Projecto de Resolução N.º 698/XII/2ª

Manutenção dos hospitais cujo edificado é da propriedade das Misericórdias sob gestão pública do Serviço Nacional de Saúde

Manutenção dos hospitais cujo edificado é da propriedade das Misericórdias sob gestão pública do Serviço Nacional de Saúde

O atual Governo anunciou como objetivo proceder à reorganização da rede hospitalar. Uma reorganização da rede hospitalar não para melhorar a prestação de cuidados hospitalares aos utentes, mas assente numa matriz economicista. A intenção é clara, pretende reduzir e concentrar serviços, para reduzir despesa. Estes foram os pressupostos da criação do Grupo de Trabalho para a reorganização da rede hospitalar.

O relatório apresentado por este Grupo de Trabalho, datado de Novembro de 2011, aponta como proposta, e passa-se a citar: “Aprofundar uma parceria estratégica com o Sector Social da Saúde, em especial com a União das Misericórdias com vista à devolução de unidades aos seus proprietários e contratualização de serviços aos mesmos, libertando o SNS de custos fixos e assentando os novos acordos em produção variável”.

Justificam tal proposta pelo facto das Misericórdias portuguesas prestarem cuidados à população, referindo que são “detentoras de um vasto parque onde funcionam várias unidades de saúde exploradas pelo SNS. Da análise de várias unidades ao longo do País constata-se da possibilidade de se proceder à sua transformação funcional em Centros de Alta Resolução ou Unidades de Cuidados Continuados”.

Apesar de afirmar que este relatório se tratava apenas de um estudo, o Governo já anunciou publicamente a intenção de devolver às Misericórdias os hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) cujo edificado é da sua propriedade. Falou-se em 15 hospitais, de entre os quais, o Hospital de Santo António no Porto, do Montijo, de Serpa, da Régua, da Póvoa de Varzim, da Vila do Conde, de Barcelos, de Vila Nova de Famalicão, de Valongo, de Cantanhede, de Fafe e da Anadia.

O Governo não apresentou nenhuma argumentação válida para justificar esta decisão. Não há evidência que as Misericórdias tenham um modelo de gestão mais eficaz, nem que tenham um nível de disponibilidade financeira que permita garantir a elevada diferenciação dos hospitais e pelo menos manter os cuidados de saúde que atualmente são prestados. A única motivação do Governo será eventualmente a redução de custos, como vem enunciado no referido relatório, desresponsabilizando-se da prestação dos cuidados de saúde às populações e a redução de cuidados hospitalares, transformando alguns hospitais em unidades de cuidados continuados integrados. Defendemos a ampliação da rede de cuidados continuados integrados do setor público, mas entendemos que o seu desenvolvimento não pode ser feito à conta da redução de cuidados hospitalares. Deve-se sobretudo proceder a um planeamento sério, porque um nível de cuidados não substitui o outro e ambos são igualmente importantes.

Não está esclarecido, nem há compromisso do Governo sobre a situação dos profissionais de saúde que exercem funções nestes hospitais, nomeadamente quanto à salvaguarda dos seus postos de trabalho. A manutenção do quadro de profissionais existentes é um fator de enorme importância para o funcionamento destas unidades de saúde e para a prestação de cuidados de saúde de qualidade. Poderá estar também presente a retirada de direitos, pela imposição de contratos individuais de trabalho e da mobilidade.

Também não há informação quanto aos equipamentos e mobiliário existente em cada uma das unidades hospitalares, da propriedade do Estado.
Importa referir que estes hospitais passaram para a gestão pública, por um processo de “nacionalização” após o 25 de Abril, sob o primado da criação de um serviço público de saúde universal e com cobertura nacional, ficando o Estado a pagar rendas para as respetivas Misericórdias. Muitas das instalações encontravam-se num elevado estado de degradação e os equipamentos obsoletos, o que obrigou o Estado a proceder a requalificações, a ampliações e a adquirir equipamentos tecnologicamente mais avançados, num investimento público de largos milhões, suportado por dinheiros públicos, para benefício da saúde dos utentes.

Na prática, o que se pretende é avançar com um processo de privatização encapotado destes hospitais, ao serem entregues a instituições de solidariedade social, como as Misericórdias. Deixam de ser geridos por uma entidade exclusivamente pública, para serem geridos por entidades privadas, pese embora, sejam de solidariedade social.

O direito à saúde só é garantido na íntegra a todos os utentes, quando é assumido diretamente por estabelecimentos públicos de saúde integrados no SNS.

No nosso entendimento só a gestão pública dos hospitais integrados no SNS cumpre os princípios constitucionais, nomeadamente, a universalidade e a qualidade dos cuidados de saúde, independentemente das condições sociais e económicas dos utentes. Neste sentido o PCP propõe que estes hospitais se mantenham sob gestão pública, integrados no SNS, para assegurar o direito à saúde para todos os utentes.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1. Mantenha sob gestão pública e integrados no SNS os hospitais, cujo edificado é da propriedade das Misericórdias.
2. Que os hospitais mantenham todas as valências que atualmente asseguram e eventualmente possam vir a ser reforçadas face às necessidades da prestação de cuidados de saúde às populações.

Palácio de São Bento, em 26 de Abril de 2013

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