Projecto de Lei N.º 303/XI/1.ª

Códigos do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), Código do Imposto sobre Veículos (ISV) e Código do Imposto Único de Circulação (IUC)

Altera os Códigos do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), o Código do Imposto sobre Veículos (ISV) e o Código do Imposto Único de Circulação (IUC), visando tributar de forma extraordinária o património, introduzir maior justiça fiscal e permitir maior equidade na distribuição de rendimentos
(48.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro e 9.ª alteração à Lei n.º 22-A/2001, de 29 de Junho)

1. O Partido Comunista Português defende, como princípio geral, a criação de uma legislação fiscal mais simples e clara que vise objectivos de justiça fiscal e social, que promova a diminuição da carga fiscal quase insustentável sobre quem trabalha por conta de outrem, e que, por outro lado, alargue a base tributária a rendimentos actualmente isentos ou muito pouco tributados, combata e impeça a fraude e a evasão fiscal, tribute de forma mais exigente e justa os enormes lucros auferidos pela generalidade dos grandes grupos económicos, e em particular pela banca e pelo sistema financeiro, que penalize quem mais ganha ou quem mais rendimentos aufere ou quem mais património pessoal possui.
A existência de uma intrincada rede de excepções e um tratamento privilegiado de situações ditas especiais, a criação de um vasto conjunto de benefícios fiscais, a maior parte de razoabilidade duvidosa ou questionável, (e que, no essencial, servem apenas para aliviar ou isentar fiscalmente sujeitos passivos, individuais ou colectivos, com elevados rendimentos ou património, em especial grupos económicos e financeiros que poderiam contribuir para o esforço público de uma forma bem mais significativa), constituem exemplos maiores da iniquidade fiscal existente no País.
A falta de equidade fiscal em Portugal é, em grande medida, consequência da falta de vontade política dos governos para alterar a situação, preferindo antes manter e reforçar uma teia fiscal complexa onde os cidadãos comuns – a maioria da população trabalhadora e as micro e pequenas empresas - acabam sempre por pagar bem mais do que podem, sujeitos a uma carga fiscal ética e socialmente inaceitável. Esta teia legislativa, densa e quase impenetrável, constitui, por outro lado, um campo fértil por onde os grandes grupos económicos e financeiros, mais os detentores de grandes rendimentos, patrimónios e fortunas, se movimentam à vontade, desenvolvendo um planeamento fiscal permanente que utiliza as excepções e explora as omissões legislativas. Esta complexidade fiscal e a enormidade de situações excepcionais e de benefícios avulsos e “por medida”, conduzem na prática a enormes reduções das matérias colectáveis e das cargas fiscais daqueles que mais ganham ou que mais lucros obtêm.

