Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

"Falsidades e dissimulação do Ministro Portas e a continuação do terrorismo social"

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Declaração política insurgindo-se contra eventuais cortes nas pensões de sobrevivência e acusou o Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas, de ter ocultado esta medida aos portugueses

Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
O irrevogável demissionário e agora Vice-Primeiro Ministro, Paulo Portas, deu, mais uma vez, provas na arte da dissimulação e no uso de falsidades e da mentira para enganar os portugueses.
Qual mestre da ilusão, o Vice-Primeiro-Ministro, juntamente com a Ministra das Finanças, na passada quinta-feira, aquando da apresentação dos resultados das oitava e nona avaliações da troica, anunciou o fim da recessão, o abrandamento do crescimento do desemprego e disse que, e passo a citar, «em nenhuma circunstância estamos perante um pacote de austeridade», «as medidas incidem sobre o Estado e não sobre a sociedade», «maior esforço daqueles que têm mais e não à classe média.» Por fim, disse: «Não optámos por medidas que poderiam deteriorar mais a coesão social ou o rendimento das famílias».
Contudo, como diz o nosso povo, «a mentira tem perna curta». A verdade é que o Governo PSD/CDS continua de uma forma intransigente o programa de terrorismo social que afunda o nosso País e atira milhares de portugueses para a pobreza.
Não só se mantêm as medidas já anunciadas de corte de 4000 milhões, que implicam a continuação do saque fiscal às famílias, mais cortes na saúde, mais cortes na educação, mais cortes em prestações sociais e mais cortes nos salários e despedimentos na Administração Pública como, passados poucos dias, os portugueses foram confrontados com o anúncio de um assalto às pensões de sobrevivência.
Confrontado com este facto, o Ministro Paulo Portas disse que «o desenho em concreto da medida não estava terminado» e que «não há qualquer comparação ou relação entre uma condição de recursos nas pensões de sobrevivência e o corte da TSU das pensões».
Se o «desenho» não estava ainda concluído, com certeza já existia um «esboço» e o Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas, por via do também Ministro do CDS Mota Soares, sabia deste roubo e nada disse.
Este CDS é responsável pelo roubo das pensões por via da contribuição extraordinária de solidariedade, pelo aumento da idade da reforma de todos os trabalhadores, pelo agravamento do fator de sustentabilidade que vai penalizar ainda mais as reformas, pelo corte nas reformas da Administração Pública com a dita «convergência», pelo roubo dos subsídios de férias e de Natal e agora propõe um corte nas pensões de sobrevivência e viuvez.
O CDS que dizia que a TSU das pensões era a «linha vermelha» que não podia ser ultrapassada é o mesmo CDS que vai aplicando com o seu parceiro de coligação, o PSD, cortes iguais ou mesmo superiores a essa TSU das pensões.
Contudo, a tal «linha vermelha» existe. Ela nada tem a ver com os reformados, com os trabalhadores e os seus direitos. A «linha vermelha» que o Governo não ultrapassa é a linha dos interesses dos grandes grupos económicos, dos bancos e seus privilégios imorais, das PPP ruinosas para o Estado, dos swaps e dos juros agiotas. Nestes interesses é que, efetivamente, não tocam.
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
O corte, o roubo das pensões de sobrevivência que o Governo se prepara para incluir no próximo Orçamento do Estado é uma obscenidade social.
Em primeiro lugar, importa destacar que as pensões de sobrevivência são um direito dos familiares sobrevivos, pensões, essas, que resultam dos descontos realizados, não são uma dádiva do Estado.
Em segundo lugar, importa dizer que a dita «condição de recursos», criada pelo PS e que agora o PSD e o CDS querem aplicar às pensões de sobrevivência, não visa garantir mais justiça na atribuição desta pensão; é, sim, o caminho para cortar e impedir o acesso a este direito.
Veja-se, aliás, os resultados desastrosos da aplicação da condição de recursos no rendimento social de inserção, no complemento solidário para idosos ou no abono de família onde, por via de alterações legislativas e por via da imposição da condição de recursos, cerca de 1,5 milhões de crianças deixaram de receber esta prestação social.
Por fim, cortar nas pensões de sobrevivência é atacar quem menos pode e menos tem na nossa sociedade. As pessoas, os idosos e reformados legitimamente adequaram as suas vidas aos níveis de rendimento que lhes foram atribuídos de acordo com as regras vigentes à data, pelo que não é legítimo, agora, retroativamente, esse mesmo Estado cortar nas pensões de sobrevivência.
Os idosos e reformados do nosso País são dos estratos sociais mais fragilizados e mais vulneráveis da nossa sociedade, pelo que estes cortes terão consequências dramáticas.
Depois de milhares de idosos verem aumentadas as suas rendas ou serem despejados por via da lei dos despejos considerando os rendimentos dos idosos na altura, agora o PSD e o CDS cortam nos seus rendimentos. Desta forma, o Governo PSD/CDS produz um efeito duplamente negativo.
