Intervenção de

Declaração Política sobre a responsabilidade social das empresas e as condições de trabalho<br />Intervenção da Deputada Odete Santos

Senhor Presidente Senhores Deputados:O Livro Verde sobre a responsabilidade social das empresas, da iniciativa da Comissão Europeia, compraz a algumas almas menos avisadas, e também àqueles que se contentam com aparências de justiça e de coesão sociais.É nesse Livro Verde que podemos ler algumas considerações que de qualquer forma convirá recordar aos empresários alemães que acabaram de fazer um pronunciamento grave ao Ministro de Trabalho: ou a desregulamentação completa das relações de trabalho, ou o adeus às suas empresas que se deslocalizariam para outros países.Inscrevendo, desta forma, o seu comportamento no Livro Negro das receitas da mais feroz exploração, condimentadas com novas especiarias.Mas é o Livro Verde, que seguramente não desconhecem, que contém, entre outras, as seguintes considerações:"A responsabilidade social das empresas é, essencialmente, um conceito segundo o qual as empresas decidem, numa base voluntária, contribuir para uma sociedade mais justa e para um ambiente mais limpo.Confrontadas com os desafios de um meio em mutação no âmbito da globalização e, em particular, do mercado interno, as próprias empresas vão também tomando consciência de que a sua responsabilidade social é passível de se revestir de um valor económico directo. À semelhança da gestão da qualidade, a responsabilidade social de uma empresa deve ser considerada como um investimento, e não como um encargo.Através dela, é possível adoptar uma abordagem inclusiva do ponto de vista financeiro, comercial e social, conducente a uma estratégia a longo prazo que minimize os riscos decorrentes de incógnitas.Ser socialmente responsável não se restringe ao cumprimento de todas as obrigações legais - implica ir mais além através de um "maior" investimento em capital humano, no ambiente e nas relações com outras partes interessadas e comunidades locais.Os resultados positivos directos podem derivar, por exemplo, de um melhor ambiente de trabalho, levando a um maior empenhamento e uma maior produtividade dos trabalhadores.A nível da empresa, as práticas socialmente responsáveis implicam, fundamentalmente, os trabalhadores e prendem-se com questões como o investimento no capital humano, na saúde, na segurança ..."É tudo isto que é sistemática e repetidamente esquecido por parte de todos aqueles que acenam com o fantasma da baixa produtividade dos trabalhadores portugueses, omitindo o cumprimento de obrigações da sua inteira responsabilidade que se cifrariam na elevação do nível da qualidade de emprego.Quanto ao nível da qualidade de emprego, Portugal ostenta das mais elevadas taxas dos chamados dead-end jobs-empregos mortos à nascença. Ou seja, os empregos precários.O trabalho sem direitos.É o relatório da sobre Emprego na Europa no ano 2001, elaborado pelo Eurostat de parceria com a Direcção Geral do Emprego e dos Assuntos Sociais, que o refere:"A segurança no emprego foi estável entre 1995 e 2000, com cerca de ¾ dos trabalhadores permanecendo nos empregos durante 2 anos pelo menos. Mas nesse mesmo período foi aumentando a taxa de empregos precários inferiores a 2 anos. Os chamados dead-end jobs estão sobrerepresentados em Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda e Itália."Esta realidade não podia deixar de ter correspondência nas condições de trabalho e nos acidentes de trabalho e doenças profissionais.Como o realça o Relatório que vimos citando:"...as condições de trabalho, incluindo a segurança no local de trabalho não se desenvolveram nos últimos anos (...)As razões principais para a deterioração das condições de trabalho residem na intensificação dos ritmos do trabalho e na importância cada vez maior da flexibilização do mesmo. A intensificação dos ritmos de trabalho está forte e intrinsecamente ligada a doenças profissionais e a acidentes de trabalho."Articulando assim, os vários relatórios citados, torna-se claro que a produtividade dos trabalhadores aumenta com a estabilidade no emprego, com empregos de qualidade, com a observância de direitos fundamentais dos trabalhadores, e não com a desregulação, com o trabalho precário, com o trabalho sem direitos.A desregulação, a exploração, têm o efeito inverso: empregos precários de baixa produtividade, para o que contribuem de forma significativa as ausências ao trabalho motivadas por acidentes de trabalho, por doenças profissionais, nas quais estão obviamente incluídos o stress, a depressão, a angústia.