Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral

Nacionalização da banca e dos seguros

 

Nacionalização definitiva e urgente
de todo o sector da banca comercial e dos seguros imperativo do desenvolvimento e soberania nacionais

Realiza-se hoje esta iniciativa, num momento em que se assinalam quatro anos de Governo PS e que se traduziram num país mais desigual, mais injusto, mais dependente e menos democrático. Um país que viu regredir todos os seus indicadores económicos com quebras na produção, com aumento da dívida externa, com o agravamento dos défices estruturais na energia, na agricultura, na ciência e que no plano social enfrenta hoje uma das mais dramáticas situações desde o 25 de Abril, com mais de meio milhão de desempregados, agravamento da precariedade, baixos salários e pensões, dois milhões de pobres.

Uma realidade que confirmou o falhanço de todas as promessas do PS e a sua opção de classe no favorecimento dos interesses dos grandes grupos económicos e do capital financeiro que, num quadro de agravamento brutal da situação económica, alcançaram lucros fabulosos que foram, e são, um insulto para quem vive com salários e pensões de miséria, para quem tem empréstimos à habitação para pagar, para quem tenta fazer sobreviver as suas pequenas empresas.

Foram quatro anos de sacrifícios para os que menos podem e menos têm. Quatro anos que ficaram marcados pela destruição de serviços públicos, pelo ataque sem precedentes aos direitos dos trabalhadores e pela aprovação de nova legislação laboral que destrói, pela liquidação dos direitos das mais jovens gerações, pela arrogância e prepotência na acção governativa que levantaram uma impressionante acção de protesto, indignação e luta expressas em algumas das maiores movimentações de massas dos últimos anos.

O Governo insiste em fugir às  suas reais responsabilidades escondendo-se por detrás da crise do capitalismo, como se o país não vivesse já uma profunda crise antes desta última atingir o nosso país. E procura criar as condições não apenas para legitimar, como aprofundar e agravar ainda mais a política de direita que leva o país para o desastre e impõe sacrifícios. Volta a prometer o “prometido” mas afirma querer prosseguir a mesma política.

O que estes quatro anos de Governo PS demonstram é que não há resposta a mais de 32 anos de política de direita sem uma corajosa ruptura com esta política. Uma ruptura e uma mudança que coloque no centro da intervenção política a elevação das condições de vida, o aumento dos salários, o reforço das prestações sociais, a defesa da produção e da soberania nacional, um outro papel do Estado na economia, nomeadamente nos sectores estratégicos colocando-os ao serviço do Povo e do país e não da acumulação do lucro.
É neste quadro, que o PCP considera a importância do sector financeiro na vida económica nacional.

O agravamento da crise do capitalismo, a crise económica e financeira do país e o progressivo agravamento da situação nacional, exigem, antes que seja tarde de mais, uma resposta clara e inequívoca da parte do Governo.

A situação que hoje se vive no sector financeiro é marcada por um peso crescente, quando não dominante, do capital não nacional.

A política seguida pelos principais grupos financeiros privados – limitação da concessão de crédito às empresas e anulação da baixa das taxas de juros do BCE com a subida dos spreads, para compensar a dependência de um mercado bolsista em queda abrupta – faz com que este sector, numa situação de grande vulnerabilidade e de maior risco de colapso, não desempenhe o papel de financiador da economia, antes pelo contrário, contribua para o agravamento da situação económica e financeira do país.

Durante muito tempo o sector financeiro e o mercado bolsista apresentaram resultados e um volume de negócios sem qualquer correspondência com a esfera produtiva. Vale a pena lembrar que desde o início de Agosto de 2007, os três principais grupos financeiros privados nacionais (BCP, BES e BPI) sofreram uma desvalorização bolsista entre os 72% no caso do BES e os 83% no caso do BCP, o que significou uma quebra enorme do seu valor em bolsa. No caso do BCP, se no início de Agosto de 2007 valia 16,3 mil milhões de euros, actualmente vale apenas 2,7 mil milhões de euros; no caso do BES o seu valor baixou de 8,4 mil milhões de euros para 2,3 mil milhões de euros; e no caso do BPI passou de 5,7 mil milhões de euros para 1,2 mil milhões de euros.

