Projecto de Lei N.º 172/XII-1ª

Elimina os mecanismos de aumento do horário de trabalho

Elimina os mecanismos de aumento do horário de trabalho

Usando como desculpa o pacto de agressão assinado pelo PS, PSD e CDS, o Governo prepara-se para mais uma alteração à legislação laboral para agravar, ainda mais, a exploração de quem trabalha.

Ao contrário do que querem fazer querer, a legislação laboral nada tem a ver com o problema do défice ou dívida externa, mas utilizando o pacto de agressão e o seu programa político, preparam-se para, na mesma linha do anterior Governo PS, desregulamentar ainda mais o horário de trabalho.

Atacar o horário de trabalho e promover a sua desregulamentação foi e é uma das principais ambições do patronato Português. O objetivo é claro: trabalhar mais para receber cada vez menos. Assim, depois de derrotada, pelos trabalhadores Portugueses, a intenção de aumentar o horário normal de trabalho em meia hora, o acordo assinado pelo patronato e pela UGT visa garantir o aumento da exploração por outra via.

Na verdade, a intenção do Governo é alargar, generalizar e institucionalizar o banco de horas, desta vez “negociando” diretamente com o trabalhador, para que os trabalhadores trabalhem até mais duas horas por dia sem receber mais um cêntimo que seja.

Importa referir que em Portugal já se trabalha mais horas por ano que na Alemanha, França, Dinamarca ou Luxemburgo, países bem mais competitivos que o nosso e que não enfrentam os problemas que o nosso país enfrenta.

Fica assim provado que os problemas que o nosso país enfrenta ou a competitividade da nossa economia não se resolvem com o aumento do horário de trabalho, nem com o aumento da exploração de quem cria riqueza no nosso país.

Mas importa referir que estes ataques ao horário de trabalho não são novos.

Na verdade, na sequência de mais de três décadas de política de direita, sucessivos Governos PS/PSD, com ou sem o CDS, promoveram violentos ataques contra os direitos dos trabalhadores.

Na primeira linha dessa ofensiva encontra-se o horário de trabalho.

Em 2003, o PS dizia em relação à Proposta de Lei n.º 29/IX, do Governo PSD/CDS-PP, que deu origem ao Código do Trabalho de 2003, que esta “adoptava soluções normativas de fundo que desequilibram ainda mais as relações de trabalho a favor do empregador e em detrimento da posição dos trabalhadores” e que reforçava “os mecanismos de adaptabilidade não negociada, com prejuízo nítido para os trabalhadores e suas famílias beneficiarem da conciliação entre a vida pessoal e familiar e a vida profissional, em colisão com princípios constantes da Lei Fundamental.”.

Entretanto, o PS, uma vez no Governo, alterou para pior do Código do Trabalho favoreceu a desregulamentação dos horários de trabalho e criou novas figuras – a adaptabilidade individual (art.º 205º), a adaptabilidade grupal (art.º 206º), o banco de horas (art.º 208º) e os horários concentrados (art.º 209º), que visam colocar na esfera da entidade patronal a determinação dos tempos de trabalho, e a possibilidade do alargamento da jornada de trabalho diária até 12 horas (4 horas por dia) e da jornada de trabalho semanal até 60 horas.

Assim, o XVII Governo Constitucional, apoiado pela maioria absoluta do PS na anterior legislatura, abriu caminho para que as horas de trabalho a mais deixem de ser pagas como trabalho suplementar, extraordinário ou na base do regime aplicável a dias de descanso (sábados e domingos) e feriados. O anterior Governo do PS abriu caminho para que a decisão de redução compensatória dos tempos de trabalho caiba, na prática, às entidades patronais, dificultando a articulação da vida profissional com a vida pessoal dos trabalhadores.

Hoje, é o Governo PSD/CDS que pretende, não só concretizar, como levar mais longe a ofensiva contra a histórica conquista dos trabalhadores das 8 horas de trabalho por dia.

Para além do corte de 4 feriados, 3 dias de férias (por via da eliminação por compensação da assiduidade) e de as empresas passarem a poder impor “pontes” a descontar nas férias dos trabalhadores, prevê-se o estabelecimento generalizado do banco de horas até um total de 150, por acordo individual.