Depois de manterem congeladas ou atualizarem as pensões em valores bem abaixo do aumento do custo de vida, vêm agora o PSD e o CDS impor novos cortes nos seus rendimentos e, assim, diminuir ainda mais o poder de compra dos idosos, numa altura em que os preços não param de aumentar.
Depois de atacar os serviços públicos e agravar os custos com transportes, estes novos cortes vão condenar ainda mais idosos ao isolamento, à privação de serviços públicos fundamentais e ao acesso à cultura e lazer.
Assim, não temos qualquer dúvida em afirmar que o Governo PSD/CDS, por opção própria, é responsável pelo agravamento da pobreza entre os reformados do nosso País.
É caso para dizer «basta!».
Deixem os idosos e os reformados em paz e sossego e respeitem a dignidade das suas vidas, que é isso que eles merecem e precisam.
Aos idosos e reformados de hoje, que foram no passado recente protagonistas e atores principais de avanços sociais, económicos e políticos do nosso País, dizemos que não é tempo de conformismo e resignação; é tempo de, mais uma vez, se empenharem, juntamente com os mais novos, na derrota deste Governo e da política de direita para construir no nosso País uma sociedade mais justa e solidária que respeite e valorize trabalhadores e reformados.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Mariana Aiveca,
Agradeço os seus pedidos de esclarecimento.
Realmente, partilhamos da mesma visão de que este corte nas pensões de sobrevivência é, efetivamente, um esbulho, porque não há qualquer tipo de legitimidade por parte deste Governo de cortar retroativamente aquilo que foi legitimamente atribuído aos reformados.
Importa dizer que os reformados e idosos conformaram as suas vidas em função dos rendimentos que lhes foram atribuídos. À data em que foram atribuídas as pensões de sobrevivência, eles tinham esse direito que foi consagrado, pelo que não há qualquer tipo de legitimidade para agora, retroativamente, tirar aquilo que lhes foi atribuído pelo próprio Estado.
É uma alteração profunda nas condições de vida dos idosos e dos reformados, particularmente indecente se tivermos em conta que estes idosos e reformados estão numa fase final das suas vidas e precisavam, mereciam, não só de paz e sossego mas também, e acima de tudo, de respeito pelas suas próprias vidas.
Depois, a Sr.ª Deputada referiu um aspeto que é verdadeiramente fundamental deixar claro e rebater, como fiz na declaração política. É que este direito à pensão de sobrevivência não é uma dádiva, não é uma benesse, não é uma qualquer prestação social caída do céu; ela resulta dos descontos dos trabalhadores, porque, durante toda uma vida, uma parte dos descontos financiou este tipo de prestações sociais. Portanto, estes trabalhadores têm direito porque descontaram para esta mesma prestação, não é nenhum privilégio ilegítimo. Nessa medida, consideramos que não há qualquer tipo de legitimidade para esse corte.
Mais: fica claro, Sr.ª Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, que este Governo toma uma opção de fundo relativamente aos cortes.
Para manter os lucros e os privilégios, esses, sim, verdadeiramente inaceitáveis, dos grandes grupos económicos, para manter as PPP multimilionárias, para manter os juros agiotas ao FMI, para manter os 12 000 milhões de euros que continuam a financiar a banca nacional, eles têm de cortar, de roubar, em algum lado. E, então, surge a opção de classe…
Sim, roubar, Srs. Deputados, porque se trata, efetivamente, de um roubo.
Trata-se de uma opção de classe, porque, efetivamente, entre tirar aos que mais podem, aos que mais têm na nossa sociedade, aos grandes grupos económicos, e tirar aos trabalhadores e aos reformados o PSD e o CDS-PP optam por tirar aos do costume: aos trabalhadores e aos reformados. É precisamente esta denúncia que aqui queríamos deixar.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia,
Queria agradecer o pedido de esclarecimento que fez e dizer-lhe que, efetivamente, coloca-se logo à partida uma questão de ética.
A verdade é que as palavras o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Dr. Paulo Portas, foram as seguintes: «em nenhuma circunstância estamos perante um pacote de austeridade», «as medidas incidem sobre o Estado e não sobre a sociedade» «maior esforço daqueles que mais têm e não à classe média», «Não optámos por medidas que poderiam deteriorar mais a coesão social ou o rendimento das famílias».
Isto é claramente mentira, porque, passados poucos dias, estas mesmas declarações feitas pelo Ministro de Estado e pela Ministra das Finanças foram desmentidas.
A verdade é que temos as medidas de austeridade do Orçamento do Estado de 2013, acrescidas do pacote de austeridade anunciado em maio e das novas, que agora serão incluídas no Orçamento do Estado para 2014.
É austeridade a somar a mais austeridade!
Portanto, aquilo a que assistimos naquela conferência de imprensa foi a um exercício de ilusionismo político.
