Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Governo PS dirige ataque aos trabalhadores e ao povo

Em declaração política na Assembleia da República, Bernardino Soares volta a criticar a política do Governo PS e os efeitos do Orçamento do Estado para 2011 na vida dos portugueses.

Declaração política de critica ao Governo pela situação social do País

Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
É bem visível que, perante a contestação forte e justa às medidas em curso contra os trabalhadores, os reformados e o povo em geral, o Governo anda nervoso. É um nervosismo constante, bem patente nas reacções às críticas, seja na Assembleia da República ou fora dela, às suas medidas e à sua política.
De cedência em cedência em relação às imposições do capital financeiro, do núcleo de comando da União Europeia e também do capital nacional, o Governo compromete crescentemente o País. A rasteira submissão a estas orientações contra o interesse nacional parece ter levado até o Primeiro-Ministro, por estes dias, a pedir ajuda à Sr.ª Merkel, num telefonema de chapéu na mão.
O que é senão um sinal de nervosismo o que ontem aconteceu junto à Residência Oficial do Primeiro-Ministro, no final de um plenário de trabalhadores da Administração Pública? Uma actuação policial totalmente desproporcionada, inaceitável e que não pode ser desligada da responsabilidade política do Governo.
Onde é que já se viu serem detidos dois dirigentes sindicais naquelas condições, como se criminosos fossem?
É preciso, por isso, que, já na próxima terça-feira, o Ministro da Administração Interna esclareça os Deputados em relação a esta actuação das forças de segurança. Assim o exigiremos!
Exigimo-lo, porque isto não pode acontecer no nosso País e também porque sabemos que, a estas medidas do Governo, do PS e do PSD, haverá resposta dos trabalhadores e das populações. Sabemos que, mesmo que o Governo queira intimidar quem luta justamente contra estas medidas, não o vai conseguir, porque quem tem razão sempre terá mais força do que a força da intimidação.
Estão em aplicação as medidas que o Governo e o PSD, com a ajuda da mão bem visível de Cavaco Silva, aprovaram no Orçamento do Estado para 2011.
Os cortes salariais atingem os trabalhadores da Administração Pública, aparecendo nas folhas de ordenado autonomizados para que o ordenado aparente estar igual para os milhares de trabalhadores.
O congelamento das reformas aí está, incluindo as reformas mínimas, que já são escandalosamente baixas e que, agora, vão diminuir o seu valor real em face do aumento do custo de vida.
O Governo congelou até as pensões devidas pelas seguradoras por acidentes de trabalho, matéria que nem tem nada a ver com o Orçamento do Estado, porque não é daí, mas, sim do orçamento das seguradoras, que vem o dinheiro para as pagar.
O ataque às prestações sociais, cada vez menos disponíveis para quem precisa, aí está também. Os direitos individuais ao apoio social estão agora transformados numa espécie de direitos dos agregados familiares, em que o direito à saúde, o direito ao apoio social, o direito à educação estão sempre dependentes de uma qualquer situação em que a bolsa do neto pode prejudicar o
complemento solidário para idosos de um avô. É esta a política que está a ser aplicada por responsabilidade do PS e do PSD.
O ataque ao direito à saúde aí está, com o agravamento dos custos com medicamentos ou com o
agravamento brutal do custo com os transportes de doentes, que, por todo o País, estão a impedir os doentes, os utentes dos serviços públicos de saúde de chegarem aos seus tratamentos, de irem às suas consultas e de terem direito a ser transportados para as unidades de saúde do Serviço Nacional de Saúde, isto porque o Governo resolveu poupar aí mais uns milhões à custa das populações, sobretudo das mais carenciadas.
E aí estão os aumentos dos preços dos bens essenciais, como é o caso dos combustíveis, que atingem o preço mais alto de sempre, por efeito combinado quer do aumento do IVA decidido pelo PS e pelo PSD quer da ganância do lucro dos accionistas da GALP e das restantes
petrolíferas, que o Governo aceita impávido e sereno porque o seu papel nunca é defender a economia nacional e a população mas, sim, defender sempre os lucros dos accionistas destas grandes empresas.
