Intervenção de

Orçamento do Estado para 2009 - Intervenção de Honório Novo na AR

Orçamento do Estado para 2009 (debate na generalidade)

Senhor Presidente
Senhor Primeiro-Ministro
Senhoras e Senhores Deputados

Depois de ter passado meses a dizer que por causa das suas políticas milagreiras a economia nacional estava preparada para resistir à crise financeira, o Governo foi obrigado a reconhecer o contrário e que, afinal, o sistema bancário não está imune à turbulência dos mercados. Depois de há dias ter já dado garantias de 20000 milhões de euros à banca, o Governo mostrou hoje de novo a verdadeira dimensão da imunidade do sistema financeiro, fazendo aprovar uma lei para socializar os prejuízos do BPN – que vão ser pagos por todos os portugueses -, e uma outra com mais 4000 milhões de euros para capitalizar os bancos, cujas consequências na diminuição das receitas orçamentais o Governo se recusa a esclarecer.
Entretanto o Governo insiste em mascarar a sua proposta orçamental (proposta de lei 226/X) para o último ano da legislatura, dizendo tratar-se de um “orçamento de combate à crise, rigoroso, um orçamento que defende as famílias e as empresas”.
Nenhuma destas afirmações tem tradução real na proposta de Orçamento.
Quando o Governo anuncia um crescimento de 0,6% em 2009, depois de em Maio ter previsto 2%;
quando o faz numa altura em que o INE diz que o nível de confiança está em valores de 2003  e a confiança dos consumidores em níveis de 1986;
quando na proposta orçamental se estima uma queda de 50% nas exportações e se prevêem descidas acentuadas no consumo privado, no investimento global e na procura interna;
quando todas as previsões internacionais apontam para crescimentos à volta de 0,1% em 2009 – o FMI e também a Comissão Europeia - nunca afastando a possibilidade do país estagnar ou entrar em recessão económica;
quando a previsão de crescimento do PIB em 0,2% é feita em ambiente de total incerteza e só serve para o Governo dizer que Portugal vai crescer três vezes mais que a zona euro (0,2%), num acto de propaganda pouco séria;
há que concluir que, ao contrário da propaganda, este não é um orçamento prudente nem rigoroso.
Onde a falta de rigor atinge níveis ainda mais graves e maldosos é na previsão da taxa de desemprego para 2009, de 7,6%. O que não explica é como chega a estas previsões. Sabendo-se que a diminuição da taxa de desemprego depende do nível do crescimento económico, o (falso) rigor “descobriu” que é possível diminuir para menos de um terço o crescimento económico mantendo a taxa de desemprego praticamente inalterada.
A previsão do desemprego confirma o nível de manipulação estatística que o Governo anda a fazer. Mostra também a intenção de não dotar o Orçamento com as verbas necessárias para fazer face ao crescimento do desemprego. É inaceitável que, mesmo com uma taxa de desemprego “oficial” igual à de 2008, o Governo se proponha cortar 11,3% nas verbas com o subsídio de desemprego.

Senhor Presidente
Senhor Primeiro Ministro
Senhores Deputados
 
Ao contrário do que diz o Governo, esta proposta não serve para combater a crise. É um orçamento de resignação que se limita a aguardar que “as soluções caiam do céu aos trambolhões”. Não promove políticas anti-cíclicas capazes de combater a perspectiva de recessão económica com que o País se confronta.
Ao contrário do que está a fazer a generalidade dos restantes países da UE, o Governo não usa a margem orçamental que o Pacto de Estabilidade e Crescimento permite, insistindo em voltar a impor um défice de 2,2%. O Governo recusa usar um montante adicional até 1400 milhões de euros que lhe permitiria políticas de maior justiça social e de apoio às micro e pequenas empresas, que lhe permitiria aumentar o investimento público necessário para combater a crise e mobilizar o investimento privado.
Relativamente ao investimento público, e no que respeita ao PIDDAC, este continua aquém do desejável e do que seria possível caso fosse usada a margem orçamental. O PIDDAC previsto para 2009 (4641 M€) é muitíssimo inferior ao inscrito em 2005 (6724M€) e menor que o previsto em 2006 (4853 M€) e 2007 (4978 M€). E se é superior ao de 2008 isso fica mais a dever-se à intencional concentração do QREN em ano de (quase) todas as eleições que à vontade do Governo em fazer face à crise. Repito: o Governo termina a legislatura com um investimento público que não excede 45% do início da legislatura.
O Governo prepara-se para dar continuidade às mesmas opções políticas, impondo (agora com o pretexto da crise) novos e acrescidos sacrifícios exactamente aos mesmos extractos sociais e sectores de actividade. Os efeitos desta obsessão orçamental serão desastrosos para o crescimento económico, para as micro e pequenas empresas, atingirão ainda mais os que menos têm, provocando um agravamento do desemprego, das desigualdades sociais e das assimetrias territoriais

