Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

A medida do Governo que permite o aumento do número de vagas em creches

Sr. Presidente,
O Sr. Deputado do CDS veio aqui apresentar-nos «o milagre da multiplicação dos lugares»: veio dizer que o Estado não vai gastar mais, que as educadoras e as auxiliares vão ser mesmas, que as salas vão ser as mesmas, mas que, de repente, vão aparecer mais 20 000 crianças nos equipamentos já existentes.
Isto, de facto, preocupa-nos, porque tem tudo a ver com uma concepção do CDS — e que contraria a visão do «visto familiar» do Programa do Governo —, a de quem vê as creches
como armazéns de crianças.
Mas as creches não são armazéns de crianças!
Há uma componente pedagógica e de desenvolvimento cognitivo das crianças que importa defender, mas isso não preocupa o CDS, porque esta medida não vai ter qualquer custo!
Perante o maior despedimento colectivo da história da educação, com um número exorbitante de professores e de educadores contratados que não foram colocados nas escolas, esta até podia ser uma medida importante de combate ao desemprego. Mas o Sr. Deputado já veio dizer-nos que não vão criar emprego com direitos.
Isto quer dizer, mais ou menos, que uma auxiliar que está num berçário, quando toma conta de 8 bebés, por que é que não há-de tomar conta de 10? Que uma auxiliar que está na sala de crianças com 1 ano, quando toma conta de 10, por que é que não há-de tomar conta de 14? Tratar de uma criança de 1 ano de idade é mais ou menos o mesmo do que tratar de outro tipo de mercadoria — passe a expressão. Se uma educadora, numa sala com crianças de 2 anos, cuida de 15, por que é que não há-de cuidar de 18?
Uma sala de 34 m2 para 18 crianças… Não sei se o Sr. Deputado lá colocaria o seu filho, mas eu, com muita dificuldade, colocaria lá o meu!
O CDS e o PSD têm um pouco aquela concepção de que para os filhos dos pobres qualquer coisa chega! Qualquer armazém de creches chega para que as pessoas que vivem do seu
trabalho, que trabalham 12 horas/dia lá possam deixar os filhos, porque as elites e aqueles que podem pagar terão sempre a alternativa dos privados, pagando bem.
Sabemos que o problema, que existe nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto e em muitas outras grandes cidades, da falta de resposta pública prende-se com o facto de as famílias
terem de gastar mais de 300 €/400 €, sem contar com fraudas, com toalhitas e com comida, para garantir um lugar.
Ora, muitas vezes, este é um dos factores que leva as famílias a pensar duas vezes sobre se podem ou não ter mais filhos.
O Sr. Deputado, que pertence a um partido que suporta o Governo e que tem tanta preocupação familiar, diga-nos se entende ou não como uma medida importante o limite e o corte na dedução em IRS com despesas de educação, nomeadamente em creches. É que esta não é uma medida com «visto familiar» mas, sim, uma medida anti-familiar, Sr. Deputado!

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