É assim que, reflexo da realidade atrás referida, a Agência Europeia vem difundindo dados preocupantes sobre a saúde dos trabalhadores, nos quais se destacam, em cores bem escuras, os índices portugueses.Todos os anos morrem 5.500 pessoas na União Europeia, vítimas de acidentes de trabalho. No total, acidentes fatais e não fatais, são cerca de 7,4 milhões ( o que significa um aumento, de 1998 para 1999, últimos dados conhecidos).Destacam-se, nestas cifras negras, os jovens, os trabalhadores a título precário, e os desempregados de longa duração que regressam à actividade.São cerca de 150 milhões de dias de trabalho perdidos!A estes dias têm de somar-se os dias de trabalho perdidos por causa das baixas devidas a doenças resultantes da actividade profissional. Que são mais 350 milhões de dias perdidos na União Europeia.Cerca de 7,7 milhões de trabalhadores ( de 98 para 99) sofreram de problemas de saúde de origem profissional. Parte dos casos deviam-se ao stress, à depressão, à ansiedade. Uma grande percentagem (53%) resultavam de doenças músculo esqueléticas, sendo as mais conhecidas as tendinites.Nós temos de ter razões acrescidas de preocupação. Porque Portugal é o país com a taxa de acidentes de trabalho mais elevada.Face à média europeia comunitária de 4229 acidentes por 100.000 trabalhadores , nós registamos cerca de 7214 acidentes ano por cada 100.000 habitantes.Segundo os últimos dados conhecidos, de 1999 para 2000 houve uma aumento da sinistralidade laboral. Foram mais cerca de 6000 os acidentes de trabalho, e os acidentes de trabalho mortais totalizaram 287! Um número arrepiante pelos dramas que nele podemos adivinhar!Relativamente às doenças profissionais , há muitas que não estão assim classificadas mas são-no verdadeiramente. Há muitas que dão origem a baixa por doença, como as do foro psíquico. São as já atrás referidas que se identificam no stress, na depressão na angústia. Constituindo uma tremenda injustiça que os trabalhadores, vítimas das péssimas condições de trabalho, de brutais ritmos que lhes são impostos, de discriminações no trabalho, de terrorismo psicológico, se vejam classificados como absentistas!E existem, e atingem já milhares de trabalhadores de vários sectores, as doenças músculo esqueléticas, situação que durante anos o PCP aqui denunciou, reclamando medidas para por cobro ao flagelo.Agora que a União Europeia dedicou em 2000, a semana europeia sobre saúde no trabalho, áquelas doenças( e na qual se concluiu que 40 milhões de trabalhadores se encontram afectados por doenças musculo- esqueléticas) os que acusavam os trabalhadores afectados de tendinite, e o seu Sindicato, de efabulações, têm de engolir as acusações.Porque já não podem negar, por exemplo, que só no ramo de fabricação do material eléctrico e electrónico são mais de 5.000 os trabalhadores afectados por esta doença profissional, em grande parte jovens.Muitas são mulheres que ficaram quase completamente incapacitadas para as tarefas desenvolvidas em família. Para sustentar os filhos ao colo, para o esforço físico. Mas que são consideradas aptas para trabalhar sem qualquer incapacidade! Pasme-se!Senhor Presidente Senhores DeputadosAs vítimas de acidentes de trabalho continuam a reclamar justiça, porque a reparação que recebem não as indemniza de todos os danos sofridos, que profundamente atingem os próprios familiares, engrossando com as ainda parcas reparações os 23% de pobres com que também nos distinguimos tristemente na União Europeia.Os trabalhadores reclamam melhores condições de trabalho, o cumprimento dos seus direitos constitucionalmente previstos!Porque também eles são seres humanos!

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