2. Não espanta assim que seja, também por via da injustiça fiscal, (que o actual Governo nunca cuidou de alterar de forma autêntica, e que penaliza de forma muito especial quem trabalha e quem menos rendimentos aufere), que se reforça e agrava o fosso entre os mais ricos e os mais pobres em Portugal.
A parte da riqueza produzida anualmente em Portugal que reverte para os trabalhadores e a generalidade dos assalariados, tem vindo paulatinamente a diminuir de forma persistente desde o final da década de setenta do século passado, agravando-se, assim, as condições de vida de quem vive do seu trabalho e provocando, inevitavelmente, o aumento das desigualdades e assimetrias sociais.
A par desta crescente injustiça na repartição directa da riqueza em Portugal, o baixíssimo valor das reformas praticadas em Portugal – em termos médios a pensão dos reformados da Segurança Social era de apenas € 389 em Janeiro de 2009 - contribui também para agravar ainda mais o fosso entre os mais ricos e os mais pobres e faz com que, sem surpresa, haja no nosso País cerca de dois milhões de pessoas que continuam a viver no limiar da pobreza.
Estes exemplos mostram bem como são ridículas e profundamente injustas as afirmações e propostas de uns quantos que, desde há muito tempo, se comprazem a afirmar que a “política salarial dos últimos anos tem sido completamente suicida”, ou daqueles outros que defendem o “congelamento dos salários e das reformas dos portugueses”como forma adequada de enfrentar a crise!
As últimas decisões tomadas pelo Governo de congelar os salários nominais da administração pública, (inscritas quer no Orçamento do Estado, quer no Programa de Estabilidade e Crescimento), viabilizadas e suportadas pelo PSD e pelo CDS, mostram bem os objectivos das políticas de distribuição da riqueza produzida em Portugal por parte destes três partidos, apostados na desvalorização do factor trabalho, na perda de poder de compra dos salários e na crescente exploração de quem trabalha.
A realidade confirma que as desigualdades, em termos de distribuição de rendimentos, são cada vez maiores, e que as injustiças relativas são cada vez mais escandalosas, bastando citar como exemplo o facto de, em termos médios, a remuneração dos administradores executivos das empresas cotadas em bolsa ser mais de cento e vinte vezes superior ao valor do salário mínimo nacional. Propor, neste contexto, como faz o Governo, o congelamento de salários ou mesmo o corte parcial nas remunerações dos trabalhadores significa o inevitável agravamento dessas desigualdades e injustiças.
O PCP continua a insistir que uma melhoria substancial da forma como a riqueza está distribuída em Portugal passa necessariamente por uma nova política que defenda e concretize um aumento efectivo do poder de compra dos portugueses, através da subida dos salários e das pensões e reformas no nosso País, política que, para além de corresponder a um padrão mínimo de justiça social, constitui igualmente elemento base que pode potenciar o aumento da procura interna e determinar o crescimento económico do País.
3. Tendo como objectivo garantir uma distribuição mais equitativa do esforço fiscal que é exigido aos portugueses, o PCP apresenta, em conjugação com este Projecto de Lei, diversas outras iniciativas legislativas que importa recordar.
Uma referência para o Projecto de Lei que tributa as mais-valias mobiliárias, neste momento já em debate na especialidade, com o qual o PCP visa alargar de forma radical a base de incidência de aplicação deste imposto, alargando-a, em sede de IRS e em sede de IRC, a todos os rendimentos obtidos pela alienação de títulos mobiliários de qualquer natureza e origem, incluindo os obtidos por Sociedades Gestoras de Participações Sociais, por Fundos de Investimento e por entidades não residentes.
Uma referência também para um outro Projecto de Lei que visa tributar as operações de transacção efectuadas nos mercados financeiros da Euronext Lisboa – através de um novo imposto inspirado na “Taxa Tobin” – e que, igualmente, visa tributar certas transferências financeiras para o exterior, em particular as destinadas a entidades sediadas em paraísos fiscais.
Outra referência, igualmente, para um Projecto de Lei que tributa os lucros das instituições de crédito com uma taxa efectiva igual ao valor nominal da taxa de IRC (25%), à semelhança do que sucede com a generalidade das micro e pequenas empresas, eliminando os múltiplos benefícios fiscais de que este sector continua a usufruir e que lhe tem permitido continuar a ser tributado com taxas efectivas, em média, dez pontos percentuais abaixo do valor nominal da taxa de IRC.
Finalmente, um outro Projecto de Lei que elimina certos benefícios fiscais que apenas beneficiam camadas restritas da população, com rendimentos acima da média, de que são exemplos os benefícios fiscais concedidos a Planos de Poupança Reforma (PPRs).

