Intervenção de

Declaração Política sobre os &#8220;pagamentos especiais por conta&#8221;<br />Intervenção do Deputado Bernardino Soares

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,Na passada Sexta-feira, 27 de Junho, a cidade de Lisboa, e as capitais de distrito de Norte a Sul do País, foram palco de uma vasta e intensa acção de luta, organizada pelas estruturas representativas do sector do Táxi.Particular destaque, pela dimensão do protesto, assumiu naturalmente a jornada ocorrida nesta cidade, com a grande mobilização dos motoristas de táxi: primeiro, frente ao Ministério das Finanças, depois aqui mesmo frente à Assembleia da República.Para quem, com responsabilidade política e um mínimo de sensibilidade, assumir uma reflexão séria sobre a atitude do Governo que veio a merecer esta resposta do sector do Táxi, chega naturalmente (se é que ainda não chegou) à conclusão de que estamos perante um erro clamoroso, e uma injustiça gritante, neste processo dos Pagamentos Especiais por Conta.Desde logo, ficou à vista de toda a gente a actuação do Governo, face ao justo protesto dos taxistas. Primeiro, fechou a porta e recusou ouvir as suas reivindicações. Depois, enquanto os manifestantes se dirigiam ao Parlamento (conhecida que estava a óbvia disponibilidade do PCP para os receber), o Governo reconsiderou e mandou chamar uma delegação do sector, para ser recebida pelo chefe de gabinete do secretário de estado.No final do encontro, pela parte do Governo, ficou tudo na mesma. Isto é, num período em que muitas empresas se defrontam com graves problemas financeiros e de liquidez, continua a insistência do Governo nesta forma cega e insensata de aplicar o Pagamento Especial por Conta. A primeira prestação desse pagamento é exigida, de resto, já de hoje a duas semanas. E nem disso o Governo abriu mão.Sejamos claros: este pagamento antecipado, nos termos em que está definido, não é mais que um financiamento ilegítimo das empresas ao Estado; um autêntico imposto disfarçado que vem penalizar particularmente as micro, pequenas e médias empresas.Mas esta “declaração de guerra” fiscal às micro, pequenas e médias empresas não caiu de pára-quedas. Não veio dar à costa, trazida pela maré. Não foi encontrada numa cesta no Terreiro do Paço. Foi uma opção política, deliberada e assumida pelo Governo – e reiterada na Assembleia da República pela maioria que o suporta.Basta um pouco de memória e seriedade para recordar que foi com a aprovação do Orçamento de Estado para este ano, com o voto contra do PCP, que foram introduzidas estas e outras medidas, que vieram a traduzir-se num brutal agravamento da carga fiscal para estes empresários.Como se não bastasse o aumento de 28,2% que então se registou nos pagamentos de IRS e IRC no âmbito do Regime Simplificado, o Governo foi ainda mais longe na ofensiva.E no que se refere aos Pagamentos Especiais por Conta, não só o valor de referência de 1% se aplica agora sobre o volume de todos os proveitos e ganhos do ano anterior como, além disso, o montante mínimo a pagar foi aumentado em mais 250% (passando de 498.80 para 1250 euros), e o montante máximo teve um aumento de mais de 13 mil por cento (de menos de 1500, passou para 200 mil euros)!Anote-se, o Governo manteve inclusive a aberração de para se receber um possível reembolso de diferencial pago em sede do PEC, serem os empresários a requerer a inspecção tributária a expensas próprias, podendo pagar de inspecção mais do que o valor do diferencial a receber.Entretanto, não podemos ignorar que todo este agravamento da carga fiscal foi levado a cabo sem nenhum estudo, sem nenhuma ponderação sobre as suas consequências para as empresas afectadas. Mas as consequências aí estão, incontornáveis, a abater-se sobre dezenas e dezenas de milhar de micro, pequenos e médios empresários.Sobre essas consequências, o Grupo Parlamentar do PCP voltou a reflectir e a debater, na passada Sexta-feira, em conjunto com os representantes do sector do Táxi. Colocou-se então, como agora se coloca, a urgente necessidade de evitar o injusto e desigual sacrifício que o Governo impõe a este sector.E não perdemos de vista que esse sacrifício, que o País constatou com a luta dos taxistas, está a ser sentido na pele, de forma generalizada, pelas micro, pequenas e médias empresas, nos mais diversos sectores da economia portuguesa. Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,A grave situação que está a ser vivida neste universo de empresas, tão importante, representativo e dinâmico – e ao mesmo tempo tão desprotegido, maltratado e atacado pelas políticas do governo – podia na verdade ter sido evitada.Bastava para esse efeito que os Senhores Deputados do PSD e do CDS-PP tivessem optado por apreciar e viabilizar, sem preconceitos, a proposta de alteração do Orçamento de Estado para este ano, que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou sobre esta matéria.Em devido tempo, alertámos para a injustiça das opções do Governo. E propusemos uma alternativa, simples mas decisiva, que era a de repor os limites anteriormente em vigor para o Pagamento Especial por Conta – e não de multiplicar o seu valor, conforme a maioria de direita veio a determinar.Ao rejeitar essa nossa proposta, o PSD e o CDS-PP escolheram o seu caminho: optaram por penalizar as micro e pequenas empresas. Os resultados estão à vista. E agora que se fazem sentir os resultados dessa decisão do Governo e da maioria, é preciso que cada um responda pelas suas acções.Mas se no passado mês de Outubro, durante a discussão do Orçamento, esta questão se colocou, já em Janeiro deste ano o PCP voltou a suscitar no Parlamento a necessidade de adoptar medidas de apoio às micro, pequenas e médias empresas.Com o Projecto de Resolução n.º 81/IX, que então apresentámos, aí estavam e estão as recomendações para que se proceda à avaliação – que o Governo não realizou – das consequências económicas e financeiras destes agravamentos, por sector de actividade e escalão de dimensão das empresas.Aí está a afirmação da importância – que o Governo não reconhece – da criação de condições não discriminatórias no acesso ao crédito e apoios financeiros.E aí está também a urgente necessidade – que o Governo não atende – de combater a concorrência desleal e o abuso de posição dominante por parte dos grandes operadores e grandes superfícies, nas suas relações comerciais com as micro e pequenas empresas.Aliás, a este propósito, refira-se que o estrangulamento financeiro a que vem sendo sujeitos a generalidade desse tecido empresarial, asfixiados por elevadas taxas de juro impostas pelo sector bancário por gravosas comissões e condições crediticias, restrições ou mesmo cortes draconianos no crédito. De nada vale a descida das taxas de referência do BCE e outros bancos centrais. Tudo é engolido pela voragem do sector financeiro. Ver o exagero das taxas cobradas pela UNICRE com os cartões de crédito e débito.Refira-se a continuação de uma política de aplicação dos fundos comunitários fortemente discriminatória dos pequenos empresários, enquanto escandalosamente o Estado não paga os seus compromissos com os projectos do urbanismo comercial PROCOM|URBCOM.Refira-se a anunciada alteração da legislação para licenciamento das UCDR, vulgo Grandes Superfícies. O que está em cima da mesa, em nome de uma dita descentralização, é a passagem do licenciamento para os municípios e o fim das quotas, ou seja a mais descarada e total liberalização da implantação dessas unidades comerciais. O Governo sabe, como toda a gente, que não haverá nenhuma Câmara Municipal com força política e razões para se opor a tal pretensão.Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,Já se perdeu demasiado tempo com esta lamentável atitude do governo. Em lugar de persistir no mesmo erro, tantas vezes apontado, o governo e a maioria melhor farão em dar ouvidos às legítimas reivindicações dos industriais e trabalhadores do Sector do Táxi, e aos micro, pequenos e médios empresários em geral.Não sendo a primeira, esta é certamente uma determinante oportunidade para uma reflexão rigorosa sobre o caminho percorrido – e as opções que é possível tomar. Contando naturalmente com os principais interessados neste processo, num debate aprofundado e participado, que há muito já o Governo devia ter feito.Por isso o PCP requereu ontem mesmo, na Comissão de Economia e Finanças, a realização, com carácter de urgência, de uma audição parlamentar com a Senhora Ministra das Finanças, com a ANTRAL, com a Federação Portuguesa do Táxi e com a Confederação das Micro, Pequenas e Médias Empresas.É urgente parar com esta ofensiva, antes que seja tarde demais. É fundamental conhecer em concreto a situação que está criada com este processo. É indispensável suspender e alterar o actual prazo desta primeira prestação do Pagamento Especial por Conta. E é essencial alterar a forma como se está a proceder à sua aplicação. Pelas opções tomadas até agora, o governo e a maioria têm de responder. É a contestação que percorre o País que já o está a exigir. Porque demonstrações de força para com os mais fracos, já temos quanto baste.

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