Intervenção de

PCP no combate à crise

 

 

 

Medidas de combate à crise económica e social

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Em recente debate nesta Assembleia da República, o Ministro dos Assuntos Parlamentares resolveu brindar a oposição com mais uma «lição» sobre como lidar com a crise. E, da sua trauliteira inteligência, retirou duas ideias, que nunca ninguém tinha descoberto: a primeira a necessidade de uma linha de rumo clara nas políticas propostas e executadas e a segunda não cometer erros. É justo valorizar tal pensamento, porque a resposta do Governo à crise tem tido, de facto, uma linha de rumo clara: proteger os interesses dos poderosos, dos banqueiros e titulares de grupos económicos portugueses e fazer recair sobre a generalidade dos portugueses - trabalhadores, reformados e pequenos empresários - o grosso dos custos da crise. E, nesse sentido, o Governo não tem cometido erros: tudo sempre certo, tudo em linha com o que pode beneficiar o grande capital e algumas migalhas para os pobres, que as eleições estão à porta, mas, fundamentalmente, propaganda, muita propaganda, e manipulação, muita manipulação, que esconda o rotundo fracasso de quatro anos de governo PS/Sócrates e, sobretudo, que iluda as graves e dramáticas consequências para o País de 32 anos de políticas de direita, onde os governos do PS, que não estiveram sozinhos, porque, de facto, estiveram bem acompanhados pelo PSD, com ou sem CDS, mas onde tiveram um papel central e tantas vezes pioneiro, como tem sucedido em matéria de legislação laboral.

Srs. Deputados,

Sem subestimar - o que nunca fizemos - a expressão e a dimensão da crise do capitalismo e os seus efeitos no mundo e em Portugal, temos de denunciar a mistificação em que persistem Sócrates, o seu Governo e a sua maioria parlamentar.

Os principais problemas e défices do País já há muito se faziam sentir. Os elevados e dramáticos indicadores do desemprego, que a estatística «oficial» persiste em disfarçar, a precariedade, a pobreza, as desigualdades sociais e regionais, o endividamento das famílias, das empresas não financeiras e do próprio País, a manutenção do modelo de baixos salários e a persistência de défices energéticos, científicos, tecnológicos, de produção material e de produtividade não nasceram com a crise.

A crise não é para todos e a resposta do Governo PS à crise também não é para todos, Srs. Deputados! Os resultados que vão sendo conhecidos dos principais grupos económicos e financeiros evidenciam que, pese o esvaziamento da bolha bolsista, os lucros continuam a contabilizar-se aos milhões de euros e o grosso das medidas do Governo continua destinado a apoios ao capital financeiro. Mas também a credibilidade das medidas do Governo é nenhuma, quando, simultaneamente, insiste numa degradação das relações laborais, com o Código do Trabalho, com o próprio Estado a fazer crescer o desemprego com a dita mobilidade especial ou inviabilizando medidas para o alargamento do subsídio de desemprego e quando o Governo não só se mantém cúmplice face à voracidade dos monopólios e à completa passividade da Autoridade da Concorrência, como ele próprio avança com medidas e propostas - incluídas no combate à crise - que violam leis da concorrência e marginalizam milhares de pequenas empresas, como é o caso da promoção dos painéis solares ou das regras de excepção para obras públicas.

Srs. Deputados,

A resposta à crise, de forma sustentada e coerente, para responder a problemas estruturais que estão na sua origem, continua a exigir a ruptura com os eixos essenciais das opções e políticas prosseguidas ao longo dos últimos anos.

