Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

Debate de atualidade sobre a privatização da TAP

Sr.ª Presidente,
Sr.as Secretárias de Estado,
Sr. Secretário de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados:
O Governo não se contém de orgulho e de satisfação.
O Governo está feliz, é, talvez, um dos momentos mais importantes da sua vida. O Governo anunciou, com pompa e circunstância, a decisão de vender a nossa companhia aérea de bandeira por 10 milhões de euros a um investidor norte-americano, investidor especializado em desmanchar companhias e vendê-las pelo preço mais caro que conseguir.
Morris Air, fundada pelo Sr. David Neeleman, vendida à Southwest Airline em 1993; a Westjet, no Canadá, fundada pelo Sr. Neeleman, vendida em bolsa em 1999; a Azul, Brasil, fundada em 2008, anda há dois anos a tentar dispersá-la em bolsa… Este senhor, que os senhores apresentam como o grande estratega e o futuro da TAP, é especializado em retalhar companhias aéreas.
Muitos parabéns, Sr. Secretário de Estado, é esta a visão estratégica que os senhores têm para o País, mas não é a que propomos.
O que ouvimos da parte do Sr. Deputado Nuno Magalhães foi taxativo: a oposição não apresenta uma única proposta. Isto é dito pelo Sr. Deputado que há algumas semanas votou contra o projeto de resolução n.º 1145/XII (4.ª), do PCP, que apresentava propostas, soluções concretas para a companhia aérea de bandeira. O CDS, o PSD e também, já agora, o PS, talvez por medo, recusaram-se a discutir concretamente as propostas que apresentámos.
Portanto, de duas, uma: ou o Sr. Deputado não estava na Sala ou, então, estava e mentiu. Ainda vou ter de ouvir a gravação para ver se o Sr. Deputado Nuno Magalhães, que até me parece que interveio, estava agora a faltar à verdade deliberadamente!
Aliás, verificamos que os senhores têm medo de debater as propostas do PCP e as soluções concretas que a TAP reclama e que os trabalhadores propõem há vários anos porque tentam de forma desesperada forçar supostas pseudoinevitabilidades para dizer que não há alternativas. Existem alternativas ainda hoje e este processo ainda agora pode e deve ser travado!
O que o Estado português fizer relativamente à TAP é muito mais caro se deixar a TAP ir para estes interesses e para estes grupos económicos do que aquilo que possa vir a fazer em defesa da Companhia para a manter na esfera pública.
Os senhores falam em 1000 milhões de euros de dívida da TAP. É ou não verdade que há dois ou três anos a dívida era superior, era cerca de 1200 milhões? A dívida está a baixar com a TAP na esfera pública. É ou não verdade que destes 1000 milhões, quase metade, mais de 400 milhões de euros, correspondem ao leasing da frota de aeronaves? É ou não verdade que, quando dizem 354 milhões de euros já, os senhores estão a ser desmentidos pelo próprio Ministro Pires de Lima, que dizia que não é esse o montante, mas, sim, 269 no closing e 10 milhões agora?
Os senhores estão a desmentir o Ministro Pires de Lima? Ou é o Ministro Pires de Lima que desmente o CDS?
Entendam-se, Srs. Deputados!
O que temos é um anúncio muito concreto por parte da Sr.ª Secretária de Estado que, na conferência de imprensa de ontem, dizia que a dívida da TAP vai continuar a ser paga pelos cash-flows gerados pela Companhia como até agora sucede, o que significa que, em relação à dívida, esta operação não altera rigorosamente nada no que toca ao endividamento da TAP. Aliás, quando os senhores falam nos 354 milhões, que, afinal, são 269, importa lembrar que a Portaria n.º 358-A/2015, assinada pelo Sr. Secretário de Estado, autoriza o pagamento, ao longo destes 10 anos, para os privados que ficam com a gestão da Metro do Porto, com a privatização que os senhores decidiram, de 420 milhões de euros mais IVA.
Perguntamos: como é que os senhores se gabam de um negócio que promete 260 milhões e dizem que não há dinheiro para estar a empatar na companhia aérea de bandeira, quando entregam de bandeja, nos próximos 10 anos, 420 milhões mais IVA ao consórcio privado que ficar com a Metro do Porto?
Mas que critérios são estes?
Sr.ª Presidente, nós dizemos uma coisa muito clara: não há um preço bom para vender a TAP, porque também não há um preço bom para vender o País. Haja alguém, neste País, que diga que a TAP não está à venda, que o País não está à venda!
Não podemos discutir se a TAP é mais cara ou mais barata, se se vende mais depressa ou mais devagar! É preciso defender o interesse e a soberania e isso significa defender a TAP mantendo-a na esfera pública.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Nesta altura do debate, queria fazer uma…
(…)
Sr.ª Presidente, depois desta pseudointerpelação completamente escusada, vou agora intervir na minha vez, se me permite.
Penso que nesta altura da discussão importa retificar uma coisa que foi falsamente dita por Srs. Deputados da maioria. Os senhores disseram que a TAP foi privatizada, mas não foi. A TAP não foi privatizada, foi anunciada uma decisão sobre o senhor americano a quem o Governo quer vender a TAP. A TAP não foi vendida! Há certas coisas que estão a acontecer e, até ela ser vendida, há coisas que ainda irão acontecer. Vamos ver com que legalidade e com que regularidade. Vamos ver!
Mas, neste momento, a TAP é pública e este processo pode parar. Pode parar hoje, pode parar amanhã! A qualquer momento pode haver um assomo de brio patriótico neste País que permita que a TAP não seja vendida desta forma escandalosa e criminosa como está a ser.
Estamos, de facto, perante a oportunidade, não apenas de travar este processo, como até de reverter este negócio escandaloso e ruinoso para o País, para o Estado, para a economia, para a soberania. Não estamos condenados a isto, Srs. Deputados! O País não está condenado a estas opções, o País não está condenado a esta política! A política não tem de ser esta, porque, quando ouvimos o Sr. Secretário de Estado dizer que é nestas alturas que se vê o verdadeiro ADN dos governos, é verdade! É em alturas como esta que ficamos a perceber exatamente ao serviço de quem é que está o poder político quando decide a venda da TAP por 10 milhões de euros.
Nós dizemos: a vida não tem de ser assim, a política não tem de ser esta e o povo já noutras ocasiões teve uma palavra a dizer sobre a história e o futuro deste País e sobre a vida da Companhia. A TAP não tem 10 anos, Srs. Deputados!
Apesar da vossa gritaria, a TAP não tem 10 anos, tem 70! A TAP tem 70 anos! Já foi privatizada por um governo fascista!
A TAP existe hoje porque é pública, porque não a conseguiram privatizar, senão já não existia.
Enquanto houver esperança neste País, enquanto houver quem lute, enquanto houver quem continue a intervir em defesa da companhia aérea, vamos ter futuro neste País, Srs. Deputados!

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