Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Orçamento do Estado para 2011

(debate na generalidade)
(proposta de lei n.º 42/XI (2.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
O Sr. Primeiro-Ministro teima em dizer que este Orçamento defende o Estado social. Já lhe dissemos aqui que há 3000 milhões de euros de cortes nas despesas sociais.
O Sr. Primeiro-Ministro vem falando na evolução da despesa social desde 2005, mas eu queria referir-lhe dados dos Relatórios do Orçamento do Estado para 2011 e do Orçamento do Estado para 2010, que dizem que, nas funções sociais do Estado, tínhamos, em 2010, 18,5% do PIB e que teremos, em 2011 — Relatório do seu Orçamento —, 16,4% do PIB!
Portanto, há uma diminuição de 2 pontos percentuais no peso das funções sociais no Orçamento do Estado, segundo Relatórios do Orçamento do Estado.
Não estou a dar nenhuma estatística nem nenhuma aproximação.
O Sr. Primeiro-Ministro, que ficou conhecido como o Primeiro-Ministro que, para justificar as suas medidas, disse que o mundo mudou em 15 dias, parece que parou no tempo em 2008, porque só se refere aos dados da pobreza em 2008.
O Sr. Primeiro-Ministro não leu uma entrevista do Professor Bruto da Costa em que ele diz que, provavelmente, teremos mais 400 000 pobres, desde 2008 até agora?! O Sr. Primeiro-Ministro não sabe que isso é a consequência das suas medidas?! O Sr. Primeiro-Ministro não sabe que diminuir as prestações sociais, que penalizar os salários aumenta a pobreza?! É isso que o Sr. Primeiro-Ministro tem que dizer e não vir falar sempre dos dados de 2008, como se de então para cá não se tivesse
passado nada.
O Sr. Primeiro-Ministro passa a vida a falar na condição de recursos. Quero dar-lhe um conselho, com toda a humildade: para fazer esse discurso, Sr. Primeiro-Ministro, já temos o Dr. Paulo Portas, que até o faz melhor do que o senhor.
Portanto, escusa de vir dizer-nos que a condição de recursos é para pôr moralidade nas prestações
sociais. Não, Sr. Primeiro-Ministro. O Sr. Primeiro-Ministro fala sempre nos 150 000 € — dos 100 000 €, é verdade, enganou-se, andou aí a inflacionar —, mas há, na realidade, milhares e milhares de pessoas, em Portugal, que estão a ser excluídas das prestações sociais e não têm 100 000 € no banco, não são beneficiados e não são privilegiados.
Sr. Primeiro-Ministro, pode explicar agora por que é que cortar o abono de família a pessoas que têm 629 € de rendimento é uma medida para moralizar o Estado social!? O Sr. Primeiro-Ministro fala muito do Estado social, mas nem com um periscópio de um submarino conseguimos ver neste Orçamento qualquer defesa do Estado social!
E, Sr. Primeiro-Ministro, não nos venha com o discurso das restrições e de que é preciso fazer escolhas, porque já vamos em quase três horas de debate e o Sr. Primeiro-Ministro, que vai cortar 3000 milhões de euros nas funções sociais, ainda não foi capaz de dizer aos portugueses e à Assembleia da República quanto vai render ao Estado a tal famosa nova contribuição da banca! Quanto é, Sr. Primeiro-Ministro?
São 100 milhões de euros para comparar com os 3000 milhões de euros que corta nas funções sociais? Quanto é que o senhor vai ter a mais da banca, que, pelos vistos — já se percebe bem porquê! — está tão contente com este Orçamento do Estado?
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Aguiar Branco,
Nesta bancada, já percebemos qual é a táctica do PSD para este debate orçamental: é disfarçar a gravidade do voto com o impacto do discurso. Mas não vai conseguir, Sr. Deputado. Sabe porquê? Porque o que conta no final é o voto, não é o discurso.
O que contará, no final deste debate na generalidade, é quem vai aprovar o Orçamento. E quem vai aprovar o Orçamento é o PS e o PSD! E desta situação não fugiremos, nem sairemos, e o Sr. Deputado sabe muito bem disso. Aliás, o Sr. Deputado — e, há pouco, um companheiro seu de bancada — falaram no Estado social, até com um tom crítico. Enfim, é justo criticar o Governo pelo que tem
estado a fazer ao Estado social…! Mas pergunto: o PSD tem alguma divergência com o Governo em relação às medidas que afectam o Estado social?
Estive a ver as propostas que o PSD apresentou para a negociação e não vi lá nada que tivesse a ver com salários, com prestações sociais, com reformas…
Nada! Zero!
Portanto, o Sr. Deputado bem pode agora falar — tal como o seu companheiro Adão Silva — do Estado social, mas o que se verifica é que o PSD não tem nenhuma divergência com as medidas que o Governo colocou neste Orçamento e que, por isso, vai viabilizá-lo.
O Sr. Deputado pode dizer-nos se o PSD está ou não de acordo com o corte nos salários, se está ou não de acordo com o congelamento das reformas.
Quando o PCP propuser que as reformas e pensões não sejam congeladas e tenham um aumento justo, como vai votar o PSD? Como vai votar essa proposta do PCP?
Quando o PCP propuser que o abono de família não seja erradicado para as famílias que ganham 629 €, o que vai fazer o PSD? Como vai votar essa proposta do PCP?
Quando o PCP propuser que os salários da Administração Pública não sejam diminuídos, o que vai fazer o PSD em relação a essa proposta? Como vai votar em concreto? Vai, na especialidade, fazer mais 50 discursos sobre cada uma dessas propostas, dizendo que isto está muito mau, mas que as viabiliza? É aí que está o problema, Sr. Deputado Aguiar Branco! Como já disse, no outro dia, a
um seu companheiro de bancada, o PSD quer ter o proveito sem ter a fama.
O Sr. Deputado disse ao Deputado Francisco Assis que não vai permitir que o PS fuja das suas
responsabilidades. Pois bem, nós também dizemos aos Srs. Deputados do PSD que não vamos permitir que o vosso partido fuja das suas responsabilidades!
E as responsabilidades do PSD são as de aprovar este desgraçado Orçamento, fazer com que este Orçamento seja a lei que penaliza a vida de muitos portugueses e o desenvolvimento do País.

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