Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

Debate com o Primeiro-Ministro

Debate com o Primeiro-Ministro que respondeu às perguntas formuladas

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Assistindo aqui a este debate quinzenal, sem dúvida interessante e pertinente, em torno das questões do BPN, sentimos uma contradição. De facto, quem nos estiver a ouvir, pensará que os problemas de Portugal, dos portugueses, neste momento, têm como prioridade — como «o» problema — a questão do BPN, com toda a sua importância, num quadro de profundas inquietações, tanto, que hoje os portugueses têm, nesse sentido.
Ainda assim, em relação ao BPN, creio que seria importante sublinhar aquilo que, do nosso ponto de vista, devia ter sido feito e não foi: quando se tratou de nacionalizar o BPN — ou seja, os prejuízos —, o Governo deveria ter considerado a nacionalização do Grupo responsável, dono desse mesmo banco, que conduziu à situação em que se encontra, para salvaguardar, de facto, os interesses dos depositantes, dos seus trabalhadores, mas também dos contribuintes portugueses. Esta devia ter sido a grande proposta.
Mas, no quadro desta contradição, e pensando no País, no momento em que se cortam salários, em que se congelam pensões e reformas, em que se cortam apoios sociais, designadamente o abono de família, em que se aumenta o IVA, em que se aumentam os transportes, em que
aumenta o custo de vida, nós verificamos que o Governo, de uma forma implacável, não só decidiu como programou, como calendarizou esses cortes e esta situação que vai atingir duramente os portugueses, mas quando se trata do capital, particularmente do sector financeiro, esse tal imposto extraordinário (não é o IRC, Sr. Primeiro-Ministro, é imposto extraordinário!), era importante… Sr. Primeiro-Ministro, tão draconiano que foi em relação às medidas que aprovou, conjuntamente com o PSD, no Orçamento do Estado, era também
importante que agora clarificasse «o quanto» e «o quando» em relação a esse imposto extraordinário!
É que fica esta ideia, Sr. Primeiro-Ministro: quando se trata de maltratar quem trabalha, os rendimentos de quem trabalha, o Governo é célere; quando se trata de fazer frente ao sector financeiro, ao capital financeiro, aí, temos um Governo titubeante e o «animal feroz», politicamente falando, desaparece para ser apenas um «cordeiro» em relação aos grandes interesses.
Responda, Sr. Primeiro-Ministro — vale a pena, ainda assim, insistir — à nossa pergunta: «quanto» e «quando», em relação ao imposto da banca?
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Numa das partes da sua resposta o Sr. Primeiro-Ministro clarificou uma situação que colide com uma afirmação do Sr. Ministro das Finanças, em relação a esse fundo a pagar pela banca, ou a essa receita a entrar no Orçamento.
O que se passa na Europa, Sr. Primeiro-Ministro — e saberá melhor do que eu —, é que estão a conceber um fundo, uma espécie de mealheiro, e não uma verba integrante no próprio Orçamento do Estado.
Ora, se está à espera — se estão à espera — da União Europeia, o resultado não vai ser brilhante!…
Em relação a uma segunda questão, Sr. Primeiro-Ministro, sabe, eu considero que V. Ex.ª é um caso perdido, no plano da coerência e no plano da própria contradição.
Muitas vezes, aqui nestes debates, de vez em quando, «levantava uma bandeira» e atirava, enfim, em relação a esta bancada, ideias: «Estão a ver?! E o PCP não valoriza esta e aquela medida que o Governo aqui tem para apresentar hoje…!».
Quantas vezes, a comunicação social, ali, naquela bancada, afirmava: «Sócrates ganhou o debate, porque apresentou uma proposta que deixou a oposição em dificuldade.». Isto, a propósito do salário mínimo nacional, salário mínimo nacional que, muitas vezes, usou como «bandeira» especial, mas, hoje, tem a «bandeira a meio pau», para não dizer que a rasgou!…
Este Governo retirou — sacou! — 15 dos 25 euros de aumento que estava acordado em sede de
concertação social com o acordo do próprio Governo.
Sr. Primeiro-Ministro, isto é uma vergonha!! É uma vergonha, de facto, para quem recebe 475 euros, para quem leva para casa 406 euros! Até esses 15 euros, Sr. Primeiro-Ministro, lhes tiraram…!
Explique lá: é por causa do impacto na competitividade das empresas…?! Foi o 0,1% de impacto que determinou essa medida?! Ou foi antes e apenas uma carga simbólica de desvalorização dos salários, como política deste Governo e como política geral que existe actualmente na União Europeia?!
Este é um problema de fundo, porque provocou uma injustiça, Sr. Primeiro-Ministro! Tendo em conta todas as medidas que tomou — e os trabalhadores, hoje, vêem reduzido o aumento do salário mínimo nacional para níveis como não se verificava há 28 anos! —, demonstra que este
Governo, afinal, não só abdicou da sua última «bandeira social» como está preparado para ofender, ainda mais, os direitos de quem trabalha, particularmente dos trabalhadores que recebem o salário mínimo nacional!

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