Qualquer destes grandes grupos financeiros tem constituído fundos de pensões próprios através dos quais asseguram o pagamento das pensões dos trabalhadores. Estes fundos de pensões têm também visto as suas carteiras de títulos sofrer fortes desvalorizações que deveriam obrigar os respectivos grupos financeiros a aumentar com valores reais o nível de financiamento anual, de forma a assegurar o adequado financiamento das pensões presentes e futuras.     
 
Uma situação tão mais preocupante quanto se estima uma desvalorização de pelo menos 30% nas aplicações destes fundos de pensões nos últimos dois anos (2007 e 2008) e que só os fundos de pensões do BCP, BES e BPI, estavam avaliados no final de 2007 em cerca de 10,4 mil milhões de euros, ou seja, já valiam mais do que os respectivos grupos financeiros em bolsa.

Perante uma situação cada vez mais difícil o governo decidiu intervir no BPN e no BPP, em qualquer dos casos de forma precipitada e não salvaguardando o interesse público: no caso do BPN sem proceder à nacionalização, como se impunha, de todos os bens do grupo SLN; no caso do BPP, um Banco gestor de fortunas, o Estado não deveria ter pura e simplesmente intervindo, embora salvaguardando os interesses dos depositantes e acusando os responsáveis criminalmente pela gestão danosa, quer de um quer de outro banco.

Nesta grave situação é cada vez mais claro o papel fundamental que o Estado, através do Banco Público, tem no sector financeiro.

As sucessivas intervenções que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) tem sido chamada a fazer em nome do Estado Português, no BPN, no BPP e em outras grandes empresas ou grupos financeiros mostram, independentemente do acerto das intervenções, a importância da Banca Pública, como meio de intervenção do Estado, particularmente em momentos de crise como aquele que vivemos e designadamente de um Estado, com uma economia débil que não dispõe de política cambial, nem monetária.

As mais recentes polémicas a propósito das intervenções da CGD chamam também a atenção de que o Banco Público, não pode ter como objectivo o financiamento de actividades especulativas bolsistas, mas sim o apoio ao financiamento da actividade produtiva e em especial da actividade produtiva que aposte na produção de bens transaccionáveis e na diversificação das exportações, desenvolvida designadamente por micro, pequenas e médias empresas.  

Perante a evolução mais recente das taxas de juro, cada vez mais elevadas apesar da evolução descendente da Euribor e da concessão de crédito às micro, pequenas e médias empresas e às famílias, cada vez mais inacessível apesar das facilidades concedidas pelo Governo ao sistema financeiro, ressalta a importância de um sistema público de crédito para o desenvolvimento da nossa economia, em contraponto à lógica de acumulação do sistema de crédito privado que busca, por todos os meios, o lucro máximo ao serviço dos respectivos grupos financeiros e económicos, ao serviço da distribuição de chorudos dividendos dos seus principais accionistas e não ao serviço do país e do seu desenvolvimento económico e social.

Prova do que acabámos de atrás referir é, no actual contexto, o escandaloso nível dos lucros dos quatro principais grupos financeiros privados (BCP, BES, Santander Totta e BPI), atingindo entre o 2º semestre de 2007 e o final do ano de 2008, cerca de 2 168 milhões de euros.

É hoje clara a necessidade da existência de um sector financeiro ao serviço do crescimento económico e do desenvolvimento económico e social.

A moeda e o crédito, bens públicos, tal como o ar, a água e a energia, devem estar ao serviço do desenvolvimento económico, ao serviço da melhoria do nível e qualidade de vida dos trabalhadores e das populações, ao serviço do desenvolvimento humano e de um crescimento sustentável.

