Projecto de Lei N.º 944/XV/2

Elimina o chamado «adicional ao ISP» e a dupla tributação dos combustíveis (IVA sobre ISP)

Exposição de motivos

Os sucessivos aumentos do preço dos combustíveis assumem um carácter especulativo, servindo para aumentar os lucros milionários das grandes petrolíferas.

As medidas que têm sido tomadas pelo Governo são insuficientes, quer porque, do ponto de vista fiscal, ficam aquém da resposta necessária, quer porque sem regular os preços, nada garante que qualquer alívio fiscal não seja total ou parcialmente absorvido pelas petrolíferas, limitando os efeitos reais no preço que é pago pelos consumidores e colocando as receitas fiscais a financiar os lucros das petrolíferas.

Com este Projeto de Lei, o PCP propõe medidas fiscais que contribuam para a redução do preço dos combustíveis, que não apagam a necessidade de se avançar com outras medidas, também já propostas pelo PCP, designadamente a fixação de um preço de referência para combater a especulação em torno das cotações internacionais e das margens de refinação, medida essa que foi rejeitada com os votos contra de PS, PSD, CH e IL (Projeto de Lei n.º 18/XV/1.ª (PCP)).

Com a presente iniciativa, o PCP propõe:

1) o fim do chamado “adicional ao ISP” criado por portaria do Governo em 2016

A justificação então apresentada pelo Governo, de que era necessário um aumento temporário do ISP para manter os níveis de receita fiscal numa altura de baixa do preço dos combustíveis, manifestamente não se adequa à situação atual. O PCP há muito que defende o fim deste aumento, comumente referido como “adicional ao ISP”, apresentando essa proposta e votando propostas de outros partidos nesse sentido. No contexto atual, em que a justificação para aquele aumento está completamente ultrapassada, o PCP defende o fim deste aumento e a repristinação dos valores de ISP anteriores a 2016, atualizando apenas o valor da taxa unitária à inflação.

2) o fim da dupla tributação do ISP em sede de IVA

Não é aceitável que o IVA incida sobre o combustível mais o ISP. Urge corrigir a circunstância de haver um “imposto que paga imposto”, ainda por cima com o elevado peso que tem no preço final pago pelos consumidores.

Se é verdade que esta situação se aplica a outros Impostos Especiais de Consumo (o que deve ser revisitado), é preciso ter em conta o peso muito significativo que o ISP (e o IVA que sobre ele incide) tem no preço final dos combustíveis.

Para pôr fim a esta dupla tributação, o PCP propõe nesta iniciativa a criação de um mecanismo que devolva, em sede de ISP, o valor correspondente à parte do IVA que incide sobre o próprio ISP. Com este mecanismo, garante-se a devolução do valor que resulta da dupla tributação, sem alterar por enquanto o código do IVA.

A título de exemplo, estando atualmente o ISP da gasolina a 0,579€/litro, significa que o IVA que incide sobre o próprio ISP corresponde a 23% X 0,579€/litro, ou seja, 0,1332 €/litro. Com o mecanismo proposto, o valor do ISP seria reduzido em 0,579€ X 0,187 = 0,1083€/litro, o que corresponde a uma redução fiscal de 0,1083€/litro X 1,23 (por aplicação do IVA), ou seja, de 0,1332 €/litro, ou seja, ao valor da dupla tributação.

Como este exemplo mostra, a aplicação deste mecanismo levaria a uma redução imediata do preço pago pelos consumidores em 13,3 cêntimos por litro de gasolina; fazendo o mesmo cálculo para o valor atual do ISP que incide sobre o gasóleo, a redução do preço por litro seria de 10,2 cêntimos por litro no gasóleo 1.

Com esta iniciativa, o PCP pretende responder à situação urgente de aumento de preços, reafirmando que a solução para o sector da energia passa pelo controlo de margens e preços e pelo seu controlo público, colocando este sector estratégico ao serviço do desenvolvimento do país.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente Lei:

  1. cria o mecanismo automático para a eliminação da dupla tributação dos Combustíveis;
  2. Elimina o aumento das taxas unitárias do ISP estabelecido por portaria de 2016.

Artigo 2.º

Mecanismo automático para a eliminação da dupla tributação dos combustíveis

  1. O Governo cria, por portaria, um mecanismo automático para a eliminação da dupla tributação dos combustíveis, que revê e fixa os valores das taxas unitárias do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP) por forma a devolver, em sede de ISP, a totalidade da receita de IVA que incide sobre o ISP.
  2. Até à criação do mecanismo referido no número anterior, o Governo utiliza o mecanismo criado pela Portaria n.º 111-A/2022, de 11 de março, alterando os valores das taxas unitárias de imposto no sentido de assegurar a devolução prevista no número anterior.
  3. Para efeito dos números anteriores, o valor da taxa unitária do ISP relativo a cada um dos produtos referidos no Artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho, é reduzido na proporção de [valor do ISP] X 0,187.

Artigo 3.º

Eliminação do aumento das taxas unitárias do ISP

  1. São eliminados os aumentos do valor das taxas unitárias do ISP aplicáveis no continente à gasolina sem chumbo e ao gasóleo rodoviário previstos pelas Portarias n.º 24-A/2016, de 11 de fevereiro, n.º 136-A/2016, de 12 de maio, n.º 291A/2016, de 16 de novembro de 2016, n.º 345-C/2016 de 30 de dezembro de 2016, Portaria n.º 385-I/2017, de 29 de dezembro e Portaria n.º 301-A/2018, de 23 de novembro.
  2. Para os efeitos do número anterior, o Governo publica por portaria, no prazo de 7 dias após a entrada em vigor da presente Lei, os valores das taxas unitárias ISP, repondo os valores previstos nos n.ºs 1.º e 2.º da Portaria n.º 16-C/2008, de 9 de janeiro, atualizados à taxa de inflação, por substituição da Portaria n.º 301-A/2018, de 23 de novembro.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a publicação do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.

1 Cálculo para o valor do ISP ao dia de 09/10/2023, segundo o site da ENSE – Entidade Nacional para o Sector Energético, E.P.E.

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