Senhor Presidente
Senhores Deputados

Ao contrário do que o Governo também diz, este orçamento não serve as famílias nem respeita os pensionistas e reformados. Não prevê qualquer recuperação do poder de compra de salários e pensões.
Com uma proposta de aumentos para a administração pública de 2,9%, o Governo rasga os compromissos assumidos há um ano quando disse que os trabalhadores não iriam perder poder de compra. Com este aumento, só repõe metade da perda de poder de compra de 2008.
Quanto aos pensionistas e reformados podem no máximo aspirar a aumentos iguais aos da inflação de 2008. Nenhum reformado ou pensionista vai ver as suas pensões e reformas valorizadas e muitos deles vão mesmo ver o seu valor aumentado abaixo do valor da inflação de 2008, num processo de degradação das pensões e reformas a que este Orçamento dá seguimento.
É caso para voltar a dizer que enquanto para a banca há milhares de milhões de euros de garantias e apoios, há até o Estado a pagar os prejuízos, para repor o poder de compra de quem trabalha ou aumentar de forma digna as pensões e as reformas há sempre a crise ou o défice orçamental para usar como falsos pretextos.
Quanto aos Fundos de Investimento para o Arrendamento, o Governo cria um sistema para desenvolver negócios totalmente isentos de impostos, verdadeiros paraísos fiscais que vão mais uma vez beneficiar a banca e os grupos imobiliários. Não é um mecanismo virado para as famílias, é um mecanismo que se vai servir da situação desesperada de muitas famílias para lhes impor soluções de que resultará, em muitos casos, a perda irreversível das respectivas casas.
Em vez baixar as taxas de juro e conter as margens de lucro impostas pelos bancos nos empréstimos à habitação – como há meses defende o PCP -, o Governo cria um sistema que potencia a limpeza do balanço dos bancos e assegura liquidez financeira para os grupos imobiliários com milhares de fogos por colocar. As garantias dadas às famílias neste processo são mínimas e não estão tratadas na proposta de lei. A forma como se determina o valor da venda das casas, como se determina o valor e a finalidade da renda ou o valor de uma eventual recompra, tem que estar no texto da lei, não pode ser um cheque em branco na mão da vontade de um governante de turno.

Senhor Presidente
Senhor Primeiro Ministro
Senhores Deputados

Este orçamento também não serve as micro e pequenas empresas nem a economia nacional.
A redução da taxa do IRC, para 12,5%, aplicável aos primeiros 12500 euros de resultados só produz efeitos em 2010, não beneficia milhares de empresas que não apresentam resultados e, por mais irrisório e insignificante que seja, beneficia também os grandes grupos e empresas.
Quanto à eliminação do regime simplificado, o Governo, em vez de o melhorar, opta por prejudicar milhares de micro empresas com volume de negócios inferior a 150000 euros que só têm actividade e estruturas de custos para integrar este regime.
Quanto ao pagamento especial por conta (PEC), à sua manutenção ou eliminação, à forma abusiva como é aplicado, o Governo nada diz. Como também nada muda nos prazos de reembolso e na forma de pagamento do IVA, pelo menos – e tal como o PCP já propôs em 2007 - no que respeita às relações com a administração pública. Quanto às dívidas às empresas, o Governo foi obrigado a anunciar o pagamento imediato de mais de mil e duzentos milhões de euros. Digo e repito: o Governo foi obrigado porque nada está ainda previsto nesta proposta de Orçamento e porque ainda há quinze dias o Ministro das Finanças nem reconhecia dívidas, quanto mais pagá-las!
Enquanto é lento e avarento no apoio às micro e pequenas empresas, o Governo continua a proteger os interesses dos grandes grupos financeiros e não financeiros. Para além das novas formas de evasão fiscal com cobertura legal, mantém benefícios fiscais injustificados. O off-shore da Madeira mantém benefícios de quase 1800 milhões de euros; fazem-se contratos de investimento com vultuosos benefícios concedidos a grupos empresariais, (como é o caso conhecido dos 200 milhões concedidos à GALP); as taxas efectivas de IRC do sector bancário continuam muito abaixo do valor nominal, não obstante os desmentidos nunca comprovados do Governo.
A proposta orçamental é também fiscalmente injusta, agravando os impostos indirectos e atingindo com especial incidência os trabalhadores, os reformados e as camadas mais débeis e com menores rendimentos. Entretanto, nada faz o Governo para penalizar os rendimentos faustosos e as grandes fortunas, não obstante as lágrimas de crocodilo que o Governo costuma verter nesta matéria.
Contra o interesse nacional, o Governo insiste na sua política de privatizações. Outra coisa não seria aliás de esperar de um Governo que se ufana – sem corar de vergonha - de ser o “grande privatizador” do país. Excepção feita ao BPN, onde se apressou a fazer com que os portugueses paguem os prejuízos, o Governo insiste numa política de alienação de empresas públicas altamente rentáveis (GALP, ANA, INAPA, TAP,…), anunciando receitas de 1200 milhões de euros e assim colocando, de mão beijada, ao dispor de grupos e interesses privados as mais valias e dividendos de que todo o País deveria continuar a beneficiar.

Em síntese, Senhor Presidente, Senhor Primeiro Ministro, Senhoras e Senhores Deputados:
Ao contrário do diz e invariavelmente repete o Governo, a proposta de Orçamento do Estado para 2009 não combate a crise nem defende as famílias, é uma proposta que despreza quem trabalha e não respeita reformados nem pensionistas, é uma proposta que não serve as micro e pequenas empresas nem a economia nacional, é um orçamento mascarado de propaganda eleitoral que se limita a dar continuidade às politicas deste Governo e que por isso não serve o País.

Disse.

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