Intervenção de

Orçamento de Estado para 2008 - Intervenção de Jerónimo de Sousa na AR

Orçamento de Estado para 2008 (debate, na generalidade)

Sr. Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,

Estamos a assistir a um acto espantoso: numa das maiores encenações de um espectáculo virtual previamente preparado, aqui estamos, com galerias cheias, entre luzes estonteantes e petardos de pólvora seca, a ver um duelo pífio e que pode ter como epílogo, algures nos Passos Perdidos, a repetição da cena do Sr. Primeiro-Ministro, satisfeito, com um ex- Primeiro-Ministro, a dizer a famosa frase: «Porreiro, pá!».

Mas, diluídas e silenciadas serão as malfeitorias de um Orçamento que expressa a persistência de um caminho de injustiças e desigualdades sociais de abandono do necessário crescimento económico e do emprego.

O Sr. Primeiro-Ministro apresentou-se com o que pensa ser a sua «coroa de glória», a redução do défice.

Não disse foi à custa de quê e de quem o conseguiu! Não disse qual foi o preço que o País pagou e se se justiçava pagá-lo! Esqueceu-se de referir que foi à custa do emprego, dos salários da Administração Pública e dos demais trabalhadores, do corte dos direitos dos portugueses e das funções sociais do Estado, nomeadamente na saúde e na educação! Esqueceu-se de referir que foi à custa do aumento dos impostos indirectos, como o IVA, que penaliza o consumo das camadas populares, e não disse que os poderosos, as grandes fortunas, o capital financeiro, os grandes grupos económicos não só não pagaram nenhum preço como engordaram os seus lucros e privilégios!

Com tanto auto-elogio, Sr. Primeiro-Ministro, como explica que tenhamos o doloroso título de «País europeu com mais injustiça social»?! Esqueceu-se de dizer que foi à custa de incontáveis sacrifícios das camadas populares do nosso povo - os únicos que pagaram a factura da estratégia errada do seu Governo e das suas opções políticas - e que, em vez de aproveitar os prazos mais alargados do Pacto de Estabilidade e Crescimento para relançar a economia com mais vigor e fazer recuar o desemprego, fez precisamente o contrário, penalizando ainda mais os portugueses.

Em relação aos impostos, prossegue a injustiça fiscal, há um novo agravamento dos impostos dos reformados, as reformas passam a ser tributadas a partir de 6000€ por ano. É sempre a puxar para baixo, Sr. Primeiro-Ministro, sempre a puxar para baixo quem menos tem e menos pode.

Entretanto, os benefícios fiscais para o offshore da Madeira aumentam de 1000 milhões, em 2007, para 1780 milhões, em 2008! Mais 780 milhões! Dão-se de «mão beijada» milhões de euros ao grande capital e vaise penalizar quem conta os cêntimos das suas reformas e pensões, enquanto os salários da Administração Pública continuam também a marcar passo e o custo de vida a aumentar em resultado do sistemático aumento dos bens alimentares, como o caso do pão, que este ano já subiu 20%, da energia, tendo a electricidade tido aumentos superiores aos da inflação, e de outros bens e serviços essenciais.

Tudo sobe acima da inflação prevista, menos os salários, as reformas e as pensões.

É no âmbito deste Orçamento (proposta de lei n.º 162/X) que vamos propor que a taxa normal do IVA seja reduzida de imediato para 20% e, em 2009, para 19%. Esta medida justifica-se por razões de dinamização económica do mercado interno e também por razões sociais, já que são os produtos de consumo popular e as classes populares as mais afectadas pelo aumento dos impostos.

Dramatiza-se o défice para cortar nos salários, nos direitos das pessoas, mas nem um tostão se corta - antes se acrescenta - nos benefícios fiscais, o que permitiria reduzir o tão empolado défice.

Sr. Primeiro-Ministro, já agora, que falamos do custo de vida e dos salários, como e quando pensa satisfazer o compromisso de actualização faseada do salário mínimo nacional com que se comprometeu recentemente?

Sr. Primeiro-Ministro, para respeitar o tempo que me é devido, colocolhe uma última questão, que tem a ver com a Estradas de Portugal.

Este Orçamento, para além de prever uma política de privatizações, apresenta uma novidade, que é a situação da Estradas de Portugal, outro negócio de milhões que está em preparação, à custa da mobilidade dos portugueses, e que precisa de ser explicado, Sr. Primeiro-Ministro! Não se trata apenas de uma inaceitável desorçamentação, com a retirada da Estradas de Portugal das contas públicas, e com ela a possibilidade de fiscalização pelo Parlamento, mas da intenção de privatizar a Estradas de Portugal e de concessionar, durante quase 100 anos, a Rede Rodoviária Nacional. 100 anos, Sr. Primeiro-Ministro! Ou 90 e tal anos, se quiser!

Com que direito o Sr. Primeiro-Ministro se comporta como um novo-rico, que resolve desbaratar a prata da família de um período de 100 anos, ao entregar a um grande grupo económico aquilo que tem a ver com o futuro de gerações de portugueses. Não considera isto um escândalo, Sr. Primeiro-Ministro?!

 

  • Assuntos e Sectores Sociais
  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Regime Democrático e Assuntos Constitucionais
  • Assembleia da República
  • Intervenções