Intervenção de

Os lucros da banca - Intervenção de Honório Novo na AR

Declaração política, trazendo à colação os lucros da banca

 

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

Os resultados há dias divulgados pelos bancos portugueses deixaram o País boquiaberto: apesar da crise que afecta o mercado financeiro desde a segunda metade do ano anterior, apesar do colapso provocado pelo crédito hipotecário de alto risco que levou tantos bancos por aí fora a prejuízos ou mesmo à falência, em Portugal, os lucros - os enormes lucros - não deixam de aumentar!

Quase 3000 milhões de euros foi quanto os cinco maiores bancos portugueses lucraram em 2007!

Quase 8 milhões de euros de lucro por dia é o número que enche de indignação milhões de portugueses.

Apesar da crise financeira e das alegadas ilegalidades, nem sequer o BCP deixou de obter  lucros chorudos.

De facto: depois de 100 milhões de euros de custos com a OPA falhada ao BPI, apesar de 80 milhões para reformas de meia dúzia de «competentíssimos» administradores, após quase 100 milhões de provisões para fazer face a custos extraordinários e às eventuais consequências das alegadas ilegalidades, depois de quase 300 milhões de euros abatidos ao activo por causa da utilização de offshore, esperar-se-ia ao menos que o BCP pudesse ter prejuízo ou, no máximo, lucros bem menores. Nada disso. Foram quase 600 milhões de euros de lucro, apesar da «tempestade»... - «bendita tempestade», dirá a nova administração!

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
É por tudo isto que temos de falar novamente no Dr. Vítor Constâncio. É porque boa parte dos lucros quase imorais da banca é obtida à custa dos depositantes, não dos grandes depositantes/accionistas, particulares ou empresariais, porque esses têm acesso privilegiado ao crédito e, se a coisa correr mal, até beneficiam de perdões da banca; é à custa da generalidade de outros depositantes, dos pequenos depositantes, das pequenas empresas deste país que se vai construindo o reino dos lucros chorudos da banca em Portugal. É à custa de comissões e mais comissões, cujos valores não têm limites ou são até imorais, que esse lucro se cimenta!

Alguém se esquece dos custos cobrados a quem tem contas com saldo médio inferior a 1000 € mensais?

Alguém se esquece de que só os pequenos depositantes pagam estas comissões?

E o que dizer dos custos cobrados só para encerrar contas bancárias, os quais podem ascender a mais de 100 € por conta?

E é verdade, ou não, que paira a ameaça da criação de taxas por operações feitas em Multibanco?

Tudo isto sucede perante o silêncio ou a omissão da entidade reguladora, que poderia e deveria agir impondo normas e regras que moralizassem a actividade bancária.

Não, Srs. Deputados! Nós não queremos que o Banco de Portugal fixe valores uniformes e rígidos de taxas e comissões. Não é isso! Queremos apenas que regulamente a sua fixação, que imponha limites máximos, que proíba a existência de algumas delas pela sua natureza evidentemente imoral e pouco ética.

É esta a competência reguladora que tem estado esquecida no actual debate sobre a acção do Banco de Portugal. É, contudo, esta a função primeira que a entidade reguladora deve ter para justificar a defesa dos depositantes, de todos os depositantes, mesmo que fosse - teria certamente que ser - cortando nos lucros da banca!

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Enquanto os seus lucros continuam a subir desta maneira, o IRC que a banca paga está longe de aumentar da mesma forma. Bem pelo contrário! O BCP (sempre o BCP...), apesar de os seus lucros terem descido 28%, parece ter pago, em 2007, menos 55% de IRC do que em 2006! Isto é, pagou menos, apesar de os lucros de 2006 terem atingido valores record!

Quanto à banca nacional, globalmente pagou, em 2007, menos 1% do que em 2006! E para cada banco, em particular, o acréscimo de IRC pago é sempre inferior ao acréscimo dos lucros!

Quando o Governo nos fala de equidade e transparência fiscais, o conhecimento destes números permitenos concluir que isso não é verdade, que alguns continuam a pagar pouco, a pagar menos do que deviam, ao mesmo tempo que os trabalhadores, a generalidade da população e das pequenas empresas, continuam a pagar bem mais do que pode e deveria pagar.

Por último, importa sublinhar a imoralidade social da existência de lucros deste tipo em Portugal.

Imoral para os que vivem no limiar da pobreza, e são quase dois milhões em Portugal.

Imoral para os trabalhadores a quem se diz que aumentos reais do poder de compra podem pôr em cheque a economia nacional.

Imoral para os reformados deste país, a quem é quase mendigado um aumento nas suas pensões e reformas.

Para todos estes, a existência de lucros com este nível é imoral, é indigna, é ultrajante!

Quando ouvimos dizer que um banco dá 80 milhões de euros para reformar meia dúzia de gestores, pensamos logo nos aumentos das reformas e pensões que o Governo aprovou para este ano: 2,4% foi o valor máximo concedido a quem tem uma reforma inferior a 600 €!

Será que o Governo acha isto moral e justo? Será que nem sequer reparou que a inflação, em 2007, foi, afinal, de 2,5%, segundo os números oficiais do Instituto Nacional de Estatística?

