Intervenção de

Naufrágio do barco de pesca Luz do Sameiro - Intervenção de António Filipe na AR

Declaração política, onde a propósito do naufrágio do barco de pesca Luz do Sameiro, ocorrido no passado dia 29, se falou dos meios de busca e salvamento na costa portuguesa

 

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Neste final de ano 2006, o País foi confrontado com uma tragédia, na qual seis pescadores perderam a vida, a cerca de escassos 50 metros da nossa costa, perto da Nazaré.

As nossas primeiras palavras são, naturalmente, de pesar e de solidariedade para com os familiares das vítimas e também de solidariedade e de compreensão para com os pescadores que, na sequência desta tragédia, têm vindo a exigir melhores condições de segurança e melhores condições de busca e salvamento nas costas portuguesas.

Queremos deixar muito claro que não queremos de forma alguma arremessar esta tragédia contra ninguém; não queremos retirar qualquer espécie de dividendo político daquilo que aconteceu; também não queremos lançar culpas contra ninguém, antes de haver um apuramento rigoroso e exaustivo de todas as circunstâncias e responsabilidades que possam ter ocorrido.

Mas há uma ideia, muito clara, que queremos aqui deixar: é a de que seis pescadores perderam a vida, a 50 metros da praia, depois de terem permanecido mais de três horas sem terem obtido o auxílio que era necessário. E, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, isto não pode acontecer, de maneira nenhuma!! Não há qualquer justificação que possa ser apontada para que algo como isto tenha acontecido!

Não é aceitável que aconteça, e não é aceitável que possa vir a acontecer!

Podemos não ter a certeza de mais nada acerca deste trágico acontecimento, mas há uma coisa de que todos temos de ter a certeza: é a de que alguma coisa falhou, seguramente; alguma coisa está mal, para que isto possa ter acontecido, como aconteceu!

E, perante este acontecimento, não podemos cruzar os braços, nem esperar que, para a próxima vez, as condições climatéricas sejam menos adversas, ou que as coisas possam correr melhor do que correram. O que importa, neste momento, é averiguar, em pormenor, tudo o que ocorreu - todas as circunstâncias, o comportamento de todos os responsáveis envolvidos -, para se perceber o que é que falhou para que esta tragédia tenha acontecido.

É preciso apurar se falhou a prestação de auxílio que deveria e poderia ter sido prestado, e, neste caso, alguém terá de ser responsabilizado por isso; é preciso verificar se todas as entidades com responsabilidades cumpriram os seus deveres, se a falha não está nas responsabilidades individuais de alguém, mas está no sistema e na forma como ele está montado, e, então, é esse próprio sistema que tem de ser urgentemente  reequacionado e alterado.

Importa, a esse respeito, apurar tudo aquilo que tiver de ser apurado: se a embarcação dispunha de condições para assegurar a segurança dos seus tripulantes; apurar se foram respeitadas regras de segurança da navegação; apurar se as entidades responsáveis pelo cumprimento dessas regras actuaram ou não e, se não actuaram, por que é que não actuaram; verificar se os sistemas de alerta e de pedido de socorro funcionaram ou não, e porquê; apurar como é que é possível que os pescadores tenham esperado mais de três horas até que o auxílio tenha chegado.

É manifestamente tempo demasiado, e é preciso averiguar como é que isto se altera, para que tal não aconteça e para que o auxílio possa chegar atempadamente; é preciso verificar, portanto, se os sistemas de pedido de auxílio são ou não eficazes para acorrer a situações de emergência, como aquela que, infelizmente, ocorreu; e é preciso verificar se os meios de busca e de salvamento são os necessários, se são suficientes e adequados para as funções que têm de desempenhar. E importa apurar tudo isto, com o máximo rigor, não apenas para evitar que «a culpa morra solteira», se culpa houve neste caso; mas, já que não há remédio para o que aconteceu de mal, que possam ser evitados males futuros e que isto não volte a acontecer.

