Intervenção de

Orçamento de Estado para 2008 - Intervenção de Honório Novo na AR

Orçamento de Estado para 2008 (debate na generalidade)

 

 

 

 

 

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Pedia-lhe para fazer um esforço de responder com rigor e directamente às perguntas que lhe são feitas. E, por isso, voltamos à Estradas de Portugal.

Não foi a oposição que inscreveu 99 anos no Orçamento, Sr. Primeiro-Ministro, foi o senhor.

Por que é que não inscreveu lá 9, 19 ou 29 anos e escolheu 99?!

E, já agora, diga-nos em que página do Orçamento (proposta de lei n.º 162/X) é que se encontra o orçamento da Estradas de Portugal. Quais os projectos previstos para 2008? Qual o investimento previsto para 2008?

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, é capaz de responder à pergunta de quanto pensa aumentar o salário mínimo nacional para 2008? Sempre vai aumentá-lo para 426 €, como prometeu no ano passado?

Sr. Primeiro-Ministro, em relação a benefícios fiscais, há um ano o senhor anunciou ao País que, finalmente, ia combater os privilégios fiscais do sector bancário. Resultados concretos destes anúncios, Sr. Primeiro-Ministro? Não sabe? Não se recorda? Eu digo-lhe: a taxa efectiva do sector bancário continua em 15%. A taxa efectiva em IRC do sector bancário continua, em média, 10 pontos percentuais abaixo do que pagam as pequenas e médias empresas.

Quanto a medidas legislativas, Sr. Primeiro-Ministro, que o senhor aqui tanto anunciou há um ano, zero!

Nem uma foi aprovada com efeitos em 2007. Sabe quanto é que o Estado e os portugueses perderam com isto, Sr. Primeiro-Ministro? Eu digo-lhe: foram, em 2006, 400 milhões de euros. Sabe o que é que seria possível fazer com tudo isto, Sr. Primeiro-Ministro? Não sabe?! Pois eu digo-lhe: seria, por exemplo, possível, porque chega e sobra, para descer o IVA, tal como propomos, neste Orçamento do Estado! Chegava e sobrava para aliviar os portugueses do tal esforço que o senhor invoca e que atinge quem menos pode e quem menos ganha neste país.

Faça as contas, Sr. Primeiro-Ministro, e verá que chega para tudo isto e muito mais. O problema é que o senhor não quer, porque quer manter os privilégios para quem os detém e os

quer conservar. Esta é que é a verdade!

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

A proposta de Orçamento para 2008 não tem uma única ideia, uma proposta que mostre a vontade do Governo em inverter o caminho percorrido, não tem um simples sinal que indicie qualquer alteração, por pequena que seja, nas políticas de direita adoptadas e concretizadas pelo Governo do PS nos últimos dois anos e meio.

Por tudo isso, este Orçamento é um mero instrumento de continuidade ao serviço dessas políticas e dos grandes interesses económicos e financeiros, reforçando, assim, o ataque aos direitos dos trabalhadores, ao poder de compra dos portugueses, às funções sociais do Estado, comprometendo o desenvolvimento do País, o crescimento da economia e impedindo a correcção das assimetrias regionais.

Tudo isto está, aliás, bem visível na proposta orçamental do Governo, pelo menos nos seguintes dez aspectos.

Primeiro aspecto: a preocupação essencial do Governo continua a ser a redução do défice, mesmo para além do que está inscrito no Programa de Estabilidade entregue em Dezembro do ano passado em Bruxelas.

Nada justifica que o Governo, em vez do défice de 2,6%, queira agora atingir 2,4%, um valor ainda mais baixo e que significa sacrifícios ainda mais intensos e violentos, impostos sobretudo aos portugueses mais desfavorecidos.

Segundo aspecto: o nível insuficiente do crescimento previsto para 2008.

Apesar de revista em baixa, esta previsão do Governo é optimista, havendo quem afirme roçar a irresponsabilidade face a uma conjuntura internacional com factores de instabilidade, que se confronta com decisões do Banco Central Europeu de manter juros insuportáveis para as famílias e para quem quer investir e que insiste numa política monetária que é bem capaz de comprometer boa parte das previsões de crescimento das exportações.

Mesmo com todo este optimismo, Portugal vai, pelo oitavo ano consecutivo, continuar a divergir da média comunitária. Ou seja, a ambição deste Governo é tamanha que Portugal vai continuar a empobrecer alegremente face aos seus parceiros europeus.

Terceiro aspecto: a proposta orçamental mostra que o Governo desistiu do combate ao desemprego, abandonando de vez a célebre promessa de criar 150 000 novos postos de trabalho. O Governo reviu em alta as suas previsões: em 2007, corrige a taxa de desemprego de 7,5% para 7,8%; em 2008, passa o desemprego de 7,2% para 7,6%.