Mais: consideramos que é ilegítimo este corte. E o exemplo que sempre é dado — e a mesma técnica foi utilizada pelo Partido Socialista aquando do corte em prestações sociais, nomeadamente no rendimento social de inserção e no complemento solidário para idosos — é o das pessoas que recebem 5000 ou 6000 € e que, depois, é preciso tomar medidas para cortar nestes abusos.
A verdade é que nós assistimos a, quer no complemento solidário para idosos, quer no rendimento social de inserção, com a desculpa destas poucas exceções que existem na nossa sociedade, ao corte dos direitos de milhares, milhares e milhares de portugueses.
Foi a desculpa para cortar num direito que é verdadeiramente fundamental.
E agora o PSD e o CDS-PP preparam-se para utilizar exatamente a mesma estratégia de dizer que há casos de abusos ou de situações que poderiam, de alguma forma, considerar-se ilegítimas (mas não são porque, importa aqui reafirmá-lo, os trabalhadores descontaram para aquele direito), mas a verdade é que o PSD e o CDS-PP utilizam essas situações, que são raríssimas, para justificar um corte que vai atingir milhares e milhares de reformados. Nós consideramos dramáticas e ilegítimas as consequências que esses cortes irão ter na vida concreta dos reformados.
Algum Sr. Deputado presente neste Plenário considera que a grande maioria dos reformados portugueses vive uma situação desafogada que permite viver com as condições que merecem? Não! Nós temos, infelizmente, no nosso País uma situação dramática de pobreza entre os reformados.
Bom, o que o PSD e o CDS-PP se preparam para fazer é agravar ainda mais as condições de vida destes reformados, o que irá ter, como disse, consequências verdadeiramente inaceitáveis.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Deputado João Pinho de Almeida,
Não, não há qualquer legitimidade em retirar aquele que é um direito constituído com base nos descontos dos trabalhadores. Não há qualquer direito! As pessoas descontaram uma vida inteira sobre os seus rendimentos. Que legitimidade é que têm o PSD e o CDS-PP para tirar aquilo que não é vosso? Não têm qualquer tipo de legitimidade!
As pessoas têm direito a essa prestação social, têm direitos, foram feitos descontos para ela, não há qualquer legitimidade em retirar-lhes.
Mais: o Sr. Deputado fez aqui um exercício lamentável ao tentar defender aquilo que é indefensável. Então, o Sr. Ministro Paulo Portas diz que «em nenhuma circunstância estamos perante um pacote de austeridade» e que «as medidas incidem sobre o Estado e não sobre a sociedade» e, passados dois dias, vem um corte nas pensões de sobrevivência?! Quem é que está a mentir a quem, Sr. Deputado?! Quem é que está a criar um «número» de ilusionismo, de demagogia e a enganar os portugueses?! Quem é que o fez, Sr. Deputado?! Fomos nós?! Ou foi o Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas?! Foi o CDS-PP, que é responsável…
E, depois, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro pode alegar que não sabia da medida?! Não pode! Porque, efetivamente, se não havia o «desenho» concreto das medidas, com certeza que já havia a ideia, havia, como eu disse da tribuna, o esboço da medida. De quem? Do ministro, também do CDS, Pedro Mota Soares.
Portanto, não há qualquer legitimidade para fazer estes cortes.
O Sr. Deputado diz que não se conhecem os contornos da medida. Bem, o que sabemos é que os senhores se preparam para roubar 100 milhões de euros a um direito dos reformados portugueses, que é a pensão de sobrevivência.
Mais: este CDS, que agora diz que isto nada tem a ver com a TSU das pensões, é o mesmo CDS que rouba as pensões por via da contribuição extraordinária de solidariedade, que aumenta a idade de reforma de todos os trabalhadores, que agrava o fator de sustentabilidade (que vai penalizar ainda mais os reformados), que corta as pensões da Administração Pública, que rouba o subsídio de férias e que agora propõe o corte nas pensões de sobrevivência e viuvez.
Aos pouquinhos, aos pouquinhos, PSD e CDS-PP vão tomando medidas iguais ou superiores às da TSU das reformas. Esta é a profunda hipocrisia do CDS-PP, que continua a dizer que há uma «linha vermelha»!
Mas, claro, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, existe uma «linha vermelha» para o CDS-PP. A «linha vermelha» para o CDS-PP e para o PSD é a dos privilégios da banca, do financiamento da banca.
Isso ficou clarinho na conferência de imprensa da passada quinta-feira. A Ministra das Finanças disse, claramente, que iria manter como opção primeira o financiamento da banca. Esta é a opção de classe do CDS-PP e do PSD!
Para manter os lucros, para manter as mordomias, para manter o financiamento à banca, PSD e CDS-PP não têm qualquer tipo de problema em retirar a quem menos tem e a quem menos pode no nosso País, que são os reformados e os idosos.
Ora, isto é que é verdadeiramente inaceitável e verdadeiramente revelador da opção de classe que estes partidos fazem, em detrimento do interesse nacional.

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