Projecto de Lei N.º 463/XV/1.ª

Elimina a natureza tributária das transgressões ocorridas em infraestruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem

(nona alteração à Lei n.º 25/2006, de 30 de junho)

Exposição de motivos

O PCP sempre se opôs à política de imposição de portagens em infraestruturas rodoviárias que tem vindo a ser posta em prática por sucessivos Governos.

O PCP considera que diversos troços de autoestradas não deveriam ser portajados por serem fundamentais para a mobilidade das populações e não terem alternativas acessíveis. O PCP reafirma que as vias que foram concebidas para não terem custos para o utilizador não só não deveriam ter sido portajadas como as respetivas portagens já deveriam ter sido há muito abolidas e reitera que a exploração das vias portajadas não deveria ser objeto de concessão a privados e muito menos através de Parcerias Público-Privadas com graves prejuízos para o erário público.

Não faz nenhum sentido que nos troços em que só existem portagens eletrónicas os utentes que não disponham de identificadores nos respetivos veículos tenham de suportar custos administrativos pelo posterior pagamento de portagens, e considera inaceitável que seja aplicável ao não pagamento de portagens o regime gravoso das infrações tributárias, colocando a Autoridade Tributária a servir de cobrador coercivo de pagamentos devidos a privados.

Sobre toda a problemática relativa à imposição de portagens e respetivos custos, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou já diversas iniciativas legislativas e parlamentares, inclusivamente em sede de Orçamentos do Estado, com vista à abolição de portagens, nomeadamente nas vidas rodoviárias criadas sem custos para o utilizador. O PCP insistirá nessas iniciativas por considerar que a abolição dessas portagens corresponde a uma justa reivindicação das populações mais diretamente atingidas.

De igual modo, o PCP tem vindo a propor a reversão das Parcerias Público-Privadas rodoviárias que constituem um escandaloso esbulho de milhares de milhões de euros de recursos públicos para os cofres dos grupos económicos beneficiários das concessões. O PCP continuará a lutar por essa reversão.

Contudo, há outros aspetos práticos relacionados com o pagamento de portagens que se afiguram profundamente injustos e que devem ser objeto de alteração legislativa.

Em primeiro lugar, não faz qualquer sentido que seja a Autoridade Tributária e Aduaneira a aplicar a qualquer infração relativa ao pagamento de portagens o regime das infrações tributárias. Não só não deve ser o Estado a proceder à cobrança de valores a pagar a entidades privadas, pondo o Estado ao serviço de interesses privados, como a aplicação do regime draconiano das infrações tributárias se revela profundamente injusto.

Se pensarmos nos troços em que só existe cobrança eletrónica de portagens, basta que o utente não se aperceba da passagem sob um pórtico ou que se esqueça de proceder ao respetivo pagamento no curto prazo que lhe é concedido para o fazer, para que sem qualquer advertência ou pedido de pagamento uma dívida de um euro se transforme em trinta e lhe sejam exigidos custos exorbitantes de taxas, coimas e custas sem qualquer possibilidade real de defesa.

Por outro lado, não faz sentido que nas vias onde por opção do Estado e conveniência das concessionárias só existe cobrança eletrónica, o utente que por não ter identificador na viatura tenha de proceder ao pagamento posterior, tenha de suportar custos administrativos a acrescer ao custo devido pelas portagens.

Assim, o presente projeto de lei tem dois objetivos complementares.

Em primeiro lugar, retira da Autoridade Tributária e Aduaneira a competência para a instrução e aplicação do regime de coimas por infrações relativas ao não pagamento de portagens em vias rodoviárias, subtraindo essas infrações ao regime das infrações tributárias, passando essa competência para o Instituto do Mobilidade e dos Transportes e passando o regime subsidiário a ser, como deve ser, o do ilícito de mera ordenação social.

No caso dos troços onde só exista cobrança eletrónica de portagens, não tendo sido feito o pagamento no tempo legalmente estabelecido, devem as concessionárias notificar o devedor para efetuar o pagamento no prazo de 30 dias acrescido de custos administrativos e, em caso de incumprimento, enviar o auto de notícia para o IMT para efeitos de prosseguimento do processo de contraordenação.

Finalmente, estabelece-se que o pagamento posterior das portagens relativas a troços onde só existe cobrança eletrónica, sendo feito no prazo legalmente estabelecido, não deve ser acrescido de quaisquer custos adicionais para o utente.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do artigo 4.º do Regimento, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei elimina a natureza tributária do regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em infraestruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem, procedendo à nona alteração à Lei n.º 25/2006, de 30 de junho.

Artigo 2.º

Alterações à Lei n.º 25/2006, de 30 de junho

Os artigos 5.º, 7.º, 9.º, 12.º, 15.º, 17.º e 18.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, alterada pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 113/2009, de 18 de maio, pelas Leis n.º 46/2010, de 7 de setembro e n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro e pelas Leis n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro e n.º 51/2015, de 8 de junho, passam a ter seguinte redação:

“Artigo 5.º

[…]

  1. […].
  2. […].
  3. Não são devidos custos administrativos pelo pagamento nos termos estabelecidos de taxas de portagem resultantes da transposição de locais de deteção de veículos em infraestruturas rodoviárias que apenas disponham de um sistema de cobrança eletrónica de portagens.
  4. […].

Artigo 6.º

[…]

[…]

  1. […].
  2. […].
  3. […].
  4. Do não pagamento do montante correspondente ao valor máximo cobrável numa determinada barreira de portagem, importância devida sempre que o utente ali se apresente sem ser portador de título de trânsito válido, nos termos da Portaria n.º 762/93, de 27 de agosto, aplicável a todas as concessões com portagens nos termos da Portaria n.º 218/2000, de 13 de abril.