Mas, no contexto das dificuldades e problemas que o País enfrenta, julgamos dever realçar um conjunto de medidas urgentes para responder aos gravíssimos problemas sociais e para defender o emprego e os direitos dos trabalhadores e das populações, tais como: O aumento dos salários e das pensões, e só estará contra o aumento dos rendimentos disponíveis dos trabalhadores quem não corta, como os administradores, nos seus próprios vencimentos e faz da força de trabalho a exclusiva variável de ajustamentos dos custos operacionais das empresas; A revogação dos aspectos negativos do Código do Trabalho; O reforço imediato das prestações sociais aos trabalhadores atingidos pelo desemprego; Medidas que respondam à situação das micro, pequenas e médias empresas; A determinação do congelamento ou redução dos preços dos factores de produção e o conhecimento dos lucros da EDP e da GALP evidenciam o que o PCP há muito propõe e defende, que é a possibilidade da redução energética para as pequenas e médias empresas; A eliminação do pagamento especial por conta e de outras medidas fiscais; Medidas para impulsionar o investimento público, como elemento estruturante no combate à recessão económica; Medidas para adopção de uma outra política de crédito, pois não chegam linhas de crédito, que, embora necessárias, sempre atingirão uma reduzida percentagem de empresas, é necessário que o mercado do crédito funcione em condições aceitáveis para a generalidade da economia e das populações. Srs. Deputados, na sua já referida «catedrática» lição à oposição, o Ministro dos Assuntos Parlamentares enunciou cinco erros das oposições.

De facto, estava a olhar-se ao espelho e, ofuscado por tão preclaras tiradas, atirava forte e feio nos pés do Governo!

Para o Governo, segundo este Ministro, é demagogia travar os despedimentos por decreto, mas já não é demagogia facilitar por decreto, via código laboral, o despedimento nas empresas ou no próprio Estado, via sistema SME!

É demagogia estatizar a economia, o que nunca ninguém defendeu, mas são boas medidas nacionalizar bancos para salvar banqueiros!

É demagogia regular o crédito em sede de Diário da República, mas são boas medidas decidir, na mesma sede, as garantias ao capital financeiro!

É demagogia comandar as empresas públicas em cada um dos seus actos de gestão, deixando a Caixa-Geral de Depósitos salvar os aflitos banqueiros, como o Fino, o Berardo, o Teixeira Duarte ou o João Rendeiro, mas não é demagogia pôr a Caixa-Geral de Depósitos a servir como «extintor» de incêndios financeiros, ditos «lixos tóxicos», como sucedeu no BPN e no BPP!

Para o Governo, segundo o mesmo Ministro, é oportunismo político atribuir a «responsabilidade da crise, exclusiva ou predominantemente, ao Governo português», o que nunca ninguém disse ou afirmou, mas, manipulando uma mentira, oculta-se o oportunismo político de quem, durante meses, por razões propagandísticas, escondeu a crise real no mundo e no País.

Para o Governo, segundo o Ministro Santos Silva, é erro os partidos políticos servirem de caixa de ressonância de interesses particulares ou de pressões do momento, mas oculta-se a permanente opção governamental pelos interesses dos grandes grupos económicos e financeiros e a sua resposta às suas pressões em todos os momentos, inclusivamente recorrendo à chantagem quando dizem: «ou fundos e benefícios fiscais ou desemprego»...!

Para o Governo, segundo o mesmo Ministro, é erro a irresponsabilidade perante questões essenciais, como a «consolidação orçamental e a sustentabilidade da segurança social».

Mas de facto, de verdade, o que sempre dissemos foi que a consolidação orçamental deve ser fruto da consolidação da economia portuguesa, vencendo os défices estruturais e conseguindo um crescimento sustentado e não transformando-a num espartilho à gestão do Estado, que atrofia a economia.

De facto, de verdade, a sustentabilidade da segurança social é uma questão essencial e, por isso, propusemos outros critérios de contribuição, nomeadamente a consideração do valor acrescentado das empresas, combatendo o processo de descapitalização que o Governo vem fazendo, enquanto, simultaneamente, sacrifica pensões e subsídios sociais.

Para o Governo, segundo o mesmo Ministro, é um erro o preconceito ideológico contra o investimento público. Verdade como punhos!, mas o preconceito é do Governo que, com o argumento do défice abaixo dos 3%, prosseguiu, nos quatro anos de Governo, uma política de drástica redução do investimento público, inclusive em 2008, sacrificando milhões de euros de fundos comunitários, que foram devolvidos a Bruxelas por falta de contrapartidas nacionais!!

Mesmo no Orçamento do Estado para 2009, mesmo depois de rectificado, o nível de investimento necessário e possível para responder à crise continuou a ser insuficiente. É ainda um erro, segundo o Ministro Santos Silva, o preconceito ideológico do PCP contra «o patronato» e «a iniciativa empresarial».