Para além destas iniciativas legislativas, o PCP visa, com o presente Projecto de Lei, alargar, de forma temporária e extraordinária, a tributação sobre o património de valor muito elevado detido por sujeitos passivos, singulares ou colectivos.
Com esta iniciativa legislativa, o PCP cria taxas especiais mais elevadas, em sede de aplicação do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), e em sede do Imposto sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), com aplicação limitada ao período entre 2010 e 2013, que corresponde ao lapso de tempo durante o qual o Governo pretende aplicar as medidas incluídas no Programa de Estabilidade e Crescimento, nas suas duas versões conhecidas.
De igual forma, com o presente Projecto de Lei, o PCP propõe também que passe a ser tributado de forma mais agravada, entre 2010 e 2013, e igualmente através de taxas extraordinárias e temporárias mais elevadas, a compra de veículos importados de valor muito elevado, introduzindo, para isso, alterações no Código do Imposto sobre Veículos. Simultaneamente, o PCP propõe também, em sede do Imposto de Circulação, a criação de taxas mais elevadas, a serem igualmente aplicadas entre 2010 e 2013, e que tributem de forma extraordinária a utilização de veículos de luxo, barcos de recreio e aviões de uso particular.
4. Este Projecto de Lei, tal como os restantes que atrás se enumeraram, constituem a base de uma alternativa política do PCP às medidas fiscais anunciadas pelo Governo no seu Programa de Estabilidade e Crescimento (2010-2013), nas diversas versões apoiadas pelo PSD, e que, na sua “parte de leão”, fazem incidir sobre os trabalhadores e as camadas mais débeis do nosso Povo a factura de uma crise da qual em nada são responsáveis.
Estas iniciativas legislativas do PCP mostram claramente que, além de justo, é possível que sejam outros a pagar os custos de uma crise e as consequências de uma convergência nominal acelerada imposta pelo PEC. O sistema bancário e as instituições financeiras, que estiveram na origem da crise financeira e que, durante os últimos dois anos e meio, receberam milhares de milhões de euros de ajudas financeiras e garantias públicas, não podem deixar de ser responsabilizados pela situação e, por isso mesmo, têm que ser convocados para “pagar a factura”. Também os grandes grupos económicos, que a par das instituições de crédito e financeiras, continuam a apresentar centenas ou milhares de euros de lucros em plena crise, não podem deixar de contribuir de forma extraordinária e reforçada, tal como todos aqueles que são detentores de elevadíssimos rendimentos salariais ou que possuem valores patrimoniais objectivamente muito elevados.
Com a apresentação deste conjunto de iniciativas legislativas, o PCP torna clara a necessidade de introduzir mais justiça fiscal e concretiza a exigência da realização de esforços adicionais visíveis a quem ostenta rendimentos patrimoniais muito elevados, aos grandes grupos económicos e financeiros, em particular à banca, que, não obstante a crise que se vive e a responsabilidade que este sector teve na sua eclosão, continua a apresentar enormes lucros.
Neste contexto, e ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º
Alteração ao Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis

O artigo 17.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, e publicado no seu Anexo II, passa a ter a seguinte redacção:

“Artigo 17.º
Taxas
1- […].
2- […].
3- […].
4- […].
5- […].
6- […].
7. [novo] Até 31 de Dezembro de 2013, a aquisição de prédio urbano, de fracção autónoma de prédio urbano ou de prédio rústico, de valor igual ou superior a € 1 200 000 é tributada com a taxa única de 10%.

Artigo 2.º
Alteração ao Código do Imposto Municipal sobre Imóveis
O artigo 112.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, e publicado no seu Anexo I, passa a ter a seguinte redacção:

“Artigo 112.º
Taxas
1- […].
2- […].
3- […].
4- […].
5- […].
6- […].
7- […].
8- […].
9- […].
10- […].
11- […].
12- […];
13- […].
14- […].
15- […].
16. [novo] Sem prejuízo do disposto n.º 3, aos prédios rústicos, urbanos e urbanos avaliados nos termos do CIMI, com valor igual ou superior a € 1 200 000, é aplicável, até 31 de Dezembro de 2013, uma taxa de 1,0%.”.

Artigo 3.º
Aditamento ao Código do Imposto sobre Veículos
É aditado o artigo 7.º A ao Código do Imposto sobre Veículos, aprovado pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho e publicado no seu Anexo I, com a seguinte redacção:

“Artigo 7.º A
Taxas especiais
Até 31 de Dezembro de 2013, o imposto resultante da aplicação da tabela A do n.º1 do artigo 7.º a automóveis ligeiros cujos preços, antes da aplicação do Imposto sobre Veículos, sejam iguais ou superiores a € 100 000, é majorado em 100%”.

Artigo 4.º
Aditamento ao Código do Imposto Único de Circulação
É aditado o artigo 15.º A ao Código do Imposto Único de Circulação, aprovado pela Lei n.º22-A/2007, de 29 de Junho e publicado no seu Anexo II, com a seguinte redacção:

“Artigo 15.º A
Agravamento temporário de taxas

1- Até 31 de Dezembro de 2013, a taxa aplicável aos veículos da categoria F, constante do artigo 14.º, é majorada em 50%.
2- Até 31 de Dezembro de 2013, a taxa aplicável aos veículos da categoria G, constante do artigo 15.º, é majorada de 100%, tendo o imposto como limite superior € 20 000.”

Artigo 5.º
Entrada em vigor
1. O disposto nos artigos 1.º, 3.º e 4.º da presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
2. O disposto no artigo 2.º entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2011.

Assembleia da República, em 2 de Junho de 2010
A

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