Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

Eliminação do aumento extraordinário de 25% do abono de família

Do decreto-Lei n.º 116/2010, de 22 de Outubro, que elimina o aumento extraordinário de 25% do abono de família nos 1.º e 2.º escalões e cessa a atribuição do abono aos 4.º e 5.º escalões de rendimento, procedendo à sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de Agosto (apreciação parlamentar n.º 70/XI/1.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
As palavras do Primeiro-Ministro, nesta Assembleia da República, quando no passado proclamava a importância do abono de família, «levou-as o vento» e, a pretexto da crise económica, este Governo procedeu a um violento ataque contra esta importante prestação social.
Em vez de exigir mais a quem muito tem e pouco ou nada paga de impostos, em vez de promover a justiça fiscal e a justiça social, este Governo ataca quem menos pode e menos tem.
Depois do ataque às prestações sociais, como o subsídio social de desemprego, a comparticipação nos remédios ou, entre outras, o rendimento social de inserção, como o malfadado Decreto-Lei n.º 70/2010, que altera as condições de recursos com o único objectivo de impedir, mesmo aqueles que necessitam, de aceder a estas prestações sociais; depois do ataque aos salários e pensões, que leva a que a grande maioria dos portugueses vivam com mais dificuldades, o Governo ataca também o abono de família.
De entre estas diferentes medidas que constituem um crime social, o corte no abono de família é, provavelmente, uma das medidas que mais choca pela injustiça que representa.
Com o Decreto-Lei n.º 116/2010, que agora discutimos, o Governo PS elimina o aumento extraordinário de 25% do abono de família nos 1.º e 2.º escalões e cessa a atribuição do abono nos 4.º e 5.º escalões de rendimento. Para que se perceba a real dimensão do ataque que este Decreto-Lei representa, cerca de 374 000 beneficiários do abono de família deixaram de ter acesso a esta prestação social e cerca de 1,75 milhões de beneficiários sofreram um corte de 25%.
Isto é, 1,449 milhões de beneficiários do abono de família, de um total de 1,756 milhões, são afectados por este injusto Decreto-Lei.
Com este Decreto-Lei, 82,5% dos beneficiários do abono de família perdem protecção social, o que é inaceitável e uma injustiça social.
Importa referir que, ao contrário do que o Governo muitas vezes quer fazer acreditar, estes cortes não visam as famílias com mais rendimentos no nosso País. Com o Governo PS, uma família que tenha um rendimento mensal de referência de 628,8 € não tem acesso ao abono de família.
Assim, são, mais uma vez, as famílias que vivem do seu trabalho e que têm poucos rendimentos que têm que apertar, cada vez mais, o cinto e são obrigadas a viver com mais dificuldades.
Ao mesmo tempo que se impõem mais e mais sacrifícios a quem não pode, não param de «chover» os milhões, por exemplo, para o BPN.
Importa referir que, apesar de representar valores baixos, o abono de família é uma importante ajuda para as famílias que decidem ter filhos e, numa altura em que há cada vez mais dificuldades, importava melhorar e aumentar o abono de família, e não o contrário.
Para o PS, bem como para o PSD, importa dizê-lo, o que é fundamental é salvaguardar os lucros dos grandes grupos económicos, e são precisamente estes que ditam as regras e
quais as medidas que se tomam.
Dizem que é preciso fazer cortes, que é preciso combater o défice e a receita é sempre a mesma. Não se corta nos lucros imorais, ilegítimos e obscenos, nomeadamente por via da justiça fiscal, desses mesmos grupos económicos. Não, para eles e, consequentemente, para o PSD e para o PS o caminho é cortar nos salários, nas pensões, nos serviços prestados pela Administração Pública e nas prestações sociais.
Para o PCP, este não é nem pode ser o caminho. Para o PCP, para além de ser uma prestação social fundamental para o bem-estar das crianças, o abono de família, a par do aumento dos salários, e uma rede pública de equipamentos sociais são fundamentais para promover a natalidade no nosso País.
Assim, apresentamos a presente apreciação parlamentar, que visa revogar este Decreto-Lei e assim pôr termo a este injusto corte nesta importante prestação social.
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Quem ouve quer a bancada do PS quer a do PSD, e também o Sr. Secretário de Estado, até lhe parece que não têm qualquer responsabilidade no maior ataque ao abono de família alguma vez perpetrado.
Vamos aos números, Srs. Deputados, porque não há rendimento de referência que fuja a estes números. Reparem: 374 000 beneficiários, isto é, crianças, deixam de receber abono de família; há, no nosso País, 1 756 000 crianças que recebem abono de família e 1 449 000 são vítimas de corte no que diz respeito ao abono de família. Ora, estamos a falar de 82%! Não há discussão,
quanto ao rendimento de referência, que fuja a estes números! Estamos a falar de 82,5% de beneficiários que sofrem um corte, graças às opções do PS, do PSD, do CDS-PP e às suas, Sr. Secretário de Estado!
Importa dizer que, numa altura em que os custos com a alimentação, com os bens essenciais, com a habitação e, também, com as creches aumentam de forma significativa, trata-se de
um crime social que se está a cometer no nosso País.
E importa também dizer que, apesar de o Sr. Secretário de Estado estar tão preocupado com a execução orçamental e dizer que vai poupar 250 milhões, não vimos a bancada do PS nem a do PSD, nem a do CDS preocupadas, por exemplo, em cobrar impostos sobre a antecipação de
dividendos, por parte da PT. Se cobrassem impostos à PT, por essa trafulhice fiscal, teriam mais de 200 milhões de euros em carteira.
Portanto, vê-se bem como é que o Governo faz as suas opções: entre cobrar impostos, de uma forma justa, ou cortar no abono de família, que é essencial para as famílias, o Governo opta por cortar às famílias, que menos têm e menos podem, deixando os grandes grupos económicos lucrarem e aumentarem os seus lucros de uma forma absolutamente inaceitável.

  • Assuntos e Sectores Sociais
  • Assembleia da República
  • Intervenções