Intervenção de

Interoperabilidade entre sistemas de informação dos órgãos de polícia criminal

 

Estabelece as condições e os procedimentos a aplicar para assegurar a interoperabilidade entre sistemas de informação dos órgãos de polícia criminal

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

A proposta de lei que agora discutimos (proposta de lei n.º 278/X) suscita a nossa maior apreensão na medida em que pretende consagrar a total governamentalização do acesso a toda a informação criminal.

Com esta proposta de lei, todo o sistema de interoperabilidade entre sistemas de informação dos órgãos de polícia criminal é controlado directamente por entidades sob tutela directa do Governo.

Não há qualquer controlo ou fiscalização do sistema por parte de qualquer entidade autónoma ou independente.

As magistraturas, seja a judicial seja a do Ministério Público, são completamente arredadas de qualquer intervenção no funcionamento do Sistema Integrado de Informação Criminal (SIIC). Podem aceder aos dados, mas nunca poderão saber quem mais, para além de si, tem acesso a eles, e nem sequer podem saber qual o nível de informação a que têm acesso, porque não dispõem de meios de controlo que o permitam.

Que os órgãos de polícia criminal têm de dispor de bases de dados, contendo informações necessárias à sua actividade operacional, incluindo dados relativos à informação criminal, é óbvio e não está em causa; que deve ser assegurada a adequada troca de informações entre órgãos de polícia criminal, tendo em vista a coordenação de esforços de todos no combate à criminalidade, também é óbvio e não está em causa.

O que está em causa é a forma como o Governo pretende assegurar este objectivo. É isso que contestamos! O que diz a Lei de Organização da Investigação Criminal é que o dever de cooperação entre os órgãos de polícia criminal «é garantido por um sistema integrado de informação criminal que assegure a partilha de informações entre os órgãos de polícia criminal, de acordo com os princípios da necessidade e da competência».

Ou seja, cada órgão de polícia criminal possui o seu sistema de informação, independentemente dos demais, e o que importa assegurar é a partilha de informação necessária entre eles, segundo um critério de estrita necessidade e submetida a um controlo rigoroso que, do nosso ponto de vista, só pode ser cabalmente assegurado por uma autoridade judiciária.

O que o Governo propõe é que haja uma plataforma governamentalizada para o intercâmbio de informação criminal, garantida e coordenada pelo inevitável Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna e sem qualquer controlo por parte de qualquer autoridade judiciária. Mais: o intercâmbio de dados é realizado através da Rede Nacional de Segurança Interna, criada no Ministério da Administração Interna sob a aparência da mais inofensiva das redes de comunicações - o Sr. Deputado Fernando Negrão tem aqui a resposta para a questão que há pouco levantava.

Está previsto que as autoridades judiciárias possam, a todo o momento e relativamente aos processos de que sejam titulares, aceder à informação constante do Sistema Integrado de Informação Criminal - já agora, Sr. Secretário de Estado, era só o que faltava que não pudessem!

O problema não está no acesso por parte das autoridades judiciárias, quanto aos processos de que são titulares; o problema está em evitar que outras entidades, que não são propriamente as autoridades judiciárias, possam aceder abusivamente à informação criminal.

A verdade é que esta plataforma, que permite aceder directamente a dados e informações na posse de todos os órgãos de polícia criminal, não nos tranquiliza. Desde logo, porque é estritamente governamentalizado no seu funcionamento e no seu controlo.

Os níveis de acesso são estabelecidos através da definição de perfis, aprovados pelo Conselho Coordenador dos Órgãos de Polícia Criminal, que é, aliás, composto exclusivamente por membros do Governo, directores-gerais e dirigentes máximos de órgãos de polícia criminal. Depois, porque o acesso à informação através da plataforma, pode ser feito, não apenas para efeitos de investigação criminal, mas também para efeitos de prevenção.

E, pior ainda, quando se prevê que os dados e informações obtidos, incluindo os dados pessoais, possam ser utilizados pelas entidades que os obtiveram, quer para os fins para que foram fornecidos quer para prevenir ameaças graves e imediatas à segurança interna. Ou seja, os dados obtidos podem ser utilizados para todos os fins que o Governo entenda.

Considerando, portanto, que estamos perante mais uma grave tentativa de governamentalização da justiça, o PCP não pode senão rejeitar firmemente esta proposta, defraudando, aliás, as expectativas da Sr.ª Deputada Helena Terra.

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