Intervenção de

Debate relevante de interesse pol?tico sobre "A Organiza??o Mundial do Com?rcio"<br />Interven??o do deputado Agostinho Lopes

Senhor Presidente, Senhores Deputados, O Governo portugu?s e a Organiza??o Mundial do Com?rcio Se havia quest?o que merecia um grande debate nacional, suscept?vel de promover a defini??o de uma estrat?gia e objectivos nacionais, conforme os interesses do Pa?s, eram as novas negocia??es da OMC. Lamentavelmente, o Governo do PS, repetindo tamb?m nesta mat?ria o comportamento do Governo PSD/Cavaco Silva, em 1993, fez sobre as negocia??es da OMC que se iniciam dentro de dias em Seattle, um pesado muro de sil?ncio. O que sabem os cidad?os portugueses destas importantes negocia??es? Nada ou quase nada! Qual a estrat?gia negocial do Governo portugu?s? Que objectivos tem defendido nos Conselhos de Ministros da Uni?o Europeia onde estas quest?es t?m sido discutidas? Que estudos sobre as consequ?ncias para Portugal dos resultados dessas negocia??es? O que sabem os partidos da oposi??o sobre as posi??es do Governo PS relativamente ? OMC? Que consulta foi feita ?s organiza??es sociais de trabalhadores, empres?rios, agricultores? Com que informa??o do Governo est?o a intervir os deputados portugueses no Parlamento Europeu? ? claro que h? aqui uma dificilmente explic?vel subtrac??o ao Pa?s, e em particular ? Assembleia da Rep?blica, de informa??o e de exig?ncia de participa??o. ? assim ocultado ao povo portugu?s o necess?rio debate sobre quest?es essenciais para a sua vida hoje e o seu futuro colectivo amanh?, como Pa?s independente! Amanh? vir?o dizer aos agricultores que a culpa n?o ? do Governo mas das imposi??es da OMC. Amanh? vir?o dizer aos empres?rios t?xteis que os seus problemas resultam das posi??es que a Uni?o Europeia assumiu na OMC. Amanh? vir?o dizer aos jovens que a degrada??o ambiental, um planeta cada vez mais sujo e irreconhec?vel nada tem a ver com a pol?tica do PS, mas com a decis?o da OMC. Amanh? vir?o dizer aos trabalhadores e ao povo que a falta de emprego e de qualidade de vida ? inevit?vel porque s?o incontorn?veis os impactos da OMC. Amanh? mandar?o para Angola, Mo?ambique e Guin? mais uns sacos de arroz, umas toneladas de peixe congelado ou uns contentores de medicamentos, cheios de pena do atraso e mis?ria desses pa?ses, nada dizendo sobre as suas responsabilidades numa OMC que pretende retirar a dezenas de pa?ses e povos do mundo o direito a terem uma agricultura, uma ind?stria, servi?os p?blicos de sa?de e educa??o capazes de assegurarem n?veis m?nimos de dignidade humana. Mas eles, mais uma vez, n?o ter?o culpa, porque a culpada ser? a OMC. Mas n?o se enganem. Haver? milhares de m?os a apontar os culpados. ? lament?vel que este debate s? agora surja na Assembleia da Rep?blica, e s? ap?s a exig?ncia do PCP para que ele se efectuasse. E ? ap?s a sua marca??o na agenda parlamentar que come?aram a surgir na comunica??o social portuguesa algumas not?cias e informa??es do Governo sobre o assunto. Mas n?o ? admiss?vel que o ?pessimismo? com que o Governo aborda a Cimeira, referido pelo conselheiro da miss?o portuguesa junto da OMC, ou a ?lamenta??o? sobre o uso que fez a Uni?o Europeia do ?cheque em branco dado a Bruxelas?, possa iludir algu?m sobre as responsabilidades do Governo pelos maus resultados do que acontecer. (O que, naturalmente, esperamos que n?o suceda! E n?o ? admiss?vel, porque o Governo, contrariamente a outros pa?ses da Uni?o Europeia, n?o mobilizou, n?o envolveu a dita ?sociedade civil?, n?o informou nem procurou o di?logo e a converg?ncia com