Intervenção de

OPA da SONAE sobre a PT - Intervenção de Honório Novo na AR

Declaração política acerca da OPA da SONAE sobre a PT

 

 

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados

O que há muito se desenhara foi há dias confirmado: a Autoridade da Concorrência vai permitir a fusão entre a SONAE e a PT, isto é, a AdC vai fechar os olhos à anexação da Portugal Telecom pelo Grupo de Belmiro de Azevedo.

Com esta decisão as consequências para a PT e para o mercado das telecomunicações em Portugal serão pelo menos duas: a desarticulação da maior empresa nacional de comunicações em que o Estado detém ainda um papel relevante - com as previsíveis consequências ao nível do emprego -, e a concentração nas mãos da SONAE de uma quota superior a 65% das comunicações móveis e da banda larga em Portugal.

Que à AdC não importe a desagregação do mais importante grupo de comunicações em Portugal já quase não admira. O que mais espanta - a muitos observadores nacionais e internacionais - é que o regulador que existe para que a concorrência seja assegurada permita que, de mão beijada, um grupo privado tenha a possibilidade de construir uma posição praticamente monopolista no sector das telecomunicações móveis em Portugal.

Para aparentar alguma equidistância, a AdC recomenda algumas medidas aparentemente correctivas, aconselhando preventivamente a adopção de "remédios" - certamente para impedir que Belmiro de Azevedo tenha alguma indisposição por excesso de fartura!...

A verdade é que as medidas recomendadas pela AdC não podem ser levadas a sério.

Elas são absolutamente iníquas do ponto de vista dos interesses da SONAE, já que, no fundamental, e segundo até confirma o Finantial Times - jornal normalmente bem informado sobre esta temática - quase todos esses "remédios"faziam já parte das condições da OPA lançada pelo Grupo de Belmiro de Azevedo, designadamente, e a título de exemplo, a alienação dos activos do cabo da PT mais a possibilidade de permitir a criação de operadores móveis virtuais.

Mas há mais. E mais estranho ou espantoso.

A SONAE apropria-se da PT, funde a TMN com a sua Optimus e cria o que constitui um verdadeiro maná monopolista, e a AdC - para não deixar por mãos alheias o seu papel de defensora da concorrência - impõe a libertação de uma das licenças de operador de comunicações móveis.

Mas, e há sempre um grande "mas" nestas operações de benefício de grandes grupos privados, o que não é sublinhado nem se enfatiza, é que a AdC permite que o Engº Belmiro de Azevedo conserve a posse dos indicativos 93 e 96 e mantenha em seu poder a base de dados de todos os actuais clientes TMN e Optimus.

Isto é, tudo não passa de um faz-de-conta que diz querer facilitar o aparecimento de um novo operador concorrente, (num mercado já de si absolutamente saturado e sem nenhuns motivos para gerar o aparecimento de mais operadores), onde a fusão agora apadrinhada cria um monopólio que amarra ferreamente os clientes e todos os instrumentos essenciais à sua conservação.

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados

"A partir de agora chegou a hora dos accionistas"! O "Estado actuará da forma que achar mais conveniente para salvaguardar os seus interesses neste campo".

Foi assim que alguém muito responsável na PT comentou o aval da AdC à desagregação da PT e à criação de um novo monopólio SONAE nas comunicações móveis.

É exactamente isso que se exige e espera do Estado e do Governo. Que defenda os interesses colectivos e o interesse do País perante a estratégia monopolista de um grupo privado. O que duvidamos é que o Governo esteja interessado em desempenhar esse papel.

O que está em jogo é a existência, ou não, de uma empresa que conserve uma participação pública relevante e em que  o Estado exerça o seu papel para garantir neste sector estratégico uma lógica de serviço público que assegure condições de igualdade de acesso a todos e em todo o território nacional.

A anexação da PT pela SONAE não cria apenas um monopólio nas telecomunicações. Esta anexação desagrega e desarticula a PT.

Cria um grupo privado fortemente endividado que estará mais interessado em gerar mais valias do que em realizar os investimentos necessários à modernização e implementação de novos serviços nas comunicações, tudo isto com potenciais consequências negativas na qualidade e acessibilidade do serviço prestado e, igualmente, na degradação dos preços praticados.

Esta anexação - pelo endividamento que vai gerar - retira também elevadas receitas fiscais que o Estado tinha garantido em sequência do processo normal da actividade e do desenvolvimento empresarial dos dois operadores.

Esta anexação põe em risco sério o emprego de centenas e centenas de trabalhadores da PT - e porventura também da SONAE - para além dos que estão já ameaçados com os planos de despedimento, (agora eufemisticamente designados por "outplacement"), previstos para o próximo biénio e que poderão sacrificar bem mais de 2.000 postos de trabalho no lume brando destas operações de fusão.

Esta anexação põe finalmente em risco a integridade dos fundos de pensões, comprometendo a liquidação de mais de 2.500 milhões de dívidas da PT e a viabilidade futura das pensões dos seus trabalhadores.

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados

A anexação da PT pela SONAE é uma operação que não serve o País. É contrária aos interesses dos utentes, é contrária à modernização do sector em Portugal, compromete a receita do Estado, vai provocar dramáticas consequências ao nível do emprego e das pensões dos trabalhadores.

Cabe ao Estado, enquanto accionista, impedir que a anexação da PT e o controle da SONAE nas comunicações em Portugal possa ocorrer.

Cabe ao Estado, enquanto accionista relevante e decisivo, opor-se a uma operação que pode interessar ao Engº Azevedo e ao grupo SONAE mas não interessa seguramente a Portugal e aos portugueses.

Disse.

 

 

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