Quanto ao desemprego, importa ainda assinalar que, há poucos dias, o Eurostat indicou um desemprego de 8,3% e anunciou que Portugal subira mais um lugar no triste ranking dos países com mais desemprego, ocupando agora um lamentável quarto lugar na Europa comunitária.

Sr. Deputado Afonso Candal, quanto ao desemprego, não venha com estatísticas, nem gerir as estatísticas como fez o Primeiro-Ministro. É sempre a subir, infelizmente, sempre a subir!

Quarto aspecto: o Governo confronta o País com níveis insuficientes de investimento público. Não é um investimento virtuoso. É um investimento absolutamente insuficiente!

Não bastava já a opção de «cortar a eito» nos já de si baixos níveis de PIDDAC.

Quanto a 2008, este Orçamento é uma espécie de «peça para todos os gostos»: de manhã, o Governo anuncia um aumento de 4%; à tarde, Teixeira dos Santos e José Sócrates anunciam, aqui, mais de 6%; à noite, o Governo faz disparar os números para mais de 20%.

Entretanto, o Governo «esconde» completamente a REFER e a Estradas de Portugal e procede a uma formidável desorçamentação de centenas de milhões de euros, numa operação

que, no segundo caso, visa «dar de mão beijada» - e durante 100 anos - um negócio milionário, cuja conformidade legal está ainda por demonstrar.

O Governo transformou a análise do PIDDAC e do investimento público num exercício de adivinhação metafísica que impede qualquer acção responsável de fiscalização e acompanhamento parlamentar.

Quinto aspecto: o Governo consagra transferências para as autarquias que esquecem o congelamento de verbas que dura há já três anos, não obstante o poder local estar confrontado

com novas responsabilidades e encargos - como o aumento das contribuições para a Caixa Geral de Aposentações - de que nunca foi compensado nem agora se pretende compensar.

Ao mesmo tempo, o Governo «risca» do mapa do PIDDAC literalmente muitas dezenas de municípios, em especial do interior, insistindo numa política clara e inaceitável de aprofundamento das assimetrias regionais.

Sexto aspecto: ao contrário do que a propaganda teima em fazer crer, as funções sociais do Estado são mais uma vez desprezadas e desvalorizadas.

Prosseguindo a via economicista de cortes e encerramentos de serviços públicos essenciais, o Governo nem sequer atinge, em 2008, o mesmo peso que as despesas sociais tinham no seu próprio Orçamento para 2006. Outra coisa, Sr.as e Srs. Deputados, não seria, aliás, de esperar de um Governo que já encerrou 2500 escolas do 1º ciclo, que conseguiu despedir milhares de professores e ao mesmo tempo construiu a ficção pedagógica de anunciar mais alunos para menos professores, que encerra maternidades e SAP, deixando, assim, desprotegidas milhares e milhares de pessoas, sobretudo no interior do País.

Sétimo aspecto: a proposta orçamental é um verdadeiro deserto em medidas destinadas a assegurar a equidade e a justiça fiscal.

Um peso crescente dos impostos indirectos; a ausência de medidas concretas de combate ao planeamento fiscal agressivo, não obstante a cortina de propaganda aqui usada há um ano; a constatação de que a taxa real de IRC do sector bancário permanece 10 pontos abaixo do que paga qualquer micro, pequena ou média empresa, representando, em 2006 - repito, em 2006 -, uma perda global de 400 milhões de euros; a constatação de que os benefícios fiscais na zona franca da Madeira passam de 1000 para 1800 milhões de euros, um acréscimo de cerca de 800 milhões de euros; a confirmação de que os benefícios fiscais em PPR vão atingir mais de 100 milhões de euros, beneficiando apenas 5% dos contribuintes, curiosamente, aqueles com maiores rendimentos.

Entretanto, Sr.as e Srs. Deputados, verifica-se que a diminuição do IRC no interior do País vai provocar apenas um acréscimo de 1 milhão de euros em despesa fiscal, mostrando bem a insignificância da medida.

Ao mesmo tempo, verifica-se que o anunciado aumento das deduções para pessoas portadoras de deficiência representará, afinal, um acréscimo de despesa fiscal de apenas mais 4 milhões de euros.

Ou seja, estes dois exemplos representam, afinal, benefícios de apenas 5 milhões de euros. Mas, como se provou neste debate, servem às mil maravilhas para tentar esconder as verdadeiras intenções deste Orçamento, isto é, a manutenção dos privilégios, em PPR e na zona franca da Madeira, que implicam uma despesa fiscal, essa, sim, faraónica, de quase 3000 milhões de euros.

Oitavo aspecto: a insistência num pacote, não nomeado, de privatizações de 900 milhões de euros mostra que o Governo quer continuar a alienar empresas e serviços públicos em sectores estratégicos para o desenvolvimento económico e social do País.