Artigo 7.º

[…]

  1. As contraordenações previstas na presente lei são punidas com coima de valor mínimo correspondente a 7,5 vezes o valor da respetiva taxa de portagem, mas nunca inferior a (euro) 25 e de valor máximo correspondente ao quadruplo do valor mínimo da coima, com respeito pelos limites máximos previstos no artigo 17.º do regime geral do ilícito de mera ordenação social e respetivo processo constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro na sua redação atual.
  2. […].
  3. […].
  4. […].
  5. […].

Artigo 9.º

[…]

  1. Quando o agente de fiscalização, no exercício das suas funções, presenciar a prática das contraordenações previstas nos artigos 5.º e 6.º lavra auto de notícia, do qual deve constar:
    1. A descrição dos factos constitutivos da infração;
    2. O dia, a hora e o local onde foi verificada a infração;
    3. A identificação do arguido, com a menção do nome, da morada e de outros elementos necessários;
    4. A identificação de circunstâncias respeitantes ao arguido e à infração que possam influir na decisão;
    5. A indicação das disposições legais que preveem a infração e a respetiva sanção aplicável;
    6. O prazo concedido para a apresentação de defesa e o local onde esta deve ser entregue;
    7. A indicação da possibilidade de pagamento voluntário da coima pelo mínimo, bem como o prazo e o local para o efeito e as consequências do não pagamento;
    8. Sempre que possível, a identificação de testemunhas que possam depor sobre os factos;
    9. A assinatura do agente que o levantou e, quando possível, de testemunhas.
  2. O auto de notícia lavrado nos termos do número anterior faz fé sobre os factos presenciados pelo autuante até prova em contrário.
  3. O disposto no número anterior aplica-se aos meios de prova obtidos através dos equipamentos que registem a imagem do veículo com o qual a infração foi praticada ou de deteção de veículos em infraestruturas rodoviárias que apenas disponham de um sistema de cobrança eletrónica de portagens.
  4. O auto de notícia não deixa de ser lavrado ainda que o autuante repute a infração como não punível, devendo, no entanto, fazer menção da circunstância.
  5. O arguido é notificado da infração que lhe é imputada e da sanção em que incorre no momento da autuação mediante a entrega do aviso de pagamento da coima.
  6. A recusa de receção do aviso de pagamento da coima não prejudica a tramitação do processo.

Artigo 12.º

Pagamento voluntário da coima

  1. As concessionárias, ou as entidades incumbidas da cobrança de taxas, notificam o agente da contraordenação nos termos do artigo 10.º para, no prazo de 30 dias, proceder ao pagamento voluntário da coima, que é liquidada pelo mínimo reduzido em 50%, e da taxa de portagem em dívida.
  2. Caso o arguido não use da faculdade conferida pelo número anterior, as concessionárias ou as entidades por estas incumbidas da cobrança das taxas de portagem devidas enviam o auto de notícia ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes que instaura o correspondente processo de contraordenação e notifica o arguido, juntando à notificação o duplicado do auto de notícia.
  3. O arguido pode, no prazo de 30 dias a contar da notificação referida no número antecedente, proceder ao pagamento voluntário da coima, que é liquidada pelo mínimo, e da taxa de portagem em dívida.
  4. Em qualquer caso, o pagamento voluntário da coima só pode ser efetuado se simultaneamente for liquidada a taxa de portagem em dívida.
  5. O pagamento das coimas e das taxas de portagem devidas perante as entidades referidas no n.º 1 é feito contra a entrega de recibo ou, em caso de pagamento por via eletrónica, de documento equivalente.
  6. O pagamento voluntário da coima nos termos dos números anteriores determina o arquivamento do processo.

Artigo 15.º

[…]

O Instituto de Mobilidade e dos Transportes é competente para a instauração e instrução dos processos de contraordenação a que se refere a presente lei, bem como para a aplicação das respetivas coimas.

Artigo 17.º

[…]

  1. Caso a coima seja paga diretamente à empresa concessionária do serviço em questão, o produto da coima é distribuído da seguinte forma:
    1. 60% para o Estado;
    2. 20% para o Instituto da Mobilidade e dos Transportes;
    3. 20% para a empresa concessionária do serviço em questão.
  2. As concessionárias devem proceder à entrega trimestral nos cofres do Tesouro dos quantitativos que, das coimas cobradas, constituem receita do Estado.
  3. Caso a coima seja paga após a instauração do processo contraordenacional, o produto da coima é distribuído da seguinte forma:
    1. 20% para a empresa concessionária do serviço em questão;
    2. 20% para o Instituto da Mobilidade e dos Transportes;
    3. 60% para o Estado.
  4. O Instituto da Mobilidade e dos Transportes deve proceder à entrega trimestral às concessionárias das importâncias relativas às taxas de portagem cobradas, bem como dos quantitativos que, das coimas cobradas no âmbito dos processos de contraordenação, àquelas pertencem nos termos da presente lei.

Artigo 18.º

[…]

Às contraordenações previstas na presente lei, e em tudo o que nela não se encontre expressamente regulado, é aplicável o regime geral do ilícito de mera ordenação social e respetivo processo constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro na sua redação atual.”

Artigo 3.º

Norma revogatória

São revogados:

  1. O artigo 17-º-A da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, na redação atual;
  2. O n.º 5 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 84-C/2022, de 9 de dezembro.

Artigo 4.º

Regime transitório

No prazo de 60 dias após a entrada em vigor da presente lei, a Autoridade Tributária e Aduaneira transfere para o Instituto da Mobilidade e dos Transportes todos os processos de contraordenação em curso relativos a transgressões ocorridas em infraestruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem para efeitos de aplicação do regime nela estabelecido.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia imediato à sua publicação.

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