Intervenção de

Medidas compensatórias relativas à cessão antecipada dos contratos de aquisição de energia<br />Intervenção de Honório Novo<span class="data">

7 de Outubro de 2004 Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhoras Deputadas e Senhores Deputados Recuemos até Abril deste ano, momento em que esta Assembleia ratificou o acordo entre Portugal e Espanha para a criação do MIBEL que afinal impõe a cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia (CAE) que a proposta de hoje do Governo pretende regular. Na altura, o Dr. Carlos Tavares, então Ministro da Economia, esforçava-se por fazer passar três ideias incontroversas. Em primeiro lugar, que o MIBEL iria entrar em vigor a 20 de Abril de 2004, e que o governo espanhol havia também confirmado oficialmente essa data, razão pela qual havia “enorme” urgência em ratificar o Acordo. Depois, que os consumidores domésticos passariam a ter a possibilidade de escolher os respectivos fornecedores num prazo de dois meses, isto é, antes de Julho deste ano. Finalmente assegurava ainda Carlos Tavares que a simples extinção de contratos de energia eléctrica iria ter um efeito de redução de preços nos consumidores. Hoje, menos de cinco meses depois destas afirmações do então Ministro da Economia, nem uma só destas afirmações se confirmou. Nem um só destes compromissos se cumpriu. A verdade é que o MIBEL anda há vários anos a servir de pano de fundo no “ping-pong” de sucessivas cimeiras ibéricas com múltiplos e diferenciados protagonistas. Há dias, em Santiago de Compostela, fixa uma nova data, desta vez Junho de 2005, um ano e dois meses depois do dia apontado por Carlos Tavares! E se 20 de Abril de 2004 foi data que se esfumou o acesso dos consumidores domésticos a fornecedores diferenciados não passou de mais uma das miragens com que o Governo PSD/CDS acenou para tentar mostrar as vantagens do MIBEL. Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhoras Deputadas e Senhores Deputados É precisamente neste contexto que hoje se discute a proposta de lei para autorizar o Governo a criar compensações para fazer face à cessação antecipada dos CAE, contratos de aquisição de energia. Antes do mais, e como já foi referido, a cessação destes contratos é uma imposição do MIBEL, que assim começa por desarticular as bases de estabilidade nas regras do fornecimento de energia eléctrica pelas empresas produtoras à rede eléctrica nacional. Claro que havia que assegurar uma fórmula que compensasse essas empresas pela quebra dos contratos existentes, muitos deles de longa duração, que garantisse direitos legais adquiridos e, sobretudo, assegurasse a manutenção das condições financeiras que os contratos de aquisição em vigor previam. Por isso, a criação destas compensações é o mínimo exigível ao Governo para que as empresas recebam contrapartidas adequadas à quebra de relações contratuais pré existentes. Só que a questão não reside apenas na criação das compensações. A questão reside na repercussão que tais compensações vão ter no preço da energia eléctrica. O que vai suceder é que serão os consumidores a pagar essas compensações. O que vai certamente suceder é exactamente o contrário do aqui foi anunciado há cinco meses por Carlos Tavares. As compensações – diz o projecto de Decreto-Lei – vão ser incluídas, mesmo que em prestações mais ou menos suaves, ao longo dos anos, nas facturas de consumo da energia eléctrica que os Portugueses vão pagar. Serão afinal os consumidores a arcar com os custos inerentes à criação do MIBEL. Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhoras Deputadas e Senhores Deputados O Governo apresenta esta proposta de autorização legislativa requerendo uma urgência que não se entende e cujas explicações não convencem. A proposta de lei deu entrada precisamente há oito dias e será votada já hoje. Só que, por causa do cumprimento dos prazos formais invocado pelo Governo, fica completamente prejudicada a possibilidade de aprofundar o debate! Invocam-se prazos, define-se urgência, agenda-se uma proposta com esta importância e relevância e a consequência é manifestamente a impossibilidade de aprofundar o debate. É certo que ouvimos o Secretário de Estado do Desenvolvimento Económico. Mas a verdade é que teria sido fundamental ouvir, por exemplo, a opinião da Entidade Reguladora. A audição da ERSE teria sido fundamental neste debate pois que o seu presidente – a par de outras personalidades muito diferenciadas – levantou muitas dúvidas quanto à possibilidade da criação do MIBEL se traduzir numa diminuição das facturas eléctricas. E um entre outros argumentos então invocados prendia-se com a extinção dos contratos de aquisição de energia cujos custos seriam imputados aos consumidores. Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhoras Deputadas e Senhores Deputados No futuro MIBEL vão continuar a coexistir dois modelos diferenciados de compensação tarifária. Do lado português as compensações são repercutidas no preço final da energia eléctrica. Do lado espanhol a compensação faz-se directamente às empresas com um esquema de subsidiação que não onera os consumidores, pelo contrário, teve por efeito a diminuição do preço final. Entende-se dificilmente como é que num mercado pretensamente único vão poder coexistir dois modelos tão diferenciados. Em Espanha os preços – designadamente os industriais – são mais baixos porque são subsidiados; em Portugal os preços serão mais elevados porque, entre outras razões, as compensações serão integralmente repercutidas nos preços finais. Em Espanha, o Governo garante os preços (sabendo-se, por exemplo, que, muito provavelmente, as empresas espanholas terão custos de energia eléctrica fixos até 2007). No modelo português, a única coisa que o Governo garante – designadamente pelo projecto de Decreto-Lei anexo à proposta de autorização legislativa em debate – é que as empresas nacionais terão ajustamentos anuais de preço, no mínimo com a incorporação adicional de compensações pela cessação dos contratos de aquisição. Anuncia o Governo que o modelo ibérico será único e igualmente aplicável em Portugal e em Espanha. É verdade que assim poderá vir a ser só que ninguém sabe como nem quando ocorrerá. É que o prazo para apresentação de um plano para a uniformização de modelos – trata-se de um plano apenas – é de Junho de 2006, um ano depois da entrada em funcionamento do MIBEL. Importa neste contexto deixar duas perguntas. Quantas e quais serão as empresas portuguesas que poderão resistir a condições de concorrência tão evidentemente favoráveis às empresas espanholas? Está o Governo minimamente preocupado com a evidente possibilidade destas condições de concorrência poderem provocar a absorção do mercado português que alguns anunciam! Esta é uma perspectiva sombria mas real, que reforça a nossa posição contra a criação do MIBEL e as suas consequências traduzidas na proposta do Governo de fazer pagar os consumidores os custos da sua implementação! Disse!

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