Projecto de Resolução N.º 684/XII/2.ª

Financiar o investimento para dever menos

Financiar o investimento para dever menos

Em Março de 2009 o Grupo Parlamentar do PCP apresentou o Projeto de Resolução nº 438/X – Medidas de combate à crise económica e social – que, entre outras medidas de combate à crise económica que despoletara no final de 2007, propunha que o Governo assumisse uma política financeira que limitasse os impactos das dificuldades de financiamento e de tesouraria que a generalidade das empresas, em especial as micro, pequenas e médias empresas (MPME) enfrentavam.

Então escrevermos:

«O país está confrontado com uma grave crise económica e social cada vez mais patente na recessão económica, no aumento do desemprego e da precariedade, nas empresas encerradas e em dificuldade, designadamente as pequenas e médias empresas, no abaixamento do nível de vida e nas dificuldades da generalidade da população.

A crise que o país vive é no fundamental da responsabilidade da política de direita de sucessivos governos que para além dos seus efeitos próprios, deixou o nosso país desguarnecido face aos efeitos da atual crise internacional. A política do atual Governo, com a sua obsessão pelo défice, com elevadas consequências na quebra do investimento e da procura interna, o ataque à administração pública e a destruição de serviços públicos tem sérias responsabilidades no agravamento da situação que o país vive.

Em paralelo, o Governo continuou a beneficiar os grandes interesses económicos e em particular a banca e sector financeiro. Os recentes anúncios de lucros em 2008 do sector bancário e também do sector energético, denunciam a escandalosa realidade de que, enquanto a generalidade dos portugueses e da economia nacional atravessam sérias dificuldades, os acionistas das principais empresas destes sectores lucram milhares de milhões de euros.»

Passados quatro anos, um governo suportado por uma nova maioria parlamentar PSD/CDS-PP, com as devidas diferenças resultantes do prolongamento e aprofundamento da crise, a generalidade dos trabalhadores e das MPME enfrentam as mesmas opções e prioridades políticas.

No processo legislativo na especialidade do Orçamento do Estado para 2013, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou um conjunto de propostas alternativas sobre o financiamento do Estado, a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e a economia.

Nesse sentido propusemos que o Estado Português passasse a poder financiar-se junto do BCE, nas mesmas condições que a banca portuguesa e que as necessidades de recapitalização da Caixa Geral de Depósitos pudessem ser concretizadas através dos 7,5 mil milhões de euros, parte dos 12 mil milhões de euros para recapitalização da banca privada, inseridos no empréstimo da troica que ainda permanecia por utilizar. Estas propostas seriam uma base para que a Caixa Geral de Depósitos, no cumprimento de orientações políticas do seu acionista – o Estado –, estivesse condições de garantir o necessário financiamento das MPME em condições de estancar o encerramento de empresas e o crescimento do desemprego, permitindo a retoma da atividade económica e do emprego.

Para o PCP, e para muitos economistas de elevado prestígio nacional e internacional, a crise em que países como Portugal se encontram exige o fim das opções políticas de austeridade que provocam uma forte contração do mercado interno. Portugal entrou num perigoso círculo vicioso em que a crise gera dificuldades de financiamento à economia, as opções políticas assentam em perspetivas neoliberais de «ajustamento dos mercados» através dos salários e do desemprego, este ajustamento gera a contração do mercado interno, que por sua vez, pelas expectativas geradas, conduz a redução do investimento para níveis que contraem ainda mais a atividade económica, voltando a pressionar os salários e a gerar mais desemprego, maior contração do mercado interno e do investimento.

A realidade é mais forte que os modelos económicos e as conceções filosóficas do Governo, pelo que sem uma decidida intervenção política, Portugal poderá caminhar para uma situação de desastre económico e social com consequências e impactos incalculáveis.

Em Dezembro de 2012 o Banco de Portugal, no seu Boletim Económico de Inverno, afirmava:

«A redução da FBCF empresarial resulta essencialmente da expressiva contração da procura interna, com especial incidência no período mais recente, e perspetivas muito incertas quanto ao futuro próximo. A manutenção de condições de financiamento restritivas e a necessidade de redução dos níveis de endividamento das empresas não financeiras constituem condicionantes adicionais. Neste contexto, a atual projeção aponta para uma queda da FBCF empresarial de 7.4 por cento em 2013, o que perfaz uma queda acumulada de quase 36 por cento no período 2009-2013, com implicações sobre a evolução do stock de capital e sobre a capacidade de incorporação de progresso técnico e, em última análise, sobre o crescimento do produto potencial».

