n.º 37/XII/1.ª)
Revoga as taxas moderadoras

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Na sequência da Revolução de Abril, foi consagrado na Constituição da República Portuguesa o
direito à saúde a todos os portugueses, universal e geral, independentemente das suas condições
socioeconómicas.
A consagração deste direito permitiu melhorar substancialmente a saúde de milhares de portugueses e a criação do Serviço Nacional de Saúde colocou Portugal nos primeiros lugares, a nível mundial, em indicadores de saúde.
Entretanto, nos anos 80, foram impostas as taxas moderadoras, o que levou, mesmo, à alteração da Constituição, deixando de ser gratuito o direito à saúde, para passar a ser tendencialmente gratuito.
As taxas moderadoras, desde então, sempre se mostraram socialmente injustas: injustas porque penalizam todos os doentes que recorrem ao Serviço Nacional de Saúde; injustas porque, argumentando com o objectivo de moderar o acesso dos utentes aos serviços de saúde, porque havia abusos, penalizam não só esses (se eventualmente houver esses mesmos abusos) mas penaliza todos aqueles que necessitam de cuidados de saúde e que recorrem aos serviços de saúde. Para já, lembrando também que todos os portugueses já pagam os seus impostos e, nesses mesmos impostos, está a contribuição também para o acesso aos serviços de saúde.
Por isso, quanto às taxas moderadoras, trata-se aqui de um duplo pagamento.
O objectivo das taxas moderadoras é o de introduzir um princípio de pagamento com a perspectiva de transferir, cada vez mais, para os utentes, os custos da saúde — esses custos, ao mesmo tempo que o Estado e o Governo se desresponsabilizam do Serviço Nacional de Saúde, desinvestindo, fragilizando o SNS e entregando-o cada vez mais aos grandes grupos económicos para lucrarem com os serviços de saúde.
É neste quadro que o pacto de agressão da tróica (do Fundo Monetário Internacional, da União Europeia e do Banco Central Europeu), que foi subscrito pelo PS, pelo PSD e pelo CDS-PP, impõe um aumento brutal das taxas moderadoras — o que o Sr. Ministro ainda não nos disse foi quanto é que vai ser esse aumento, mas pelas previsões, de facto, será brutal. E, sendo brutal, vai afastar milhares de utentes dos serviços de saúde; vai liquidar o Serviço Nacional de Saúde; e vai levar a que as pessoas tenham menos saúde, no nosso País!
Mas esta medida e este aumento brutal das taxas moderadoras contrariam também o princípio da nossa Constituição de um serviço nacional de saúde «tendencialmente gratuito». Este Governo, com o apoio do Partido Socialista, está a fazer com que os custos da saúde e do SNS sejam, cada vez mais, «tendencialmente pagos»!
Dizendo que se pretende moderar o acesso aos cuidados de saúde, porque há uma grande afluência às urgências dos hospitais, o que este Governo está a fazer é a cortar nos serviços
de saúde, reduzindo serviços e encerrando centros de saúde.
Há 1,7 milhões de utentes que não têm médico de família e, portanto, o único recurso que essas pessoas têm é o de recorrerem às urgências dos hospitais, urgências essas que já estão em ruptura e, de facto, bastante sobrelotadas.
Esta medida, o aumento das taxas moderadoras, o que faz é criar mais dificuldades, por isso o PCP propõe a revogação das taxas moderadoras e, com isso, a garantia de um Serviço Nacional de Saúde para todos, como estabelece a nossa Constituição, acabando com a actual injustiça.
(…)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
O PS, hoje, veio aqui dizer-nos que está preocupado com o aumento das taxas moderadoras, à semelhança, aliás, de um conjunto de outros partidos, nomeadamente o PCP, mas, Sr.ª Deputada Luísa Salgueiro, certamente não se recorda de que o governo PS também aumentou bastante o valor das taxas moderadoras, incluiu mais actos médicos na aplicação das taxas moderadoras e, pior do que isto, também subscreveu o acordo da tróica, com o PSD e o CDS, o qual impõe este aumento brutal!!… Por isso, não venha aqui dizer que o PS está preocupado quando está conivente e aprova todas estas medidas!…
Em relação ao CDS, o Sr. Deputado João Serpa Oliva veio aqui dizer que o Serviço Nacional de Saúde está na génese da social-democracia e da democracia cristã, mas, se bem me recordo, o direito à saúde ficou consagrado na nossa Constituição devido à luta dos trabalhadores e do povo português na Revolução de Abril, Constituição essa que o CDS não aprovou. É bom recordar que o CDS não a aprovou!
No que se refere ao PSD, a Sr.ª Deputada Carina Oliveira referiu que as taxas moderadoras não são o financiamento do SNS, que servem apenas para moderar, para regular o acesso dos utentes ao Serviço Nacional de Saúde.
Sr.ª Deputada, certamente não vivemos no mesmo país, porque neste País, com as medidas do seu Governo e com o apoio do Partido Socialista, o que está a acontecer é o encerramento de serviços de proximidade — encerram os serviços de atendimento permanente (SAP), encerram os atendimentos complementares, como acontece no concelho de Ourém, em Portalegre, no distrito de Setúbal e em Lisboa…!
Não havendo serviços de proximidade, se as pessoas necessitam de cuidados de saúde, se precisam de ir ao médico, vão onde? Vão às urgências hospitalares, porque é o único serviço que continua aberto.
É assim que o Governo do seu partido quer regular e moderar o acesso aos cuidados de saúde? É criando mais obstáculos aos cuidados de saúde? É por isso, com certeza, que o Sr. Ministro da Saúde ainda não disse em quanto vai aumentar as taxas moderadoras, porque elas terão, seguramente, um aumento brutal, o que vai excluir milhares de portugueses do acesso aos cuidados de saúde.

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