Mais uma mentira para esconder a real política do Governo de favor ao grande patronato e dos grandes sectores financeiros e de efectiva discriminação e falta de apoios à generalidade das pequenas empresas.

Mas, Srs. Deputados, o grande problema, o mais grave, é que todos esses «erros» do Governo PS, que o Ministro dos Assuntos Parlamentares viu no espelho - demagogia, oportunismo político, caixa de ressonância, irresponsabilidade e preconceitos ideológicos - não são erros, são, como atrás dissemos, uma «linha de rumo clara» de uma política de classe, de opção a favor dos muito ricos e muito poderosos e, inclusive, como a generalidade dos portugueses sabe, das opções do Governo no combate à crise.

Crise que é ainda e mais uma vez, como dizem alguns, uma «janela de oportunidades» de novos e grandes negócios, um momento óptimo para os ricos e poderosos reforçarem ou, pelo menos, salvaguardarem os seus patrimónios e a oligarquia financeira o seu poder. Essa é a linha de rumo do PS, mas não é a do PCP.

Daí a persistência do nosso combate contra a política de direita e daí a natureza das nossas propostas para a crise (projecto de resolução n.º 438/X).

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Hugo Velosa,

Agradeço-lhe a questão colocada. Como tive oportunidade de referir na minha intervenção, julgamos que o Governo do Partido Socialista tem particulares responsabilidades no agravamento da situação no nosso País pelas políticas desenvolvidas ao longo destes quatro anos.

O Governo do Partido Socialista procura esquecer, por exemplo, que o endividamento das famílias não começou em Outubro de 2008, pois entre 2004 e 2007 cresceu 23 pontos percentuais; que o endividamento das empresas não financeiras cresceu 15 pontos percentuais; que o conjunto do endividamento externo, entre 2004 e 2007 - hoje já vai em 100% do PIB, como sabemos -, saltou 35 pontos percentuais, portanto, durante a governação do Partido Socialista.

Mas, insistindo no patamar superior a que o Governo do PS levou as políticas de direita, agravando todas as vulnerabilidades e fragilidades do País para resistir à crise, não podemos esquecer que estas políticas - as políticas, por exemplo, do controlo orçamental, do Pacto de Estabilidade e Crescimento, do controlo do défice, das privatizações - criaram situações gravíssimas, do nosso ponto de vista, nomeadamente no sector energético.

Por exemplo, hoje, as empresas portuguesas estão a pagar uma elevada tarifa de energia eléctrica, decorrente de quatro reestruturações realizadas no sector energético.

E podemos dizer que estas se dividem até de uma forma muito proporcional entre os partidos do bloco central: o PSD tem duas dessas reestruturações e o PS tem outras duas. E as consequências estão à vista: continuamos a ter a electricidade como um factor de agravamento da competitividade das empresas portuguesas.

Temos também o problema da Galp e dos elevados custos que os portugueses e as empresas portuguesas estão a pagar pelos combustíveis em Portugal, num momento de crise, enquanto estas empresas vão embolsando grossos e chorudos lucros.

Sublinhe-se que a Galp, com esta situação, se atreveu a fazer uma distribuição antecipada de dividendos em Outubro...!

Um escândalo completo! E o Governo toma as medidas mínimas no sentido de permitir uma redução da factura energética para a economia nacional e para a generalidade dos portugueses.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Diogo Feio,

Julgo que o principal problema da falta de confiança é haver um exagero de propaganda do Governo sobre as medidas e, na prática, não haver medidas. Há aqui uma contradição absoluta entre propaganda e medidas quanto ao tecido económico que, inevitavelmente, gera uma enormíssima desconfiança na generalidade das micro, pequenas e médias empresas

A melhor avaliação que pode ser feita do dito plano de combate à crise do Governo do PS são as inúmeras cartas que todos nós vamos recebendo.

Penso que não é apenas o Grupo Parlamentar do PCP que está a receber cartas de empresários em nome individual e de associações empresariais a contestar, a queixar-se, a criticar, a dizer que nada lhes chega, nada responde aos seus problemas, alguns com este grito: «quero salvar a minha empresa! Salvem-nos! Intervenham! Pressionem o Governo!» E o Governo do PS permanece impávido e silencioso relativamente a estes gritos.