Segundo dados do INE, de associações empresariais e da CPPME, no ano de 2012 encerraram onze mil empresas no sector da restauração e bebidas, treze mil na construção civil e 2500 no ramo automóvel. Se a estes sectores somarmos o comércio e serviços, concluiremos que só em 2012 mais de 200 mil trabalhadores ficaram sem o seu emprego, num momento em que, em sentido lato, Portugal apresenta cerca 1,5 milhões de desempregados e todas as projeções económicas apontam para o seu agravamento, em linha com uma ainda maior deterioração da atividade económica.

As insolvências registadas desde o início do ano até ao dia 15 de Abril já ultrapassaram as de 2012 e são superiores em mais de 41% às verificadas em 2011. Estas atravessam praticamente todos os sectores de atividade económica, social e cultural, pelo que não corresponderão a um movimento de alteração de especialização do País, antes refletindo um estado de depressão económica e social em que Portugal se afunda.

As perspetivas de recuperação económica e do emprego por via das exportações está em causa, tendo em conta a recente evolução do comércio externo e da generalização de opções políticas similares à dos sucessivos governos que se concentram nos constrangimentos aos respetivos mercados internos na maioria dos nossos principais parceiros económicos.

A quebra do rendimento disponível das famílias prossegue com o aumento dos despedimentos nas Administrações Públicas e no sector privado, com os cortes nos salários e pensões, nas prestações sociais e com o brutal agravamento tributário sobre o rendimento dos trabalhadores e pensionistas e sobre o consumo.

Se na perspetiva do PCP o aumento do rendimento disponível das famílias e a promoção do mercado interno são fatores fundamentais para a inversão das expectativas e do atual rumo da economia portuguesa, permitindo estancar os encerramento e os despedimentos, incrementando a criação de emprego e a substituição de importações por produção nacional, a disponibilização de financiamento para recuperação da capacidade produtiva e para disponibilidades de liquidez são componentes dessa política que não poderão ser desvalorizados. Caso contrário todo o esforço será inglório.

De facto verifica-se que o sector financeiro vem aumentando o diferencial médio do crédito concedido em relação à Euribor, «uma vez que os spreads praticados se encontram em níveis muito elevados com tendência crescente», segundo o Banco de Portugal.

A própria estabilização dos custos com a dívida das empresas não financeiras que, segundo o Banco de Portugal, terá ocorrido no segundo semestre de 2012 reflete «uma amostra em que predominam as de maior dimensão» e «baseiam-se em informações de empresas que se mantêm no mercado».

De facto, quando a análise tem em conta a dimensão das empresas, o Banco de Portugal refere que «observam-se variações positivas no caso do crédito a grandes empresas, enquanto a variação do crédito total a pequenas e médias empresas e, sobretudo, a micro empresas, tem vindo a torna-se cada vez mais negativa». Esta «é justificada sobretudo por uma queda muito acentuada do crédito bancário».

Em suma, o Banco de Portugal conclui que «os critérios de concessão de crédito terão tido um agravamento, com os bancos inquiridos a indicarem aumentos de spreads, diminuições das maturidades contratuais e uma maior exigência em termos de garantias e condições contratuais não pecuniárias».

Desta forma, o PCP conclui que, a par da necessária rutura com as opções políticas que concentram na redução dos salários, dos rendimentos dos trabalhadores e pensionistas e no aumento do desemprego os fatores corretores dos desequilíbrios da economia portuguesa, promovendo a dinamização do mercado interno e, consequentemente, a criação do emprego, é fundamental inverter a política de financiamento das MPME prosseguida pela banca, suportada pelas opções políticas do Governo.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de Resolução:
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, resolve recomendar ao Governo a adoção de uma outra política de crédito que responda aos problemas mais urgentes:
• A intervenção do Estado por via da Caixa Geral de Depósitos e suas participações noutras instituições financeiras, para a rápida concessão de crédito e seguros de crédito às micro, pequenas e médias empresas, bem como a outras situações onde esteja em causa o interesse nacional.

• A utilização pelo Governo do remanescente dos 12 mil milhões de euros, do empréstimo da troica para recapitalização da banca privada, para reforçar os rácios financeiros da Caixa Geral de Depósitos de modo a garantir as necessárias condições para a disponibilização de crédito às MPME para relançamento e manutenção da atividade económica destas.

• O acionamento de medidas junto do sector financeiro com vista à fixação administrativa dos limites máximos das margens (spread), das comissões, das taxas de juro, e das condições de acesso ao crédito por parte das empresas e particulares.

• O acionamento de medidas legislativas/regulamentares que impeçam a alteração unilateral de spreads de empréstimos, de contas correntes, descontos, seguros e outras modalidades de crédito às empresas e particulares por parte do sector financeiro.

• A assunção pelo Estado de um papel dominante e efetivo no sector, impedindo a tomada de posições do capital estrangeiro em sectores estratégicos da banca nacional.

Assembleia da República, em 15 de Abril de 2013

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