E não venham dizer-nos que o problema é o aumento do preço do petróleo ou a desvalorização do euro, porque todos os portugueses sabem que, quando o preço do petróleo baixa ou quando o euro se valoriza, isso não se reflecte no preço dos combustíveis nas bombas de gasolina.
Mas é preciso falar das medidas que o Governo ainda quer aplicar, como é o caso da alteração da legislação laboral para facilitar os despedimentos, provavelmente à custa de um fundo que o Governo não exclui poder ter dinheiros públicos ou contribuições dos trabalhadores.
E não é curioso que as reuniões da concertação social que estavam marcadas para ontem e para hoje, onde o Governo ia finalmente concretizar as alterações que propõe, tenham sido adiadas por indisponibilidade do Governo do PS? Para quando foram adiadas? Para o dia 24 de Janeiro, após a primeira volta das eleições presidenciais. É curioso, na verdade, este adiamento, que faz lembrar outros que também estão noticiados na praça pública.
A aplicação deste Orçamento do Estado vem confirmar que o mesmo não serve nem o País nem os portugueses. Este não é o único Orçamento possível, não é inevitável e não é um mal menor.
Uma palavra para o Presidente, e agora candidato, Cavaco Silva, que disse, há uns meses, que com as informações de que dispunha nem lhe passava pela cabeça que o Orçamento não fosse aprovado. Agora, depois de ter pressionado, apoiado e promulgado o Orçamento, não quer ter responsabilidade nas suas consequências, quer passar-lhes ao lado.
Os que o aprovaram — PS e PSD —, com o apadrinhamento de Cavaco Silva, e os que, de uma forma ou de outra, o apoiam, o admitem e o avalizam estão a dar espaço ao prosseguimento de uma política que está a destruir o País.
Um outro caminho é possível, um caminho de ruptura e de mudança com esta política, um caminho que imponha uma outra política ao serviço do povo e do País, e não ao serviço dos grandes grupos económicos.
Esta é uma política que tem de ser invertida, e essa luta continua já no próximo domingo, com o voto na ruptura e na mudança, que deve também ser um voto justo contra este Orçamento e contra a aplicação das suas medidas.
(…)
Sr.ª Presidente,
Então muito obrigado. Vejo que não há inscrições do PS e do PSD…
Aos cerca de 60, 70 Deputados do Partido Socialista que neste momento estão na bancada, quero registar que o facto de nenhum Deputado ter vindo querer justificar a actuação policial de ontem mostra o incómodo, que bem se precisa ter também nessa bancada, com o que se passou ontem, a poucos metros da Assembleia da República. Ainda bem que ninguém veio aqui querer justificar o injustificável!
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Helena Pinto, disse, e bem, que este é o momento em que se estão a produzir os cortes nos salários da Administração Pública. Não é curioso que nenhum Deputado do PS e do PSD tenha tido a coragem de vir aqui defender o que aprovou no Orçamento do Estado? Então, onde está a coragem para defender estas medidas? Onde está a coragem dos que estiveram aqui nos meses de Outubro e Novembro a votar e a defender um Orçamento que agora está a cortar o salário dos trabalhadores?
Quer dizer que estiveram aqui para aprovar e agora, quando chega a hora da verdade, ninguém se levanta para defender esta medida do Governo e do PSD?
É esta a vossa coragem política?
Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Helena Pinto,
Tem a Sr.ª Deputada toda a razão. O que está a aplicar-se aos trabalhadores da Administração Pública e do sector empresarial do Estado é uma indignidade, porque não é uma justa repartição dos sacrifícios, é sempre a mesma injusta repartição dos sacrifícios. E ela é tão injusta que nenhum Deputado do PS ou do PSD teve hoje o descaramento de vir defendê-la, porque certamente não têm cara, junto dos trabalhadores da Administração Pública, para lhes explicar que este corte tem qualquer coisa de justiça.
Registo, por isso, Sr.ª Presidente, que o silêncio é a comprovação de que estas medidas estão tão erradas que nem os que as aprovaram têm coragem de as defender. Essa é uma marca que ficará no debate de hoje, no dia em que se produzem os cortes nos salários dos trabalhadores da Administração Pública.

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