Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

O encerramento do Serviço de Belas Artes da Fundação Calouste Gulbenkian no panorama cultural nacional

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Sr.ª Deputada Catarina Martins,
Em primeiro lugar, quero saudá-la por trazer à Assembleia da República esta matéria relacionada com a extinção do Serviço de Belas Artes da Fundação Calouste Gulbenkian e, em nome do PCP, quero dizer-lhe o seguinte: obviamente que a Fundação Calouste Gulbenkian tem características e estatutos próprios, no quadro dos quais é perfeitamente legítimo a administração tomar as medidas de reestruturação que entenda. Mas, logicamente, também é legítimo o sentimento de preocupação e apreensão que esta medida suscita.
Essa preocupação e apreensão não são sentidas apenas por parte do Grupo Parlamentar do PCP mas também pelos artistas e pelos investigadores que, ao longo dos anos, foram sendo apoiados pela Fundação Calouste Gulbenkian, preocupação e apreensão que são particularmente significativas no quadro de desresponsabilização do Estado e do Governo relativamente às obrigações constitucionais a que o Governo insiste em fugir.
Sr.as e Srs. Deputados, todos nós estamos certamente lembrados das «lágrimas de crocodilo» que o Sr. Primeiro-Ministro foi chorar para a televisão, em período de campanha eleitoral, dizendo que se havia um erro do qual o Governo se arrependia amargamente era o do pouco investimento na cultura.
Mas, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, depois de chorar estas «lágrimas de crocodilo», para enganar os portugueses, o que o Governo do Partido Socialista trouxe a esta Assembleia e o que os senhores aprovaram foi um Orçamento do Estado que foi o segundo mais baixo de que há memória.
É obviamente neste quadro de desresponsabilização e falta de apoio do Estado às artes e à cultura que medidas como estas que a Fundação Calouste Gulbenkian agora anuncia, naturalmente, acarretam preocupação e apreensão para os mais directamente afectados por medidas deste género.
Sr.as e Srs. Deputados, estamos perante um Governo que descarrega sobre as autarquias
responsabilidades que são suas.
Estamos perante um Governo e uma maioria do Partido Socialista que rejeitaram, nesta Assembleia da República, as propostas que o PCP apresentou, no último Orçamento do Estado, para um aumento dos apoios às artes, para um aumento dos apoios com que são financiadas as responsabilidades constitucionais que o Governo tem e que os senhores quiseram rejeitar.
Estamos perante um Governo que, ainda este ano, pôs em perspectiva cortes de 10%, em contratos e compromissos que já tinha assumido.
Estamos perante um Governo que até na área da cultura insiste em fazer negócio, por exemplo, com a privatização, que está em cima da mesa e cuja rejeição teremos oportunidade de votar nesta Assembleia, da Tobis.
Estamos perante um Governo que continua a querer cobrar ilegalmente IVA aos artistas, quando há pareceres que indicam exactamente a ilegalidade dessa decisão, um Governo que continua a remeter para a completa desprotecção todos os trabalhadores das artes do espectáculo.
Portanto, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, Sr.as e Srs. Deputados e Sr.ª Deputada Catarina Martins, a questão que se coloca é a de saber quem é que quer pôr fim a esta política, quem é que quer, de uma vez por todas, assumir uma política que seja de apoio público às artes e à cultura, uma política que tenha uma tradução orçamental mas também uma tradução no apoio aos criadores, aos trabalhadores das artes do espectáculo, no apoio às Belas-Artes, que é o caso que estamos a tratar mais directamente, uma política que rompa, de facto, com esta política que o Partido Socialista vai impondo, de estrangulamento e eucaliptização do sector da cultura, pondo fim a tudo aquilo que é determinante no panorama e no sector cultural.

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