os partidos da oposi??o, apesar da abordagem deste problema, pelo menos desde 30 de Mar?o de 1998, nas reuni?es do Conselho. O que est? em causa nas negocia??es da OMC? Particularmente em foco est?o as seguintes quest?es: A seguran?a alimentar, na sua dupla acep??o ? o direito de cada pa?s a uma produ??o agr?cola razo?vel para a alimenta??o do seu povo, ou seja, o direito a ter uma agricultura e a exig?ncia de produtos agro-alimentares saud?veis, n?o agressivos da sa?de humana. Seguran?a alimentar que ? explicitamente posta em causa pela liberaliza??o dos mercados agr?colas, pela redu??o da protec??o ?s produ??es nacionais, pela concep??o dos ?produtos agr?colas? apenas como ?mercadoria? semelhante a qualquer produto industrial. Seguran?a alimentar posta em causa por aqueles que n?o desistem de fazer da ?alimenta??o? uma arma. Avan?ado relativamente ?s negocia??es est? o ministro Capoulas Santos que, no recente fim-de-semana, anunciou em Aveiro o projecto de liquida??o de 70% das actuais explora??es produtoras de leite, pelo afastamento da produ??o de todos os agricultores at? 4 vacas, que abrem assim espa?o/quotas a favor dos ?agricultores competitivos?. A liberaliza??o acrescida do com?rcio de produtos n?o agr?colas constitui uma orienta??o forte da Uni?o Europeia. Na sua comunica??o, a Comiss?o prop?e, mesmo que n?o avance mais nada, a ?redu??o a zero? pelos pa?ses desenvolvidos das taxas aduaneiras ? quase totalidade dos produtos origin?rios dos pa?ses menos desenvolvidos. O que levanta um conjunto de interroga??es. Qual ? o conte?do preciso dessa classifica??o dos pa?ses menos desenvolvidos? H? nesta mat?ria coincid?ncia de interesses entre Portugal e os pa?ses mais industrializados da Uni?o Europeia? Est? avaliado o significado e definidas as condi??es em que a China entra na OMC? Quem e como v?o ser fiscalizadas as regras de uma mais livre e mais aberta concorr?ncia? Como? Se nem ao n?vel do mercado ?nico da Uni?o Europeia essas regras s?o respeitadas. A total liberaliza??o do mercado de servi?os e, em particular dos servi?os p?blicos, como a educa??o e a sa?de. Vamos assistir em Portugal ? generaliza??o nos servi?os de sa?de, do que aconteceu nos servi?os de hemodi?lise, monopolizados por empresa transnacional? ? imaginar muito admitir ver no futuro um painel de peritos da OMC pronunciar-se a favor do direito de escolas privadas de uma empresa transnacional de servi?os de educa??o n?o permitirem o ensino de teorias evolucionistas de Darwin?! Tal como hoje nos querem impor uma alimenta??o ? base de produtos OGM, ou de carnes com hormonas! A ?propriedade intelectual?, na sua rela??o com o com?rcio (TRIPS ? Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights), tal como os direitos de autor e de cria??o, denomina??es de origem e proveni?ncia geogr?fica, marcas comerciais, patentes e projectos industriais. Para l? de outros aspectos, representa a tentativa de apropria??o pelas transnacionais da agro-qu?mica do patrim?nio de gera??es de agricultores do mundo inteiro e da biodiversidade do planeta, atrav?s do estabelecimento de patentes de sementes e prop?gulos em simult?neo com os esfor?os para impor o uso dos Organismos Geneticamente Modificados (OGM). Um caso ?not?vel? de propriedade intelectual. Em 28 de Outubro a Uni?o Europeia, que devia dar o exemplo, aprovou a revis?o da directiva comunit?ria relativa ao fabrico de chocolate, permitindo a substitui??o parcelar (at? 5%) da manteiga de cacau por outras gorduras vegetais. Grave ? que o Governo de um pa?s como Portugal, que tem uma dur?ssima batalha