Ao mesmo tempo que, na área da saúde - por exemplo, em novos hospitais ou em grandes investimentos públicos, como TGV, Ota, entre outros -, reitera a intenção de, através de parcerias público-privadas, garantir ao sector privado uma rendosa apropriação de milhões de euros e a assumpção ruinosa de compromissos futuros que irão recair sobre os ombros de todos os portugueses, o Governo do Partido Socialista quer também continuar a abdicar de dividendos em empresas públicas rentáveis, muitas delas constituindo monopólios naturais, onde a concorrência nem existe nem poderá existir, colocando-as assim ao serviço de interesses e de objectivos de grandes grupos privados.

Nono aspecto: o Governo quer despedir ou colocar milhares de funcionários públicos na situação de mobilidade especial. Só assim se explica o corte de quase 500 milhões de euros nas remunerações certas e permanentes que quer fazer relativamente a 2006. Ao mesmo tempo, o Governo é o primeiro a dar o mau exemplo na precarização, aumentando 20% as verbas destinadas a contratos a termo na função pública.

Enquanto corta em despesas com pessoal, o Governo quer gastar 1200 milhões de euros em aquisições de serviços, dos quais, 190 milhões em estudos, projectos e consultorias que podiam, e deviam, ser feitos pelos trabalhadores a dispensar.

Esta, Sr.as e Srs. Deputados, é a verdadeira face da política de recursos humanos do Governo do PS!

Décimo, e último, aspecto: o Governo insiste numa proposta de aumentos que não ultrapassa 2,1%, o mesmo valor que, aliás, o Orçamento atribui à inflação esperada, na qual, como todos sabemos, o Governo, e não por acaso, nunca acerta.

Esta proposta não garante - bem pelo contrário! - qualquer recuperação do poder de compra de trabalhadores da Administração Pública que, desde 2000, já perderam quase 10% do poder de compra.

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Sr.as e Srs. Deputados:

Apresentamos razões que mostram que a proposta de Orçamento é lesiva dos interesses dos trabalhadores e da generalidade da população, comprometendo, mais uma vez, a economia do País e o seu crescimento.

Sem prejuízo de outras propostas que já anunciámos, como a eliminação do sigilo bancário e dos benefícios fiscais em sede de PPR, a tributação das mais-valias bolsistas ou a fixação de uma taxa efectiva mínima de 20% de IRC para o sector financeiro, queremos apresentar hoje, nesta fase do debate, a proposta de redução da taxa normal de IVA para 20%, em 2008, e para 19%, em 2009.

É uma proposta justa, indispensável e totalmente exequível, que pretende iniciar um caminho de normalização da taxa do IVA, que aumentou quatro pontos percentuais no tempo dos governos PSD/CDS e PS.

É uma proposta que visa devolver à economia capacidades retiradas, sentidas de forma mais especial nas zonas fronteiriças.

É uma proposta que visa aliviar o agravamento da injustiça fiscal causado pelos aumentos constantes do IVA.

É um caminho indispensável para a dinamização do consumo interno e o reforço da competitividade dos nossos sectores produtivos.

A decisão de aumento do IVA foi um erro assente na obsessão pelo défice e na busca, a qualquer preço, de receitas socialmente injustas, mantendo, ao mesmo tempo, inaceitáveis privilégios fiscais.

Hoje, a manutenção desta situação é ainda mais escandalosa. É que o Governo quer ir mais além do que se comprometeu perante Bruxelas e não utiliza, com certeza com intuitos eleitorais, a margem que as suas próprias contas demonstram já existir para 2008, na lógica do Pacto de Estabilidade que, aliás, continuamos a rejeitar.

A proposta do PCP para reduzir o IVA implica que, em 2008, o défice 7 DE NOVEMBRO DE 2007

61 orçamental seria, quando muito, 2,6%, exactamente igual ao valor previsto no Programa de Estabilidade e Crescimento entregue em Bruxelas. Em vez do valor anunciado de um défice de 2,4%, o Orçamento do Estado continuaria assim a manter o valor inscrito naquele Programa, aliás, já abaixo dos 3% impostos pelo Pacto de Estabilidade.

Não há, portanto, nenhuma razão - nem uma! - para que o Governo não considere e aceite esta proposta. Não há nenhuma razão para que não se inicie, já em 2008, a redução da taxa normal do IVA, a não ser a vontade de, provavelmente, o Governo querer usar essa solução apenas em 2009, tendo em vista o calendário eleitoral.

Sr. Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

A única novidade deste Orçamento é, certamente, uma estratégia de campanha eleitoral que já e pressente. Quanto ao resto, trata-se de prosseguir imposições, tão desnecessárias e inúteis quanto violentas e inaceitáveis, que atingem os trabalhadores, os desempregados, os reformados, os portugueses mais desfavorecidos e desprotegidos e que comprometem a economia nacional e o desenvolvimento do País.

Mas que não se iluda este Governo: nenhuma táctica será capaz de travar e diminuir a luta, a resistência contra as políticas que este Orçamento quer manter e reforçar.

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