Projecto de Resolução N.º 1183/XII/4.ª

Criação do Laboratório Nacional do Medicamento

Criação do Laboratório Nacional do Medicamento

A política do medicamento de sucessivos Governos caracteriza-se por uma subalternização dos interesses públicos e dos utentes em benefício dos interesses da indústria farmacêutica. A política de direita colocou o país numa situação de dependência da indústria farmacêutica nas condições de disponibilização dos medicamentos aos utentes, devido à sua hegemonia no sector. Além dos aspectos relacionados com a fabricação e o fornecimento, a indústria farmacêutica domina também na investigação e na inovação na área dos medicamentos.

A posição dominante de que goza a indústria farmacêutica, sobretudo as empresas multinacionais, permite-lhe impor as suas condições e preços, para salvaguardar os seus lucros, ficando o Governo remetido para uma posição de subserviência e os interesses do país e dos doentes na dependência de estratégias comerciais.

A defesa do interesse público exige a adoção de uma política do medicamento que responda às necessidades do Serviço Nacional de Saúde e dos utentes, a otimização dos recursos públicos, a determinação de quais são as prioridades ao nível da investigação na área do medicamento face às necessidades da população. Não é a indústria farmacêutica que vai responder a estas preocupações. A indústria investiga e comercializa os seus produtos, neste caso os medicamentos, procurando obter o máximo lucro possível sem nenhuma preocupação com a saúde dos cidadãos, estabelecendo prioridades que não são as do SNS. Os interesses da indústria não são os interesses do SNS.

Conhecemos muitas situações em que a indústria impõe preços absolutamente obscenos aos Estados na aquisição de medicamentos para determinadas doenças, de que são exemplo os novos medicamentos para a hepatite C.

O encargo com medicamentos no Serviço Nacional de Saúde é bastante considerável. Em Dezembro de 2013, os encargos com medicamentos ascenderam na totalidade a 2.136 milhões de euros (ambulatório e hospitalar), o que corresponde a cerca de 25% do orçamento do Ministério da Saúde.

A acessibilidade aos medicamentos não está garantida aos utentes. Muitos utentes, sobretudo idosos, não conseguem adquirir todos os medicamentos que necessitam, fazem opções e levam só alguns medicamentos, devido aos baixos rendimentos auferidos. O peso das despesas com saúde no rendimento das famílias tem vindo a aumentar ao mesmo tempo que o investimento público na saúde diminuiu, demonstrando que há claramente uma transferência dos custos da saúde para os utentes.

O direito à saúde consagrado na Constituição da República Portuguesa engloba a acessibilidade ao medicamento, enquanto elemento essencial para a saúde e bem-estar dos portugueses.

Para cumprir este princípio, é necessário adotar uma política do medicamento que garanta o acesso universal e gratuito aos medicamentos e que o Estado abandone a posição de dependência face à indústria farmacêutica.

Só uma intervenção pública no setor do medicamento salvaguarda o interesse público e a soberania nacional. Entendemos que deve existir um reforço do investimento público na investigação e na inovação do medicamento nas instituições públicas, no meio académico, nos centros e unidades de investigação e nos estabelecimentos públicos de saúde, assim como na sua produção.

Neste sentido, o PCP propõe a criação do Laboratório Nacional do Medicamento, com vista à promoção da investigação e do conhecimento científico e à produção de medicamentos, assegurando o seu enquadramento na esfera pública. A criação do Laboratório Nacional do Medicamento contribui decisivamente para a regulação do setor, designadamente ao nível dos preços, com a introdução de medicamentos a custos mais acessíveis.

No nosso país há conhecimento e experiência que, com algum investimento, podem constituir a base para a criação do Laboratório Nacional do Medicamento. Por exemplo, o Laboratório Militar desde os anos 80 produz medicamentos para o Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente medicamentos que deixaram de ter interesse económico para a indústria farmacêutica devido ao seu baixo preço e rentabilidade, mas que continuam a ser essenciais e os mais eficazes para tratar os doentes.

Atualmente o Laboratório Militar produz 78 medicamentos para o SNS e cinco estão em avaliação. O Laboratório Militar produz estes medicamentos com preços 80% mais baixos do que os preços de mercado.

A realidade demonstra que o país tem efetivamente a necessidade de criar uma instituição para a produção de medicamentos, para responder às necessidades dos doentes; e que temos condições e conhecimento para o concretizar. Basta que haja vontade política.

Deste modo, a criação do Laboratório Nacional do Medicamento, tendo como percussor o Laboratório Militar, insere-se numa opção política que aposte na produção nacional no sector do medicamento, garantindo a produção estratégica de medicamentos essenciais, suprindo as necessidades não cobertas pela indústria farmacêutica e permitindo ainda um incremento do desenvolvimento económico e da criação de riqueza. Insere-se também numa opção política que aposte no Sistema Científico e Tecnológico Nacional no setor do medicamento, incentivando a investigação pública e a inovação terapêutica.
A criação do Laboratório Nacional do Medicamento constitui um instrumento para a dinamização do aparelho produtivo.

A criação do Laboratório Nacional do Medicamento permite ao Estado deixar de estar refém da indústria farmacêutica. É uma medida que visa salvaguardar a independência e a soberania do Estado no sector do medicamento e a concretização de uma política do medicamento centrada nos interesses públicos e dos utentes.

Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, Os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adopte a seguinte

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, a criação do Laboratório Nacional do Medicamento com a vertente de investigação e de produção no setor do medicamento, que satisfaça as necessidades dos utentes e os interesses do Serviço Nacional de Saúde.

Assembleia da República, em 12 de dezembro de 2014

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