a travar em defesa das suas denomina??es de origem, como a do vinho do Porto, que tem as rela??es hist?ricas com ?frica que s?o conhecidas, e em particular com os PALOP, produtores de cacau, tenha sido c?mplice desse assalto ? propriedade intelectual de pa?ses pobres! A total liberaliza??o e protec??o dos investimentos do grande capital financeiro, com a tentativa de recupera??o e integra??o do Acordo Multilateral de Investimentos (AMI) na OMC. Apesar das posi??es cuidadosas face ao naufr?gio do AMI, expressas no Documento da Comiss?o e das cautelas presentes na Resolu??o do Parlamento Europeu, diversos objectivos e conceitos - ?n?o discrimina??o?, protec??o dos investimentos?, ?clima empresarial est?vel e transparente? - evidenciam os riscos de reca?da no AMI, particularmente quando n?o se afirma como direito imprescrit?vel a capacidade dos pa?ses de acolhimento, a regulamentar o exerc?cio da actividade econ?mica no seu territ?rio. A identidade e diversidade cultural dos povos, atrav?s do tratamento das actividades culturais como pura e simples mercadoria. Sendo uma quest?o de interesse relevante, a chamada ?excep??o cultural? n?o pode servir de contrapartida para fazer passar todo o outro contrabando liberalizador. Os perigos para a actividade cultural s?o reais. Basta atentar no alcance e monstruosidade da al?nea 27 da Resolu??o do Parlamento Europeu que ?Recomenda a institui??o de um sistema de arbitragem para aprovar os subs?dios ?s l?nguas e culturas minorit?rias que sejam, ao mesmo tempo genuinamente necess?rias e distor?am a concorr?ncia internacional na menor medida poss?vel?. Monstruosidade aprovada com os votos do PS e PSD no Parlamento Europeu! Ser? estranho ver um futuro onde um painel de peritos da OMC inquire o Estado portugu?s sobre os apoios concedidos para a defesa da cultura e do dialecto mirand?s? A limita??o e condicionamento das normas de trabalho da Organiza??o Internacional do Trabalho (OIT) e das normas ambientais, ao ?bom funcionamento? do mercado planet?rio e interesses do capital transnacional. ? lament?vel n?o se afirmarem como objectivos/normas centrais, a atravessarem transversalmente todos os dossiers e sectores da negocia??o da OMC: o pleno emprego, o direito ao trabalho est?vel e dignamente remunerado, as resolu??es das Confer?ncias de Copenhague e de Pequim; o integral respeito pelos acordos multilaterais do ambiente, nomeadamente os decorrentes das Confer?ncias do Rio de Janeiro e de Quioto. Os problemas do desenvolvimento e a OMC Quando as principais for?as econ?micas e pol?ticas do planeta pretendem dar mais um passo (ou v?rios) no caminho da liberaliza??o, era bom que se olhasse para o que decorreu desde 15 de Abril de 1994, com a cria??o da OMC, em Marraquexe. S?o os relat?rios das ag?ncias especializadas das Na??es Unidas que demonstram que ?a receita m?gica da liberaliza??o comercial? n?o resultou e fez dos pa?ses em vias de desenvolvimento e com economias emergentes as suas principais v?timas. As respostas a estas quest?es, ao direito de todos os pa?ses e povos do mundo a um desenvolvimento aut?nomo (o que n?o significa aut?rcico), equilibrado e sustentado, n?o est? certamente no prosseguimento a todo o vapor da liberaliza??o dos mercados e a regulamenta??o monopol?stica do poder, do saber, da distribui??o da riqueza. Os arautos (do neoliberalismo) clamam que o rem?dio est? na liberdade de acesso pelos pa?ses pobres aos mercados dos pa?ses ricos, no acesso aos mercados p?blicos e na sua privatiza??o, na total liberaliza??o da circula??o dos capitais financeiros. Mas