Fica assim mais evidente a importância deste sector estratégico ser predominantemente público. Como tal o PCP defende a nacionalização definitiva de todo o sector da banca comercial – actividade bancária que recolhe depósitos e concede crédito e dos seguros.

Outros, mesmo os mais empedernidos fundamentalistas defensores do mercado, - entre os quais o Primeiro ministro de Portugal, mas também as instituições que nos últimos anos concretizaram as orientações do neoliberalismo dominante tais como: o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial, a Reserva Federal Americana, o Banco de Inglaterra, o Banco Central Europeu e o Conselho de Ministros das Finanças da União Europeia - vêm agora, perante o agravamento da crise neste sector com perspectivas de falências generalizadas, defender a nacionalização a prazo de bancos e seguradoras, com o objectivo de regularizar a actividade destes grupos financeiros, as chamadas «reestruturações temporárias», para depois os voltarem a devolver ao sector privado.
 
Repudiamos por isso qualquer decisão no sentido da nacionalização dos prejuízos, prática de vários governos de vários países em socorro dos grandes accionistas, prática essa que se tem realizado à custa do aumento da dívida pública, logo dos contribuintes, para depois procederem à privatização do que dá lucro.

A nacionalização do sector bancário e segurador com o 25 de Abril foi um acto necessário para salvar a democracia, a economia nacional e a banca pública (apesar da sabotagem nos últimos anos antes das privatizações), para assegurar o crédito às pequenas e médias empresas, aos particulares e desempenhar um papel decisivo no desenvolvimento económico e nas receitas do Orçamento do Estado.

Com a privatização da banca pública o país perdeu soberania – uma parte considerável já é estrangeira – capacidade de intervenção, receitas orçamentais e a democratização do crédito sofreu entorses monumentais. Ganharam meia dúzia de famílias, ganhou a concentração da riqueza, mas perdeu o povo e o país.

A nacionalização definitiva da banca comercial e dos seguros é a melhor forma de a muito curto prazo as famílias e as empresas poderem aceder ao crédito de que necessitam, com taxas de juro não especulativas e, desta forma, poderem contribuir para a dinamização económica do nosso país.

Na actual situação de crise profunda, um sector financeiro ao serviço do crescimento económico e do desenvolvimento económico e social, para além de uma verdadeira nacionalização da banca comercial e dos seguros exige, entre outras, as seguintes medidas:

    O apoio ao investimento produtivo e criador de emprego que estimule a produção de bens e serviços transaccionáveis e a diversificação das exportações nacionais e apoio às micro, pequenas e médias empresas, e ao sector cooperativo e social;

    A adopção de uma nova política de crédito que responda com a baixa da taxa de juro e        de outros custos do serviço da dívida, à situação das famílias endividadas com a compra de casa e das pequenas empresas sufocadas pelo estrangulamento do mercado interno e pelos elevados preços dos factores de produção, e que apoie uma audaciosa política de investimento público e privado;

    Um conjunto de orientações políticas que conduzam à fixação dos limites máximos das margens de lucro (spreads) dos empréstimos bancários e a determinação das condições de acesso ao crédito;

    Uma política de crédito às empresas produtoras de bens e serviços transaccionáveis, com um tratamento preferencial por parte do nosso sistema financeiro, para que estes sectores possam ser mais competitivos com os seus concorrentes externos;

    Uma política de crédito em que as taxas de juro praticadas nos empréstimos às famílias, em especial à habitação e nos empréstimos às empresas, que tenha em conta o seus impactos macroeconómicos e a saúde financeira das famílias e das empresas, impedindo o seu sobreendividamento;

    O acompanhamento da gestão dos fundos de pensões por parte das comissões de acompanhamento, onde os representantes dos trabalhadores tenham acesso a toda a informação e participem a todos os níveis nas decisões sobre a gestão desses fundos e a separação clara entre o fundo e o promotor, bem como a actualização das taxas de desconto e das tábuas de mortalidade.

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