Intervenção de Paulo Raimundo, Secretário-Geral do PCP, Sessão «Pelo direito à Habitação – testemunhos da realidade na região do Porto»

As opções do PS para habitação foram apenas mais portas abertas à banca e à especulação

Há dois anos colocámos a habitação como um dos sectores cujas respostas eram inadiáveis, juntamente com os salários, as pensões e o Serviço Nacional de Saúde. 

Dois anos depois e depois da chantagem e da pressão do PS, dois anos depois de, com o apoio do Presidente da República, termos ido para eleições antecipadas, aí está o tempo e a vida a dar-nos razão.

O PS com tudo nas mãos, um Governo, uma maioria e dinheiro, não só não resolveu nenhum dos problemas inadiáveis como eles se agravaram e a habitação é um exemplo dramático disso mesmo.

Cabe ao Estado garantir o acesso à habitação, esta é uma responsabilidade, um dever e um direito constitucional que obriga a Assembleia da República, o Governo e o Presidente da República.

Também neste sector a Constituição está muito longe de ter tradução no dia-a-dia de quem vive e trabalha no nosso País.

Aliás, o negócio da habitação é em si mesmo revelador de um outro ataque diário à Lei fundamental, que é a subordinação do poder político ao poder económico, exactamente ao contrário ao que afirma a Constituição. 

Também aqui, caso se cumprisse a Constituição, a situação a que chegámos seria outra e para melhor.

A habitação está entre os sectores económicos mais liberalizados e menos regulamentados da nossa sociedade, esta realidade é um desastre para milhões de pessoas, mas um bom exemplo do que seria a sociedade caso os projectos de liberalização de todos os sectores fossem por diante, como querem alguns.

Quem tem casa arrendada e se vê confrontado com aumentos de renda, risco ou efectivo despejo, quem tem um crédito à habitação e vê a prestação aumentar para valores incomportáveis, quem tem de sair das suas casas, voltar a casa dos pais, dos sogros, viver em tendas, ou mesmo na rua, quem enfrenta dificuldades e privações, que tudo faz para, até ao limite, aguentar o seu tecto e a sua habitação, quem tem de abandonar os seus estudos porque não consegue aguentar o aluguer de um quarto ou de uma cama, esse drama para centenas de estudantes, quem passa por tudo isto, e são milhares e milhares, milhares e milhares que não apenas os mais pobres, é também gente que trabalha todos os dias, que tem salário, gente que tinha uma vida remediada e de repente tudo se alterou, quem passa por tudo isto vive estes dramas muitas vezes de forma isolada, muitas vezes com vergonha, enfrenta cada uma destas situações num quadro de crescente fragilidade.

E enquanto milhares e milhares travam este problema, há uns poucos que se enchem à custa das desgraças de muitos.

São injustificáveis e é até vergonhosos os milhões de lucros da banca e os milionários negócios dos fundos imobiliários.

Nada disto acontece por acaso nem resulta da iliteracia financeira, este é o resultado de uma política de direita que opta por reduzir o papel do Estado e o investimento em habitação pública à quase total insignificância e irrelevância, deixando a habitação, lá está, sujeita ao milagroso mercado cujos milagres são sempre para os mesmos.

O problema não é a falta de casas, o problema é a falta de casas que as pessoas consigam pagar. 

É esse o verdadeiro drama para muitos milhares de famílias em Portugal, também aqui no Porto e na região.

Está hoje evidente que só é possível responder à situação actual rompendo com o que está em curso, e abrindo o caminho a uma política que efectivamente respeite, cumpra e faça cumprir a Constituição, consagrando a habitação como ela deve ser, um direito a que a todos têm de ter direito.

Envolvendo neste processo os que são os principais interessados, é o papel das associações de moradores e de habitação, ou o papel que têm e podem ter ainda mais as cooperativas de habitação.                                                                                

A garantia do direito à habitação exige medidas urgentes que defendam os inquilinos da subida das rendas, que travem as prestações do crédito e aumentem a oferta pública de habitação.

Já não se aguenta mais. 

É preciso enfrentar a especulação e dinamizar uma política pública  de habitação.

É preciso travar o aumento das rendas, impedir o drama dos despejos, é urgente travar a subida das prestações e impedir a perda da casa, é urgente aumentar a oferta pública de habitação a partir de imóveis públicos e outros que possam ser destinados a esse fim.

As propostas do PCP correspondem às necessidades prementes de milhões de pessoas e são não só possíveis de levar por diante, como, a cada dia que passa, se tornam mais urgentes.

As opções do actual Governo PS, na sequência das opções de governos anteriores e também em linha com o que defendem PSD, IL e Chega, são, como está à vista, insustentáveis.