Quer isto dizer que os trabalhadores poderão chegar a um total de 10 horas diárias de trabalho, por conveniência do patrão e quando este entender, que são descontadas no horário laboral, quando à entidade patronal convier. Ou seja, as entidades patronais poderão obrigar a trabalhar 10 horas por dia durante 75 dias úteis (mais de 3 meses) sem pagarem horas extraordinárias, mas apenas descontando esse tempo no resto do ano.
Hoje, nos dias úteis, as horas suplementares são pagas a 150% (a primeira) e a 175% (as restantes), com as alterações à legislação laboral que o Governo apresentou os trabalhadores deixariam de receber, por ano, o equivalente a 93, 75 horas. Ou seja seriam 2 semanas, 1 dia, 5 horas e 45 minutos de trabalho de trabalho extraordinário que passariam a ser pagas a singelo.
Mas, como as horas extraordinárias são também compensadas (a 25%) em tempo de descanso retirado do horário normal, os trabalhadores que sejam obrigados pela empresa a esgotarem o banco de horas vão, para além disso, ter que trabalhar mais 4 dias, 5 horas e 30 minutos sem serem pagos por isso.
Importa referir que foi em pleno século XIX, em 1919, que a OIT (Organização Internacional do Trabalho) instituiu a regra de que 8 horas são para trabalhar, 8 horas são para descansar e 8 horas são para estar com a família e para o lazer.

A dimensão do retrocesso histórico não pode passar em claro e deve merecer, por parte dos trabalhadores, uma forte oposição e luta.

Acresce que, o aumento do horário de trabalho nestes termos põe em causa a própria saúde dos trabalhadores, aumentando os riscos de doenças profissionais e acidentes de trabalho.

Importa referir que, alargar a jornada diária de trabalho traduz-se num aumento dos níveis de fadiga responsável por grande parte dos acidentes de trabalho que se registam. Um estudo desenvolvido pela Escola Médica da Universidade de Massachusetts e pelo Instituto de Ciências da Saúde Ambiental Americano, publicado agora na revista internacional Occupational and Environmental Medicine (edição on-line), vem reforçar cientificamente o facto de que horários de trabalho superiores a 8h diárias afectam negativamente a saúde e o bem-estar dos trabalhadores, sendo que os riscos a este nível aumentam em 61%.

Assim, importa denunciar que se a intenção do Governo de alargar ainda mais o horário de trabalho, por via da facilitação e generalização do banco de horas, se concretizasse, tal medida iria implicar que os trabalhadores ficassem cada vez mais expostos a acidentes de trabalho e doenças profissionais, a que acrescem todas as consequências na sua vida familiar e profissional.

Após 120 anos de luta organizada contra a exploração em matéria de horário de trabalho, no prosseguimento do percurso histórico impulsionado pelo 1.º de Maio de 1886, o anterior Governo PS com o actual Código do Trabalho e o atual Governo, por via das propostas que apresenta, pretendem abrir caminho para a destruição de uma das mais importantes conquistas dos trabalhadores, num projecto de retorno inadmissível a tempos idos em que se trabalhava 12 e mais horas por dia.

Entre 1975 e 2004 a riqueza criada por empregado cresceu 41 vezes pois, segundo o Banco de Portugal, o PIB por empregado subiu de 640 euros para 26.300 euros, dados que vão de encontro à exigência da redução progressiva da jornada de trabalho, protegendo-se assim a segurança dos trabalhadores e respeitando os seus direitos constitucionais, nomeadamente o direito ao repouso.

A Constituição da República Portuguesa prevê, na alínea d), do n.º 1 do artigo 59º o direito «ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas». Está em causa, pois, a vida familiar, a vida política, a vida social e o descanso dos trabalhadores. E cabe ao Estado garantir que, também em matéria de fixação da jornada de trabalho, não haja lugar ao retrocesso social.

Por estes motivos, o PCP propõe a eliminação das normas que permitem a desregulamentação do horário de trabalho, nomeadamente através da eliminação do banco de horas, dos mecanismos de adaptabilidade individual e grupal e horário concentrado, determinando ainda que não pode ser unilateralmente alterado o horário de trabalho individualmente acordado.

Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1º
Alteração ao Anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho
Os artigos 106.º, 212º, 217º e 219º do Anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho, passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 106.º
(…)
1 — …
2 — …
3 — …:
a) …;
b) …;
c) …;
d) …;
e) …;
f) …;
g) …;
h) …. ;
i) O horário de trabalho;
j) …;
l) ...
4 — Eliminar
5 — …
Artigo 212.º
(…)
1 - …
2 - …
a) …
b) Facilitar ao trabalhador a compatibilização da actividade profissional com a vida pessoal, familiar, social e política, bem como atender ao facto de existirem trabalhadores pertencentes ao mesmo agregado familiar;
c) …
3 - …
4 - …

Artigo 217.º
(…)
1 - …
2 - …
3 - …
4 – Não pode ser unilateralmente alterado o horário de trabalho.
5 - …
6 - …

Artigo 219º
(…)
1-…
2- Na falta de estipulação das partes, aplica-se o disposto na alínea c) do número anterior.
3-…
4-…»
Artigo 2º
Norma Revogatória
São revogados os artigos 204º a 209º e as alíneas c) e d) do n.º 2 do artigo 214º do Anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro que aprova a revisão do Código do Trabalho.

Artigo 3º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, em14 de Fevereiro de 2012

  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Trabalhadores
  • Assembleia da República
  • Projectos de Lei