Intervenção de

Estatuto das Estradas Nacionais

 

Autoriza o Governo a aprovar o Estatuto das Estradas Nacionais, definindo as regras tendentes à protecção da estrada e sua zona envolvente, fixando as condições de segurança e circulação dos seus utilizadores, bem como as condições de exercício das actividades que se prendem com a sua exploração e conservação

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores membros do Governo,

Vou mencionar apenas alguns dos pontos que o Governo quer aprovar com este diploma (proposta de lei n.º 291/X), para as estradas nacionais e regionais e para as respectivas concessionárias. São normas que falam por si e que demonstram o verdadeiro escândalo que esta proposta representa.

É criada uma "zona de servidão non aedificandi", de 200 metros para cada lado da estrada ou de 600 metros para nós de ligação, em que todos os actos de edificação, transformação, ocupação e uso dos bens ficam sujeitos a autorização da concessionária (artigo 8.º do decreto-lei anexo à proposta) ...

... E esta só autoriza desde que não se trate de obras de reconstrução geral, não haja ampliação da área nem alteração do uso, e desde que os proprietários se obriguem a não exigir indemnizações, no caso de futura expropriação, pelo aumento do valor resultante das obras (artigo 49.º)

A concessionária pode promover a delimitação dos bens do domínio público rodoviário. E se não for possível acordo nem arbitragem com os proprietários, é a concessionária que decide (artigo 12.º).

A Autoridade Rodoviária pode delegar poderes e atribuições na concessionária, com o regulador a ser representado pelo regulado, que assim exerce jurisdição sobre a área do domínio público rodoviário, sobre as áreas de servidão rodoviária e sobre uma faixa de 300 metros para cada lado da estrada (artigo 35.º).

Nessas faixas de 300 metros para cada lado, quaisquer obras ou actividades que «influenciem directa ou indirectamente o tráfego» carecem de parecer prévio vinculativo da concessionária (artigo 36.º).

A concessionária pode intervir em caso de perturbações no domínio público rodoviário, recorrendo à força pública se necessário, e tem os poderes, prerrogativas e obrigações do Estado para embargos administrativos, demolições, execução coerciva das suas decisões, instrução e aplicação de sanções, suspensão ou cessação de actividades, encerramento de instalações, identificação de pessoas ou entidades (artigo 37.º).

Na zona da estrada é proibido limpar ou lavar vasilhas, veículos, outros objectos ou animais; é proibido encostar, pendurar ou apoiar objectos nas árvores; é proibido entrar ou sair com veículos fora dos acessos licenciados; é proibido permanecer para vender quaisquer artigos ou objectos (artigo 44.º).

É proibido ter tanques, parreiras, espigueiros, alpendres, árvores ou arbustos a menos de sete metros da zona da estrada. É proibido ter depósitos de «materiais ou objectos com mau aspecto» nos terrenos vizinhos ou confinantes. É proibido ter depósitos ou exposições de materiais e outros artigos a menos de 200 metros (artigo 48.º).

Dentro das localidades, a afixação de toda e qualquer publicidade até 150 metros da estrada passa a depender de autorização da concessionária - concedida anualmente, mediante o pagamento de uma taxa (artigo 52.º).

A propaganda política para um acto eleitoral tem de ser removida por quem a tiver colocado, num prazo máximo de 30 dias após a eleição (artigo 57.º). Caso contrário, a força política pode pagar uma coima, de até 20 mil euros se for reincidente (artigo 67.º).

Do produto das coimas, 60% são para o Estado, 40% para a concessionária, caso tenha sido esta a conduzir o processo (artigo 70.º). Em caso de benefício económico para o infractor, a coima pode ir até quatro mil euros por dia. (artigo 67.º).

Ninguém foi ouvido sobre este diploma. Nem os Municípios. Ninguém!

Esta proposta de lei é mais que uma indecorosa extorsão em favor das concessionárias: é um escandaloso delírio de autoritarismo, que deve indignar qualquer democrata. E é só por si inacreditável que o Governo tenha vindo apresentar esta aberração ao Parlamento, no último dia do debate legislativo.

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