PS, PSD, Chega, IL e CDS, correm todos na mesma pista, todos assumem as mesmas opções de fundo, opções que beneficiam sempre o infractor.

Para lá do barulho e dos decibéis, que se diga uma, uma única proposta de fundo em que se identifiquem opções diferentes entre estes partidos, uma que seja.

Poupemos o esforço na procura de uma que seja, porque infelizmente não há.

O PS, por sua opção, também no que toca à habitação tirou o tapete ao PSD, CDS, Chega e IL.

E depois ainda vem o Primeiro-Ministro acusar o PCP de olhar para o PS como inimigo principal.

O PCP não olha para o PS como inimigo principal, o PCP denuncia, isso sim e com insatisfação, a política de direita que o PS por sua opção leva a cabo e a habitação é disso exemplo. 

«Mais Habitação», mais portas abertas à banca, mais benefícios aos grupos especulativos, é isto que resulta no fim do dia o «Mais Habitação», tivesse o PS optado por enfrentar os grandes interesses, tivesse o PS optado por enfrentar os banqueiros, tivesse o PS colocado no centro da sua opção os trabalhadores e o povo, e então cá estaríamos nós a apoiar esse caminho e lá estariam PSD, CDS, Chega e IL com razões para fazer oposição. 

Mas a realidade, infelizmente, foi e é outra.

Deixar nas mãos do mercado o destino da habitação em Portugal, o Estado a financiar os interesses imobiliários por via de apoios financeiros e benefícios fiscais, aligeirar regras e critérios urbanísticos facilitando e abrindo campo a todo o tipo de esquemas que envolvem a especulação imobiliária, a realidade, para lá de uma ou outra medida pontual, é esta.

E é esta realidade que é urgente transformar todos os dias, com a luta, a mobilização e alargamento a cada vez mais gente da necessidade, de uma vez por todas, de a política servir quem trabalha, quem trabalhou uma vida inteira, servir quem cá vive e trabalha e não como tem acontecido, os grupos económicos.

No próximo dia 10 de Março temos mesmo uma oportunidade de contribuir para mudar de política e de acertar as contas com quem devem ser acertadas e desde logo pôr os lucros da banca e os seus 12 milhões de euros de lucro diários a suportar as subidas das taxas de juro decretadas pelo BCE, travar o aumento das rendas, pôr fim aos despejos e acabar de uma vez por todas com os benefícios fiscais aos grupos económicos.

Uma oportunidade para concretizar as várias propostas que temos para a habitação e das quais não desistimos.

Não adianta virem com a conversa que não há dinheiro, porque nós temos 25 milhões de provas de como há dinheiro, esses escandalosos 25 milhões de euros de lucros por dia que os grupos económicos encaixam às custas de cada um de nós.

Há dinheiro, está é concentrado numa ínfima minoria em detrimento da esmagadora maioria da população, que trabalha e trabalhou uma vida inteira, que sofre as mais variadas discriminações, a tal população, os tais milhões de pessoas que antes de incumprirem os seus pagamentos com a habitação cortam e sacrificam tudo o que podem, precisamente porque este é o seu maior bem, e que mesmo assim, e por vezes mesmo trabalhando e recebendo salário, não conseguem aguentar estes custos.

Isto não pode ser e com o reforço da luta, com o empenho de cada um, com o esforço colectivo, com o reforço do PCP e da CDU, isto não vai continuar assim.

Aí estão as eleições, vamos a elas.

Desde logo as eleições nos Açores, onde o povo açoriano talvez como o fez a população da Madeira, vai dar mais força à CDU e vai voltar a eleger o deputado da CDU que tanta falta fez e faz à Região.

E assim será também nas eleições legislativas.

A CDU vai crescer, vai ter mais votos e mais deputados.

E assim irá ser porque se há coisa que milhares e milhares já perceberam é que deputados para defender a banca, os fundos imobiliários, o chamado mercado, deputados para defender a vida cada vez mais apertada para a maioria, desses já há e demais na Assembleia da República.

O que faz falta é mais deputados do PCP e da CDU, para fazer a diferença, para apoiar tudo o que seja positivo, travar tudo o que seja negativo, venha de onde vier, mais deputados para defender os trabalhadores, o povo, enfrentar os grandes interesses e consagrar o direito constitucional à habitação.

E assim será porque o voto de cada um que enfrenta dificuldades em aceder ou garantir a habitação, o voto desses para quem há sempre mês a mais para o salário ou a reforma que têm, o dos que estão desesperados, zangados, se sentem justamente traídos, o voto desses e de cada um vale tanto como o voto de qualquer accionista ou dono dos bancos, mas pode valer ainda mais se não for colocado no mesmo saco dos que se acham donos disto tudo, desses que quanto mais nos apertam mais se enchem.

Com empenho, determinação, confiança e alegria, vamos a isto!

 

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