Defesa Nacional e Forças Armadas

Sobre Defesa Nacional e Forças Armadas,
declaração de Rui Fernandes da Comissão Política do PCP

 

O Orçamento de Estado que o PS vai fazer aprovar, no final da semana,
prosseguindo as linhas essenciais de uma política errada e eternizando
as opções de prioridade no combate ao défice, terá também consequências
nefastas na área da Defesa Nacional, na estabilidade das Forças Armadas
e na vida dos militares.

O Governo e o PS assumem, desta forma, que a reestruturação que
pretendem fazer nas Forças Armadas não será resultado de qualquer
estudo ou planeamento mas sim de um processo “acidental” resultante de
cortes orçamentais. Isto é, o Ministério da Defesa quer imputar ao seu
orçamento para 2007 as economias de uma reestruturação que ainda não
fez, esquecendo-se que a reestruturação e o redimensionamento das
Forças Armadas não são apenas o resultado da venda de imóveis ou da
redução de umas centenas de praças. Aliás, qualquer processo sério de
reestruturação e redimensionamento exigirá um investimento inicial
para, mais tarde, se verificar então a necessária redução das despesas.

Ao contrário, o Ministério da Defesa decidiu-se por cortes orçamentais
com o acordo, pelo menos público, das chefias militares, cortes que
atingem a saúde (cerca de 50%) ou as verbas para os militares na
reserva (cerca de 25%). Cortes que não resolvem, entre outros
problemas, os atrasos de cerca de um ano no pagamento da
comparticipação na Assistência da Doença aos Militares, nem o pagamento
do complemento de pensão para os militares na situação de reforma, nem
o atraso no pagamento a fornecedores que, pelo que tem vindo a público,
ascende já a largos milhares de euros.

De resto, seria bom que, em vez de anúncios a conta-gotas na
comunicação social sobre aspectos de eventuais alterações na estrutura
militar como os novos poderes do CEMGFA, o Ministro da Defesa
apresentasse em sede própria o seu projecto para que se conheça o
verdadeiro alcance das suas propostas nomeadamente sobre o futuro
Estado-Maior de Defesa mas também quanto à aplicação do famoso PRACE na
Instituição Militar e o sentido e o objectivo da reestruturação das
carreiras.
Entretanto, à medida que as Forças Armadas vêem escassear os recursos
financeiros que lhes permitam assumir plenamente as suas missões em
território nacional e se exige aos portugueses que continuem a “apertar
o cinto”, Portugal continua a empenhar-se em missões internacionais e a
alargar a sua participação nos vários teatros de guerra, como se
verifica agora com o envio de tropas para o Líbano. Como se vê, as
missões militares no estrangeiro, ao serviço dos paladinos do
militarismo e da guerra, estão longe de serem afectadas pelas
restrições orçamentais e pelos drásticos sacrifícios impostos aos
militares e ao povo.

Em contrapartida, a falta de dinheiro é justificação para o
incumprimento das leis e para o não pagamento aos militares dos que
lhes é devido em função dos compromissos assumidos pelo Estado,
enquanto se lhes impõem a retirada de regalias e direitos, colocando-os
em plano de igualdade com os funcionários públicos no que respeita aos
direitos, esquecendo que os deveres a que os militares estão obrigados
não têm qualquer correspondência com a Administração Pública.
 Este tem sido o perigoso caminho que o Governo vem trilhando,
tratando de forma igual aquilo que é desigual, degradando o Estatuto da
Condição Militar e não assumindo que, a um conjunto de direitos
nomeadamente em matérias como a saúde e a segurança social, estão
associados deveres que passam designadamente pela restrição de
direitos, por uma permanente disponibilidade para o serviço e pelos
riscos inerentes ao serviço militar.

Não se podem manter especiais deveres e suprimir direitos! E não tem
credibilidade o governo vir exigir aos militares o cumprimento da lei
quando é ele próprio a não a cumprir. Isto é um facto que está
devidamente documentado.

As medidas que vêm sendo sucessivamente anunciadas pelo Governo não têm
em conta a especificidade da função militar, consubstanciam a perda de
direitos, põem também em causa o Estatuto da Condição Militar e abalam,
cada vez mais, a coesão de umas Forças Armadas onde, há largos anos, os
militares esperam pela reformulação e modernização de vários
instrumentos, nomeadamente de âmbito estatutário e regulamentar, e
aguardam a implementação da reorganização operacional e a
racionalização do dispositivo.

Daqui resulta a situação de inquietação que os militares vivem e de
que as suas associações tem feito eco, em diversos momentos e de formas
diversas. Não houvesse razões para protestos e não teria o Governo
anunciado, na véspera do “passeio dos militares”, aquilo que deveria
ter feito há largos meses isto é, clarificar as condições em que se
aplica o regime de reserva e reforma dos militares, contrariando deste
modo o parecer da Caixa Geral de Aposentações. 

A propósito das recentes tomadas de posição dos militares importa dizer
que, mais importante que procurar rótulos para colar às iniciativa ou
esgrimir contra fantasmas, é ter a noção exacta do grau de insatisfação
que se está a gerar no meio militar, que as chefias militares bem
conhecem!
Pela nossa parte, com um elevado sentido das responsabilidades e ao
contrário do que o PS nos acusa, sempre nos escusámos a entrar em
promessas incomportáveis do ponto de vista orçamental, cujo único
objectivo é o da caça ao voto. Um exemplo disso é o problema dos
ex-combatentes, que continua e continuará por resolver, com PS e a
direita a fazerem demagogia em período pré-eleitoral, apesar de
alertados pelo PCP, através do relatório elaborado à época na Comissão
Parlamentar de Defesa, para as dificuldades da sua concretização. São
essas e outras promessas que os militares estão agora a cobrar. Mas não
fomos nós que as fizemos ou propusemos! Foram antes os jogos
interesseiros entre o PS, o CDS-PP e o PSD.

Por isso, o que se exige ao Governo e ao PS é que ponha de lado as
manobras de diversão e o facilitismo na forma como tem lidado com as
questões militares. Ponha de lado a via da punição e do castigo que
nada resolvem e tudo agravam, desde logo pela elementar razão de os
problemas persistirem e, persistindo, manter-se a insatisfação e o
mal-estar. Aquilo que se impõe é coerência e um elevado sentido de
responsabilidade na ponderação da legislação relativa a estas matérias,
que conduza a um arrepiar de caminho e contribua para a necessária
coesão e estabilidade das Forças Armadas, um pilar essencial na Defesa
Nacional e na estrutura do Estado. Aquilo que se impõe é que o governo
fale verdade e não utilize as Forças Armadas e os militares como peças
das suas opções ideológicas em matéria de concepção do Estado.
A Constituição da República define o lugar e o papel das Forças
Armadas. Exige-se que o governo respeite a Constituição.  

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