Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

PCP propõe revogação do Decreto que impede reformas antecipadas

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O PCP apresentou a Apreciação Parlamentar ao Decreto sobre a idade de acesso à pensão de reforma por antecipação. Bernardino Soares afirmou que o governo continua a servir os interesses dos grupos económicos ao não permitir que quem trabalhou uma vida inteira possa agora ter direito à sua reforma.
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Apreciação do Decreto-Lei n.º 85-A/2012, de 5 de abril, que suspende o regime de flexibilização da idade de acesso à pensão de reforma por antecipação, constante do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, salvaguardando a situação dos desempregados de longa duração
(apreciação parlamentar n.º 11/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
O País atravessa uma enorme crise económica e social. Uma crise em que o desemprego, os baixos salários, os salários em atraso, um conjunto de restrições no rendimento das famílias e das populações são uma das realidades mais preocupantes. Uma crise em que, a par disso, se verifica um aumento brutal do custo de vida e dos bens essenciais.
Ao mesmo tempo em que isto acontece, o Governo ataca em todas as direções em matéria social: corta o acesso ao subsídio de desempego, rouba salários e subsídios aos reformados e aos trabalhadores da Administração Pública.
Está em curso a alteração ao Código do Trabalho para permitir despedimentos ainda mais fáceis e baratos ou, por exemplo, para cortar para metade o valor das horas extraordinárias, aliás, com o apoio do Partido Socialista.
Foi neste quadro terrível que o Governo decidiu, bruscamente e sem aviso, eliminar a possibilidade de recurso às reformas antecipadas. As reformas antecipadas não são a opção normal para a maioria dos trabalhadores, nem devem ser, até porque têm fortíssimas penalizações, isto é, 6% ao ano por cada ano de antecipação.
Esta decisão do Governo é especialmente gravosa em duas situações particulares. Primeiro, na situação de longas carreiras contributivas, em que as pessoas já descontaram mais de 40 anos e que agora se verão obrigadas a trabalhar 45 ou 50 anos sem qualquer acréscimo para a sua reforma.
Segundo, nas situações em que os trabalhadores tomaram decisões recentes no pressuposto de terem acesso à reforma antecipada e, agora, em muitos casos ficam sem salário, sem subsídio e também sem reforma porque não têm acesso a ela.
O Governo, hipocritamente, vem falar de sustentabilidade da segurança social, o mesmo Governo que tem uma política económica que, ao causar recessão, ao causar desemprego, é o principal obstáculo a uma melhor sustentabilidade da segurança social.
O Governo mantém uma política perdulária em matéria de dívidas à segurança social, que atingiram mais de 7000 milhões de euros no final de 2010 e continuam a aumentar.
O Governo que aposta em deitar fora da segurança social pública para entregar ao setor financeiro privado os descontos dos salários mais altos.
O Governo daqui a pouco vai dizer que, com esta medida, se poupam 450 milhões de euros. São 450 milhões de euros exatamente o valor do aval que o Estado deu ao Banco Privado Português (BPP), o banco das grandes fortunas, e que foi executado por falta de pagamento deste banco.
Portanto, houve dinheiro para pagar às fortunas do BPP mas, agora, quer compensar-se esse pagamento retirando aos trabalhadores, que até aqui tinham o direito de se reformarem antecipadamente.
É uma medida injusta, sobretudo na atual conjuntura económica, e, por isso, proporemos a sua revogação.
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Não vou ficar à espera para falar depois do Governo, mas aviso já que, daqui a pouco, quando o Sr. Ministro falar do descongelamento das pensões mínimas, se trata de aumentos de 20 cêntimos por dia, para termos bem a ideia do que vai dizer.
De facto, não estamos aqui para servir o Governo, estamos aqui para servir os portugueses e para defender os interesses dos reformados e dos trabalhadores. Já o Governo tem feito uma política ao serviço dos grupos económicos. Senão, repare-se: quando é preciso tributar mais, de alguma maneira ínfima, como tem sucedido, os grupos económicos, dá-se-lhes um prazo, para eles se adaptarem — o Pingo Doce pôde, no final do ano passado, pôr-se a salvo na Holanda, para não ter de pagar os impostos que devia pagar —, quando se trata dos trabalhadores, atua-se da noite para o dia, para não terem hipótese de escapar.
O Sr. Ministro não deu nenhuma resposta a dois tipos de situações de gritante injustiça nesta matéria.
Como estava a dizer, o Sr. Ministro não deu qualquer resposta a dois tipos de situações de gritante injustiça nesta matéria: a das longas carreiras contributivas, cujos trabalhadores vão continuar a não poder reformar-se, apesar de já terem descontado mais de 40 anos; e a daqueles trabalhadores que chegaram a acordo com as suas empresas, que, por qualquer razão, deixaram o seu posto de trabalho e, agora, não têm subsídio, não têm salário, não têm reforma antecipada. Estes trabalhadores descontaram, têm direito à sua reforma e é isto que o Governo lhes quer negar!

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