Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

«Os donos da UE só aceitam os que se submetem à sua visão e seus interesses»

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Sr. Presidente,
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo,
Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar,

Gostaria de deixar uma palavra de solidariedade da bancada do PCP em relação aos dramáticos acontecimentos ocorridos hoje em Londres.

Independentemente de uma posição mais de fundo, queríamos afirmar, desta forma breve, a nossa solidariedade.

Sr. Primeiro-Ministro, queria também manifestar o nosso repúdio pelas insolentes declarações do presidente do Eurogrupo sobre os países do Sul da Europa, onde se inclui Portugal. São declarações sobranceiras, xenófobas, de quem se julga dono da Europa e das instituições, de quem defende que só existe uma solução política legítima, a deles, a do diretório liderado pela Alemanha, a quem serve o Sr. Dijsselbloem.

Na semana passada, era o Sr. Schäuble a assinar com o novo programa de agressão designado de resgate; anteontem, era o BCE a fazer novas ameaças de sanções a Portugal, em nome do procedimento de desequilíbrios macroeconómicos; ontem, foi a vez do presidente do Eurogrupo, com estes ditotes de caserna.

Os donos da União Europeia só reconhecem e aceitam os que se submetem à sua visão da Europa e do capital e aos interesses egoístas que representam. O que isto confirma, do nosso ponto de vista, é a necessidade de Portugal afirmar uma política de defesa do interesse nacional, rompendo com o atual quadro de imposições e de constrangimentos.
Aplausos do PCP.

Ainda quanto à Caixa, que já aqui foi suficientemente debatida, creio que foi importante a clarificação em relação à questão do financiamento e da recapitalização.

A afirmação do Sr. Primeiro-Ministro de que essa dívida não pode ser convertida em capital acionista privado da Caixa é importante, porque desmente, designadamente, uma acusação do Sr. Deputado Passos Coelho, cujo Governo, PSD/CDS, fez uma recapitalização insuficiente e criou o tal sistema dos CoCo (contingent convertible bonds), que, em última análise, permitiria a reconversão em capital privado, em ações.

E vem agora acusar o PS, o PCP, o Bloco de Esquerda e Os Verdes de estarem, afinal, a favor de uma privatização?! É importante esse esclarecimento, porque alguém está a enganar alguém, e creio que é o Sr. Deputado Passos Coelho.

Uma outra questão que considero importante está relacionada com uma afirmação que o Sr. Deputado Luís Montenegro aqui fez. Quem havia de dizer que o Governo que encerrou 109 agências — não foram 108, Sr.ª Deputada Catarina Martins —,reduzindo 2300 postos de trabalho na Caixa Geral de Depósitos, tem agora moral para vir dizer que se ameaçam os postos de trabalho? Mais vale tarde que nunca! Ainda bem que o PSD está tão preocupado como nós em relação à possibilidade de encerramento de agências, com as consequências que isso provocaria.

Creio que esta questão tem tanta mais importância, porque, de repente, pode pensar-se que os problemas da Caixa residem no número de balcões e no número de trabalhadores.

O que levou a esta situação difícil da Caixa Geral de Depósitos não foram os trabalhadores nem os diversos balcões da Caixa que existiam. Pois a verdade é que esses problemas, essas dificuldades têm origem na forma como foi gerida a carteira de crédito, nos créditos concedidos a amigos sem nenhumas garantias, nos negócios ruinosos.

É isto que tem de ser evitado, não são os postos de trabalho que têm de ser reduzidos!

Sr. Primeiro-Ministro, uma questão que consideramos de grande importância é a da necessidade de valorização dos trabalhadores no trabalho e na reforma, que tem sido uma preocupação central em que temos insistido.

Sobre as longas carreiras contributivas, o PCP tem apresentado propostas e temos insistido em sucessivos debates quinzenais e temos encontrado, da parte do Sr. Primeiro-Ministro, uma disponibilidade e uma sensibilidade para a consideração do problema.

Quando assumimos o compromisso de certas coisas, temos de as concretizar e creio que era importante essa concretização, tendo em conta as justas expectativas criadas para quem trabalhou durante uma vida inteira e tem direito à reforma por inteiro.

Sobre um outro combate importante, o combate à precariedade, no setor público e no privado, a precariedade deve ser combatida e erradicada. Foram já aprovadas — e estão em andamento — medidas de combate à precariedade na Administração Pública. Importa garantir a integração de todos os trabalhadores que respondem a necessidades permanentes de escolas, de hospitais, de universidades, do IEFP (Instituto do Emprego e Formação profissional), da RTP, das autarquias e do setor empresarial do Estado.

Também no setor privado, a precariedade marca o dia a dia de muitos milhares de trabalhadores no nosso País. É o uso abusivo dos contratos a prazo, do trabalho temporário, dos outsourcings, dos falsos recibos verdes, dos estágios e sei lá que mais…

O PCP apresentou uma proposta que será discutida na próxima sexta-feira para que as decisões condenatórias da ACT (Autoridade para as Condições do Trabalho) de conversão do falso recibo verde ou de outro trabalho precário em contrato de trabalho sem termo possam ter natureza de título executivo, executando-se automaticamente a decisão.

É uma proposta que consideramos importante, pelo que gostaríamos também de ouvir a sua opinião e a sua contribuição.

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