Temos, por isso, uma proposta muito concreta a fazer, Sr. Presidente e Srs. Deputados. A proposta é relativamente à Comissão de Defesa Nacional, que tem a tutela sobre os meios de busca e salvamento - mas, obviamente, a quem se podem associar outras comissões parlamentares que o entendam, designadamente a subcomissão responsável pela questão das pescas tem aqui obviamente uma palavra a dizer nesta matéria -, a de que seja dado um mandato a esta comissão parlamentar para proceder a uma audição parlamentar que apure, de forma exaustiva, o que é que falhou para que tenha sido omitido o dever de auxílio, em tempo útil, aos tripulantes da embarcação Luz do Sameiro; e, para além deste caso concreto e das circunstâncias e responsabilidades no caso concerto, para apurar com rigor das condições em que funciona e das condições de operacionalidade do Sistema Nacional de Busca e Salvamento Marítimo, quer em termos da quantidade e da adequação dos meios e dos equipamentos disponíveis - estamos a falar em equipamentos e também, obviamente, nos meios humanos que estão afectos a esta actividade - quer em termos da sua coordenação e da capacidade das entidades envolvidas.

Entendemos que devem ser ouvidos os responsáveis pelo sistema de autoridade marítima, representantes dos pescadores e representantes de todas as entidades que tenham algo a ver com o sistema de busca e salvamento nas costas portuguesas.

Mais propomos: que essa audição parlamentar possa dar lugar a um relatório, que seja aprovado em comissão e que possa ser apresentado em sessão plenária desta Assembleia, no qual sejam equacionadas as medidas a tomar pelo Governo ou, eventualmente, pela Assembleia da República, para evitar que tragédias como esta se repitam, perante os nossos olhos, como se nada houvesse a fazer para as prevenir.

Não queremos aceitar a inevitabilidade de situações como esta! Entendemos que devem ser feitas todas as mudanças que sejam necessárias, e urgentemente, para que haja mais segurança para as pescas, para a navegação em geral nas costas portuguesas, e para que tragédias como esta não possam voltar a repetir- se!

(...)

Sr. Presidente,

Agradeço as palavras dos Srs. Deputados Luís Fazenda, Marques Júnior, Agostinho Branquinho e João Rebelo. No fundo, estamos todos de acordo, compartilhamos a perplexidade relativamente ao que ocorreu.

Todos sabemos a distância da costa a que esta tragédia ocorreu e estamos todos perplexos como é que não se conseguiu resgatar com vida aquelas pessoas, depois de terem permanecido o tempo que conhecemos à espera de socorro. É esta perplexidade que faz com que, em nosso entender e que, segundo verificámos, é compartilhado por Deputados de todos os grupos parlamentares, a Assembleia da República não possa ficar indiferente e tenha de ver o que é que, no âmbito das suas competências, é possível fazer para que seja alterado aquilo que está mal, para que circunstâncias destas não ocorram.

Ninguém regateia aquilo que é necessário para melhorar os meios de busca e salvamento. O País investiu, está a investir, em sede de programação militar, na aquisição de helicópteros EH-101, que são muito dispendiosos, mas que se consideram muito importantes para termos um eficaz sistema de busca e salvamento. Mas, depois, verificamos que de pouco nos valerá ter esses meios se não houver a coordenação necessária para que possam actuar com a prontidão que é precisa. Verificou-se, neste caso, que essa prontidão não foi suficiente.

Portanto, há que apurar por que é que não foi e há que agilizar os procedimentos para que estes meios possam acorrer com mais rapidez, de modo a que não aconteça aquilo que sucedeu.

Temos também de ver se os meios da Polícia Marítima são adequados, se há articulação entre as várias entidades, designadamente, a Marinha, a Polícia Marítima e o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, se estes se articulam adequadamente para acorrerem o mais depressa possível a estas situações. É possível verificar se temos os heliportos necessários e distribuídos pelo território nacional. Nós próprios, em sede discussão de Orçamentos do Estado, temos colocado a questão da criação de mais um heliporto na região Norte.

Portanto, há muita coisa que temos de aprofundar e de discutir. É essa, fundamentalmente, a nossa proposta e congratulamo-nos que haja concordância relativamente a ela.

Podemos fazer um importante e frutuoso trabalho, mas, obviamente, neste momento, a hora é, sobretudo, de pesar, de solidariedade e de conforto para com as familiares das vítimas.

 

  

 

 

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