Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

PCP apresenta projecto para protecção do sector das pescas

Recomenda a proteção ao setor das pescas através da salvaguarda da rentabilidade e da adequação de rede de postos de venda
(projeto de resolução n.º 404/XII/1.ª)
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
A discussão que fazemos agora foi despoletada pelo projeto de resolução da autoria do CDS, ao qual se juntou um outro da autoria do PCP.
Começando pelo projeto do CDS, diria que ele propõe o estabelecimento de um projeto-piloto, numa lota de média dimensão, onde possa ser experimentado o processo de venda em lota de peixe proveniente de aquacultura e de peixe congelado, implementado o sistema de leilão crescente.
O que o CDS pretende é claro, mas entendemos que é inoportuno. E é inoportuno não por não haver condições para implementação destas medidas, é inoportuno porque tudo aquilo que o CDS propõe já existe.
A Docapesca já permite nas suas lotas um sistema de venda de peixe de aquacultura e congelado com leilão ascendente, um serviço mais avançado do que aquilo que o CDS agora propõe, uma vez que é disponibilizada a possibilidade do leilão on-line, que permite ao vendedor vender o peixe sem o expor à degradação, uma vez que não é necessário retirá-lo dos congeladores ou dos tanques.
Mais ainda: esta proposta nem vai ao encontro daquilo que são as principais preocupações do setor da aquacultura. O sistema de venda direta é largamente utilizado nas transações do setor, sendo o leilão um procedimento residual.
Em texto publicado no mês passado, o secretário-geral da Associação Portuguesa de Aquacultores elenca os oito principais problemas que o setor atravessa. Entre eles estão preocupações com a regulamentação do seguro aquícola bonificado, preocupações com a carga fiscal e com o preço de combustíveis e eletricidade, com o prazo de pagamento dos compradores ou a necessidade de execução de um plano setorial com localização das áreas existentes e definição das áreas de expansão. Mas sobre dificuldades na venda do pescado não há qualquer referência.
Para além de ser um projeto a sugerir a experimentação de um sistema já criado, ainda propõe a resolução de um problema que, segundo o setor, não existe ou, pelo menos, não é digno de registo. Resta a hipótese de ser esta uma tentativa de introduzir a modalidade de leilão crescente para a expandir posteriormente para o peixe selvagem.
Até essa experiência dificilmente daria resultados viáveis, uma vez que nunca se poderá comparar a necessidade de venda rápida do pescado selvagem, altamente perecível, com a garantia de conservação dada pela congelação ou por estarmos perante a venda de animal ainda vivos.
Mas se era uma oportunidade de refletir sobre alterações a introduzir no sistema de lotas, o projeto de resolução do PCP promove essa oportunidade e sobre aspetos que, efetivamente, são problemas para o setor das pescas.
O primeiro é a necessidade de avaliação da rede de lotas e da necessidade do seu alargamento.
Existe em Portugal uma rede de 20 lotas e 33 postos de vendagem, mas existem cerca de 90 portos de pesca. Isto dá-nos a noção de que a rede de receção e venda de peixe pode ficar aquém daquilo que são as necessidades das comunidades piscatórias. E o que se conhece é que em algumas dessas comunidades são necessárias deslocações mais ou menos longas para descarregar o peixe, logicamente com custos acrescidos.
Mais importante ainda: o PCP propõe que seja feito um estudo da cadeia de valor para estabelecimento de margens máximas de lucro, à semelhança da intensão manifestada para as produções agroalimentares, através da PARCA. Com esta medida, pretende pôr-se termo à acumulação de margens de lucros várias vezes superiores ao preço de primeira venda, com benefício de intermediários e comércio e prejuízo para os pescadores.
No ano passado, o preço médio de venda do peixe em lota foi de 1,67 €/kg e o preço médio da sardinha, espécie que representa 40% das capturas em Portugal, foi de 0,86 €/kg. Todos aqueles que compram peixe para consumo ou que conhecem os seus preços veem imediatamente nestes valores grandes lucros a que não têm acesso aqueles que arduamente, muitas vezes arriscando a vida, tiram o peixe do mar.
Recapitulando: avaliação e adequação da rede de lotas e postos de vendagem e estabelecimento de margens máximas de lucro ao longo da cadeia de valor do pescado são, estes sim, problemas que afetam o setor das pescas, problemas sentidos por pescadores e armadores e que importa solucionar. Eis que o PCP proporciona à Assembleia da República a possibilidade de propor a sua solução e é com satisfação que ouvimos que o CDS concorda com parte destas propostas, esperando, assim, que elas venham a ser aprovadas, para bem de todo o setor, que bastantes dificuldades atravessa.

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