Não sei se o próprio PS tem a noção exacta do que significa para muitos pequenos empresários atreverem-se a escrever uma carta denunciando a situação, do que isso é demonstrativo da gravidade da situação que a economia portuguesa atravessa...!!

Sr. Deputado, relativamente ao problema dos painéis solares já nos referimos aqui várias vezes a ele. Começámos por o declarar aqui, logo a seguir ao anúncio feito pelo Primeiro-Ministro num debate quinzenal, enviámos uma carta com duas perguntas ao Sr. Ministro da Economia e da Inovação, enviámos com uma carta à Autoridade da Concorrência, cujas respostas, até hoje, são «zero».

Estamos perante uma grave violação das leis da concorrência entregando a quatro bancos e a dois grupos, provavelmente apenas a um grupo, todo um negócio apoiado por fundos do Estado!!...

Não houve qualquer avaliação do significado deste apoio no que respeita à violação da Lei da Concorrência, que tem um artigo que taxativamente coloca este problema em cima da mesa. Mas isto não acontece apenas com os painéis solares, como sabemos, acontece também com os concursos em condições excepcionais que o Governo, com legislação própria, resolveu utilizar em matéria, por exemplo, de obras públicas; acontece em inúmeros sectores..., no sector automóvel, no sector da fotografia...

São inúmeros os casos em que o Governo, numa intervenção que nem sequer custava dinheiro ao Orçamento do Estado, não está a fazer o que devia, que é velar para que as regras da concorrência sejam cumpridas no nosso País.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Miguel Ginestal,

Foi fácil ouvi-lo. No entanto, é incompreensível e grave para o Presidente da Subcomissão de Agricultura desconhecer que toda a política agrícola comum é uma intervenção no mercado.

É uma regulação no mercado! E que regulação!...

Embora tenha vindo a ser desmantelada ao longo dos anos, é uma intervenção no mercado! E que dimensão tem essa intervenção, que custa 50% do orçamento comunitário!

Sr. Deputado Miguel Ginestal, tive pena que, quando foi confrontado, na visita ao sector da olivicultura em Trás-os-Montes, sobre o custo dos factores de produção para o sector agrícola, relativamente à subida do preço dos combustíveis, não tivesse dito nada quanto à subida do preço dos adubos, não tivesse dito nada quanto à subida dos preços da ração, enfim, não tivesse dito nada!

Sr. Deputado,

Não considera o Governo que há especulação, quando, como ouvimos, o argumento para a triplicação do preço dos adubos ou do preço das rações foi a subida do preço do petróleo e do preço dos cereais, mas quando o preço do petróleo e dos cereais desceu, caiu abruptamente, esses preços não tenham sido actualizados?

Não considera que há aqui especulação e que o Governo precisa de intervir?

O Sr. Deputado Miguel Ginestal usou outros factores e vou falar-lhe de outros factores. O Governo e o Ministério da Agricultura estão a aumentar as taxas no sector agrícola, estão a tentar impor taxas, por exemplo, sobre a poda dos sobreiros, triplicando o seu valor, tendo, depois, recuado pela pressão dos agricultores.

E, já agora, diga-me se o Governo vai retirar uma taxa que lhe diz directamente respeito, porque toca ao seu distrito, a taxa sobre o queijo da serra.

Sr. Deputado,

O Governo durante dois anos, 2007 e 2008, não aplicou um cêntimo de investimento no sector agrícola em matéria do Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER).

Portanto, não fale do PRODER! O melhor é estarem calados! Finalmente, quanto aos painéis solares, não tresleia aquilo que escrevemos e dissemos. Estamos de acordo com a medida, mas estamos contra a forma de a aplicar! É isso que estamos a denunciar, desde o princípio!

E, relativamente a isso, gostava de saber se o Grupo Parlamentar do PS está contra a aplicação de uma medida que entrega os incentivos a quatro bancos e a um grupo, que os senhores bem conhecem, a Martifer, e marginaliza 4000 empresas do sector.

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