Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

«O Estado tem sido promotor e estimulador da precariedade laboral»

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Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Arrumada que está a questão da redução da TSU (taxa social única), tratamos agora de saber sobre a questão do pagamento especial por conta (PEC) vai colocar-se, em termos de incentivo, às micro, pequenas e médias empresas e creio que o problema central está em saber qual vai ser o universo desses incentivos que estão acolhidos, de certa forma, no Orçamento do Estado de 2017.

Por iniciativa e proposta do PCP, essa questão do montante e da universalidade dessa medida creio que é importante e terá, com certeza, as nossas propostas.

Porém, agora que as bancadas do PSD e do CDS sossegaram, queria dizer o seguinte: não é por dizer uma mentira muitas vezes que isso se transforma em verdade. Foi aqui dito pelo Sr. Deputado Passos Coelho que o PCP não honrou a palavra dada em relação à questão da TSU. Quem não teve em conta a sua palavra e o seu posicionamento de anos foi o PSD!

Queria perguntar se na Posição conjunta PS/PCP, no diálogo estabelecido, alguma vez houve um compromisso do PCP em abdicar da recusa da redução da TSU. Temos diferenças, temos divergências, e essa foi uma delas. Portanto, uma mentira que se afirma muitas vezes não passa a ser verdade.

Mas vamos a coisas mais sérias.

Uma das consequências sociais mais negativas e marcantes da política executada nos últimos anos foi o alastramento, para níveis inaceitáveis, do flagelo da precariedade laboral. Ora, é o próprio texto constitucional que inscreve como princípio fundamental o direito ao trabalho, incumbindo ao Estado promover políticas que garantam a segurança no emprego.

Por isso, hoje, assistimos a que seja o próprio Estado, muitas vezes, estimulador e promotor da precaridade utilizando as mais diversas formas, desde os recibos verdes a contratos a termo, passando pelos estágios, pela contratação de trabalhadores através de empresas de trabalho temporário, como acontece, por exemplo, na área da saúde ou nas escolas, em que há pessoas contratadas à hora, mal pagas e sem preparação.

Há milhares de trabalhadores que prestam serviço público na administração do Estado que têm vínculos precários há vários anos.

Temos apresentado propostas no sentido de resolver ou dar resposta a esta situação.

O Governo inscreveu, no Orçamento do Estado de 2016, a intenção de iniciar o levantamento das situações na Administração Pública e voltou a inscrever a mesma intenção no Orçamento do Estado de 2017.

Passado mais um ano e tirando a abertura dos concursos pontuais a nível da administração central, qual é a situação desse levantamento? Para quando a abertura dos processos concursais que, por um lado, dotem os serviços de meios humanos necessários à prestação do serviço público e, por outro, abram, de facto, um caminho de combate à precariedade? Para quando as medidas que proíbam e limitem as empresas privadas de recorrer a esta inaceitável forma de exploração a coberto da legislação existente, designadamente, estágios, compensações do Estado para empregar jovens à procura do primeiro emprego?

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Sim, de facto, é muito difícil o PSD se transfigurar, particularmente quando se trata dos direitos a nível dos salários, da legislação laboral.

Ouvimos claramente dizerem o seguinte: «Não contem com o PSD para fazer reversões em relação a malfeitorias que hoje estão contidas na lei.». Isto deve ser lição e ensinamento, porque não se pode contar com o PSD para levar ao aumento da reposição de direitos e rendimentos dos trabalhadores, nesta situação como noutras.

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Gostaria de lhe colocar uma questão que já lhe suscitei num debate quinzenal, que é a da situação inaceitável que se está a verificar nos CTT e no serviço público postal.

Nessa altura, chamámos a atenção para um conjunto de problemas que estão a infernizar as populações, os utentes, os trabalhadores dos correios.

Nessa altura, chamámos a atenção para a degradação na distribuição do correio, que tinha atingido níveis inadmissíveis — cartas e encomendas ficam dias ou até semanas a fio nos centros de distribuição à espera de serem entregues.

Mas, agora, Sr. Primeiro-Ministro, há uma novidade: vales postais, pensões de reforma chegam com vários dias de atraso e há filas de espera intermináveis em estações onde são colocados trabalhadores dos CTT noutras áreas e serviços que não o de correio.

Imagine, Sr. Primeiro-Ministro, o drama de um reformado que está à espera da sua pensão para resolver problemas prementes, muitas vezes dramáticos, chegar à estação e dizerem-lhe que a caixa não tem dinheiro.
Por isso, pensamos que urge uma intervenção mais decidida não de mera relação de serviços, para garantir a qualidade de um serviço público que, com a privatização, cada vez mais se degrada.

É preciso fazer alguma coisa em relação a esta situação insustentável.

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