escondem o que se esconde por debaixo dessas receitas com conhecidas e desastrosas consequ?ncias. Escondem, por exemplo, que 43% das exporta??es agro-alimentares brasileiras s?o controladas por 17 empresas multinacionais, e que quem enriquece com essas exporta??es s?o os respectivos accionistas e n?o os milh?es de sem terra, que continuam a lutar no Brasil por um peda?o de terra que lhes d? uma vida digna. Escondem que quem vai ganhar com a abertura do mercado europeu da banana, decidida e imposta pela OMC a pedido dos EUA, s?o as companhias norte-americanas Chiquita e Dole Food, e n?o os camponeses e os povos ind?genas da Am?rica Latina. Escondem que o dossier TRIPS pretende consolidar o dom?nio monopolista dos conhecimentos cient?ficos e t?cnicos pelo mundo desenvolvido, obrigando os pa?ses pobres a pagarem caro as transfer?ncias tecnol?gicas e a moderniza??o dos seus aparelhos produtivos. Escondem que a apresenta??o do combate ao ?dumping social e ambiental? como proteccionismo inaceit?vel, ? feito em defesa das transnacionais que exploram essa m?o-de-obra ou obt?m lucros elevados da explora??o das florestas tropicais. S?o assim inteiramente justificadas as posi??es e as preocupa??es de milhares de ONG que, dando voz a um largu?ssimo movimento de opini?o p?blica mundial, contestam a abertura destas novas negocia??es da OMC. E contestam, n?o porque as coisas estejam bem. Mas para que seja feita uma avalia??o da situa??o do planeta e das consequ?ncias do Acordo do GATT de 1993. Querem uma morat?ria a todo o processo de novas negocia??es. Considera??es finais e algumas propostas do PCP Feitas as considera??es atr?s referidas, tal n?o significa oposi??o do PCP a um acordo geral e global do com?rcio internacional, dando um conte?do, objectivos e funcionamentos novos a uma OMC reformulada. Um acordo precedido por um largo debate, permitindo a real interven??o dos povos e pa?ses, das organiza??es sociais. Um acordo que assegurasse a democraticidade e a transpar?ncia das negocia??es e funcionamento das institui??es da OMC. Um acordo que tivesse por objectivo a constru??o de uma Nova Ordem Internacional, justa, equilibrada e democr?tica, ?assente na coopera??o entre povos e pa?ses soberanos e iguais em direitos, orientada pelos valores da paz, da democracia, do progresso social e da amizade entre os povos?, recusando a globaliza??o comandada pelo capital transnacional e ofensiva dos direitos dos povos e dos equil?brios ambientais?. Esse acordo impor? a avalia??o das consequ?ncias da actual globaliza??o capitalista. Esse acordo exigir? o primado da soberania e interesse de cada Estado, respeitando as suas especificidades, necessidades e o papel fundamental dos seus sectores produtivos e p?blicos. Esse acordo exigir? a completa altera??o dos actuais mecanismos e regras de regula??o dos diferendos - dos ditos ?Paineis?. Esse acordo exigir? a contempla??o obrigat?ria do respeito generalizado por condi??es sociais e ambientais. Esse acordo impor? o n?o tratamento de muitas actividades unicamente a partir do conceito de ?mercadoria?, como a agro-alimentar e a cultural, entre outras. Esse acordo impor? o respeito e a promo??o de acordos preferenciais com pa?ses com menor desenvolvimento. Esse acordo exigir? o controlo dos mercados financeiros, com a introdu??o da Taxa Tobin, a recusa de um novo ?AMI?, reformulado ou com outro nome, na OMC; a luta contra legisla??o extraterritorial. ? neste sentido que o PCP apresenta hoje nesta Assembleia um Projecto de Resolu??o. Disse.

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