Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

Factor de sustentabilidade

 

Revogação do factor de sustentabilidade

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

A segurança social e o direito dos trabalhadores a uma reforma digna depois de uma vida de trabalho são uma preocupação central para o Partido Comunista Português e neste âmbito temos desenvolvido inúmeras iniciativas.

Apresentámos uma proposta de lei de bases da segurança social; abordámos, por diversas vezes, o problema da actualização e valorização das pensões; lutámos contra a injusta fórmula de cálculo; propusemos a valorização das longas carreiras contributivas; e, entre muitas outras iniciativas, apresentámos diversas propostas que visam garantir a sustentabilidade financeira da segurança social.

O PCP foi o primeiro partido a denunciar e a propor a revogação do chamado «factor de sustentabilidade», que mais não é que um factor de redução das reformas dos trabalhadores portugueses.

O Governo, após anunciar a eminente falência da segurança social e utilizando o argumento do envelhecimento da população, introduziu o factor de sustentabilidade, que é um verdadeiro imposto sobre a esperança média de vida.

O factor de sustentabilidade, que reduz o valor da reforma em função do aumento da esperança média de vida, é um indecoroso aproveitamento de uma importante conquista social. Se é verdade que o número de activos por pensionista, entre 1975 e 2004, baixou de 3,78 para 1,63, também é verdade que a riqueza criada por empregado aumentou 41 vezes, isto é, passou de 641 € para 26 332 €.

Importa, assim, questionar se parte dessa riqueza não deveria servir para financiar a segurança social, até porque o Governo nada fez para diversificar as fontes de financiamento, como propõe o PCP.

Além disso, o Governo, através da sua política anti-social, em nada contribui para o aumento da natalidade, antes pelo contrário.

O Código do Trabalho, os baixos salários, entre muitos outros factores, condicionam negativamente a natalidade.

Já quanto ao cenário negro de falência da segurança social que o Governo apresentou, os números falam por si.

O Governo previa, em 2005, no Relatório de sustentabilidade da Segurança Social, um saldo zero. No entanto, o saldo que se verificou foi positivo e atingiu 787 milhões de euros.

Quer em 2006, em 2007 e também em 2008, os saldos foram positivos quando o Governo previa saldos negativos.

Ora, o cenário de falência foi, claramente, exagerado pelo Governo para justificar este factor de sustentabilidade, que penaliza as já baixas reformas dos trabalhadores.

O Governo PS não quis discutir medidas, propostas pelo PCP, que garantiam a sustentabilidade financeira da segurança social sem penalizar os trabalhadores, entre muitas outras, a diversificação das receitas tendo em conta o valor acrescentado bruto das empresas, que iria colocar as empresas a contribuir de uma forma mais justa para a segurança social.

O Governo optou pelo factor de sustentabilidade e por uma nova fórmula de cálculo que já estão a reduzir o valor das pensões dos trabalhadores e que, em 2030, irá implicar uma redução de menos 21% e, em 2050, menos 34%.

O efeito conjugado destas duas medidas implica, de acordo com dados do próprio Governo, que a taxa de substituição, que hoje ronda os 84%, passe a ser, em 2050, de apenas 55%.

Se tivermos em conta que 85% dos reformados em Portugal vive, ou melhor, sobrevive, com menos de um salário mínimo por mês, facilmente se conclui que o resultado vai ser mais miséria, mais exclusão social e mais pobreza entre os reformados.

Importa referir uma profunda contradição: a segurança social, que há bem pouco tempo estava no limiar da falência, é a mesma segurança social que vai financiar medidas de apoio às entidades patronais, que irão resultar em avultadas despesas e perdas de receitas que a CGTP estima em mais de 500 milhões de euros.

Para os trabalhadores, a situação financeira da segurança social justificou mais anos de trabalho para pensões de miséria.

Para apoiar os patrões, não falta dinheiro, não se coloca o problema da sustentabilidade financeira da segurança social.

A opção do Governo é clara: penalizar quem trabalha para financiar os patrões à custa das verbas da segurança social.

É este o caminho que exige rupturas e é por isso que o PCP propõe a revogação imediata do factor de sustentabilidade (projecto de lei n.o 639/X).

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