Será que nem sequer reparou que no mês passado aqui disse que os pensionistas tinham sido aumentados pela inflação verificada em 2007, isto é, por 2,4%? Será que anda distraído ou vai, antes, pelo menos acertar as contas e pagar a diferença entre o que julgava poder ser a inflação em 2007 e o valor que realmente ocorreu nesse mesmo ano?

Por fim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao PCP causa tanta revolta os ordenados exorbitantes de gestores públicos e privados como a existência de lucros imorais desta grandeza, face à situação económica do País e à situação social dos trabalhadores e reformados e suas famílias.

Esperamos que alguns dos que mostraram indignação pela diferença escandalosa de ordenados em Portugal também nos acompanhem na revolta e na indignação que provocam estes lucros quase imorais dos bancos portugueses.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Victor Baptista,

Agradeço a sua questão.

Pensei que o Sr. Deputado vinha associar-se à intervenção que acabei de fazer sobre os lucros imorais da banca, mas, pelos vistos, não. Quando o País está de rastos, quanto o País «aperta o cinto», quanto há 2 milhões de pobres ou de pessoas no limiar da pobreza, quando um relatório recente da União Europeia aponta para que os índices de Portugal sejam cada vez piores, quando tudo isto se passa, o Sr. Deputado Victor Baptista devia, comigo, abrir a boca de espanto por o sector financeiro ter os lucros que tem. E estes lucros não acontecem por acaso, Sr. Deputado. Acontecem num contexto internacional de crise financeira onde outros bancos diminuíram fortemente os lucros, onde alguns bancos tiveram prejuízos, mas a banca portuguesa é completamente imune.

Haja o que houver no mundo, haja no mundo a maior crise, a banca portuguesa continua sempre, inexoravelmente, a aumentar os seus lucros.

Mas sabe à custa de quem, Sr. Deputado? Era importante que se dissesse à custa de quem! À custa dos pequenos e médios empresários, que vão ao banco e lhes «apertam o pescoço» com as condições de crédito que oferecem.

São os pequenos e microempresários deste país que não conseguem «levantar o pescoço», porque o que a banca quer é lucrar cada vez mais! Sabe à custa de quem é que isto se passa, Sr. Deputado?! À custa dos depositantes, não dos grandes depositantes e dos accionistas - esses até se lhes perdoa a dívida, como bem sabe o Sr. Deputado!... -, mas dos depositantes normais, que vêem as suas comissões aumentadas, que vêem os seus spreads aumentados.

O Sr. Deputado considera normal que o presidente de um conselho de administração do maior banco português tenha dito outro dia: «Ai é? Se descem os juros, é fácil manter os lucros: aumenta-se os spreads!». O senhor acha normal esta situação? Acha que é normal que a entidade reguladora e supervisora, que é o Banco de Portugal, que tem por obrigação a defesa não dos accionistas mas dos depositantes, permaneça a leste deste problema, deixe a banca aumentar o que quiser aumentar e continue silencioso, permitindo esta imoralidade? Isto é que não é normal, Sr. Deputado!

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Patinha Antão,

Agradeço a sua questão.

Bem se percebe - e não me espanta rigorosamente nada - que, em matéria tão sensível como a imoralidade social de tão elevados níveis de lucro neste país, o PSD venha em socorro do PS, dando-lhe, mais uma vez, uma mãozinha naquilo que é um bloco central de interesses, dos grandes interesses financeiros deste país.

Não me surpreende, portanto, a «mãozinha» que o Sr. Deputado Patinha Antão veio dar à «mãozinha» do Sr. Deputado Victor Baptista para defender interesses comuns.

Mas a verdade, Sr. Deputado Patinha Antão, é que me espanta essa «mãozinha» vinda do senhor! Do senhor que, ultimamente, a propósito do BCP, tem defendido uma fiscalização atenta, por parte da entidade reguladora e supervisora, da banca em Portugal.

De facto, o que preocupa o Sr. Deputado não é o que preocupa sobremaneira o PCP. O que nos preocupa é que, por exemplo, se continue a assistir a situações absolutamente imorais, de gerar lucros à custa da generalidade dos pequenos depositantes, à custa, por exemplo, daqueles que contraíram crédito para comprar uma casa ou daqueles que têm contas bancárias abaixo de 1000 € e que são obrigados a pagar comissões por essas contas. Efectivamente, quem tenha uma conta com um saldo médio superior a 100 € não paga comissões, mas se o saldo for inferior a esse montante, já paga.

Igualmente, a quem queira encerrar uma conta, há bancos que levam mais de 100 €. Acha isto normal? Acha isto moral? Não acha que tem de se chamar a atenção do Banco de Portugal para o facto de ser essa a sua função, a função reguladora, e de ele não a exercer?

Não acha que esta é a atitude comportamental que deveria ser direccionada, balizada, limitada, pelo Banco de Portugal e que o Banco de Portugal não tem dito uma palavra?

Mas não! No que o senhor está mais interessado é em ajustar contas sobre o famoso défice de 6,83%, de 2005!

E deixa de lado aquilo que é essencial, aquilo que é verdadeiramente importante para os portugueses e para o País.

 

 

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