Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

Debate de actualidade sobre as conclusões do Conselho Europeu, que teve lugar nos dias 8 e 9 de Dezembro, em Bruxelas

Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo:
Todos lhe dão umas especiais boas-vindas, Sr. Ministro, e não serei eu que deixo de me associar desejando-lhe também boas-vindas a este debate. Ainda há dias, em relação a uma alteração do Tratado da União Europeia, esperávamos todos que V. Ex.ª estivesse presente. Infelizmente, não nos deu oportunidade de conversar consigo numa altura em que se debatia uma questão essencial para o nosso País.
Sr. Ministro, hoje, esperávamos que viesse explicar, mas, de facto, infelizmente, veio aqui apenas servir, sem ofensa naturalmente, de uma espécie de porta-voz das conclusões do Conselho Europeu, realizado na passada semana. Aliás, duvido que seja porta-voz do Conselho. Penso que foi mesmo porta-voz de um almoço entre a Sr.ª Merkel e o Sr. Sarkozy que aconteceu ainda antes deste Conselho Europeu!
Gostávamos que o Sr. Ministro tivesse explicado — e vou deixar que o faça, provavelmente, no debate da próxima quinta-feira — como nos vai «vender» as imposições que a Sr.ª Merkel fez ao nosso País; como vai justificar aqui, em Portugal, mais um passo de capitulação de aspectos centrais da nossa soberania; como vai justificar a designada «união orçamental», não só já o visto prévio sobre as nossas opções constitucionais mas também a fiscalização permanente da execução orçamental em Portugal, competência que — veja lá o crime, Sr. Ministro…! — a lei e a Constituição da República atribuem, em exclusivo, à Assembleia da República; como vai explicar por que razão vamos ter uma Constituição decalcada ou copiada da Constituição alemã; como vai conseguir explicar que seja racional e aceitável rasgar a nossa Constituição para lá colocar o limite do deficit e o limite da dívida apenas para tranquilizar o eixo franco-alemão, como vai conseguir explicar que as opções legítimas do nosso povo para os futuros governos do nosso País, eleitos pelo povo, possam passar a ser agora alvo de fiscalização de tribunais e como é possível imaginar que os tribunais nacionais, incluindo o Tribunal Constitucional, possam passar a estar — veja-se lá! — subordinados à tutela de tribunais europeus.
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
Era importante que o Sr. Ministro pudesse ter explicado isto, em vez de servir de mero porta-voz!
As decisões tomadas no Conselho Europeu são, de facto, particularmente graves e inaceitáveis para Portugal e para os povos dos Estados-membros da União Europeia. Se as decisões da passada semana avançarem, Portugal transforma-se numa espécie de protectorado alemão E não é por causa da crise, porque não será apenas durante a crise, como o CDS e o Dr. Paulo Portas gostam de invocar para «sacudir a água do capote», omitindo e dissimulando as suas responsabilidades neste caminho de submissão nacional! Com estas decisões, Portugal pode, de facto, transformar-se numa espécie de protectorado permanente às ordens de Berlim e de Paris. Portugal e boa parte dos Estados-membros da actual União Europeia ficarão às ordens da Sr.ª Merkel. Praticamente, só falta passar a nomear em Lisboa um embaixador com cadeira reservada nas reuniões do Conselho de Ministros, que pelo menos até agora são presididas pelo Dr. Passos Coelho!!
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
Como seria de esperar, o Conselho Europeu não deu nem podia dar resposta alguma aos problemas centrais da União Europeia, como o crescimento económico, a coesão económica e social, o combate ao desemprego, a travagem na degradação dos direitos e conquistas dos seus povos.
Como seria de esperar, o Conselho Europeu empurrou os problemas com a barriga, dando uma resposta em tudo semelhante às anteriores, julgando que o caminho da harmonização, o caminho forçado da dominação federalista, o caminho em que se pretende tratar como iguais economias e realidades sociais tão diferentes, o caminho do desprezo e da discriminação dos mais frágeis, o caminho dos interesses da dominação vinculando as estratégias dos grupos económicos e financeiros, o caminho de degradação social tem alguma coisa a ver com a igualdade entre os Estados ou com o progresso económico e o desenvolvimento sustentável. Nada, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados.
Percebemos recentemente que não foi só o Reino Unido que disse «Não!» a um novo tratado internacional, a um novo tratado da União Europeia, Sr. Ministro. Gostava que explicasse como é que este tratado internacional foi combinado, à margem das regras vigentes. Há outros países que começam agora a medir as consequências nacionais de inaceitáveis imposições administrativas do eixo franco-alemão. Ainda bem que começam a ter consciência!
Pela nossa parte, reafirmamos que é cada vez mais urgente alargar o debate, denunciar a vergonhosa submissão que coloca em causa aspectos essenciais da nossa soberania, resistir e dizer «Não!» a este processo de alienação da capacidade nacional de afirmar Portugal na Europa e no mundo.

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