Declaração de João Pimenta Lopes, Deputado do PCP no Parlamento Europeu

COP28 - compromissos e medidas adoptadas ficam aquém das proclamadas ambições

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Mais uma COP. Mais uma vez, os compromissos e medidas concretas adoptadas ficam aquémdas proclamadas “ambições”.

Quanto ao fundo de Perdas e Danos, o arranque não é promissor. Os recursos mobilizados para o financiar ficam muito abaixo dos valores estimados - um mínimo de 100 mil milhões de dólares anuais - como necessários anualmente para responder às necessidades dos países mais afectados pelas alterações climáticas. O anfitrião deste fundo será o Banco Mundial, por quatro anos, contrariamente ao que a maioria dos países em desenvolvimento pretendia. Falta ainda definir os critérios e regras de utilização do fundo, sendo importante que se venha a garantir que os apoios não se traduzam em empréstimos que somem dívida aos países endividados.

Quanto ao compromisso de redução faseada da dependência de combustíveis fósseis, outro tema que gerou elevada expectativa nesta COP. O compromisso final contém objectivos de sentido positivo, no que toca ao aumento da capacidade de energia renovável e à eficiência energética. Mas ficaram por abordar algumas questões decisivas: quem controla o sistema energético e a quem serve?

Quanto aos programas de mitigação e transição, estes não traduzem medidas concretaspalpáveis, antes considerações gerais.

Como em conferências anteriores ficou evidente a contradição entre os interesses das grandes potências e das multinacionais, por um lado, e os dos países em desenvolvimento, por outro.

Os primeiros, impondo uma retórica de maior ambição, rejeitam a efectiva concretização do princípio da “responsabilidade comum mas diferenciada”, procuram aprofundar instrumentos para manter o domínio e controlo sobre os países em desenvolvimento e os seus recursos, através da criação de novos mercados e produtos. Os segundos, estando comprometidos com a implementação de políticas de mitigação e adaptação, veem limitados pelos primeiros o acesso aos apoios necessários para concretizarem essas políticas.

Ora aqueles que mais recursos financeiros têm, que maiores responsabilidades históricas têm nas emissões e degradação ambiental (inclusive em países terceiros pela deslocalização de industrias ou exploração de recursos), não podem continuar a demitir-se do papel que podem e devem assumir.

A COP28 deixou intocados instrumentos perversos, como o esquema de transacção de créditos de carbono, a opção de financeirização da natureza, para o que se mobilizam milhares de milhões de verbas públicas em subvenções para os grupos económicos que faltam aos países em desenvolvimento, assim como a responsabilização individual através de conceitos como a chamada fiscalidade verde.

Concepções e orientações que não alteram as causas de fundo dos problemas ambientais comque nos confrontamos, a exploração desenfreada de recursos naturais e do ser humano que a procura incessante de lucro e de concentração de riqueza pelos grandes grupos económicos e a perseguição de posições de hegemonia e controlo de recursos sobre países terceiros pelas grandes potências ao longo da história originaram.

A solução para os problemas ambientais não pode ser encontrada sem considerar simultaneamente as dimensões económicas e sociais.

É hora de implementar medidas que sirvam simultaneamente a mitigação e adaptação às alterações climáticas, a elevação das condições económicas e sociais dos povos e as políticas de desenvolvimento soberano dos Estados.

Entre outras, e designadamente para Portugal, é necessário prosseguir a luta para:

  • Recuperar o controlo público de sectores estratégicos, como o sector energético; reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, o que pode ser conseguido através da promoção de fontes de energia alternativas no domínio público;
  • Promover políticas de mobilidade sustentável que desafiem o paradigma do transporte individual e dêem centralidade ao transporte público colectivo, alarguem a oferta e apontem à sua progressiva gratuitidade;
  • Promover a produção e consumo locais, reconhecendo o direito de cada país e de cada povo à produção e soberania em domínios essenciais como a alimentação reduzindo os circuitos de produção-comercialização-consumo e os impactos da deslocação de bens alimentares;
  • Garantir o controlo público da água e aumentar a eficácia da sua utilização;
  • Adoptar medidas urgentes de adaptação aos efeitos das alterações climáticas sobre o território nacional;
  • Recuperar o controlo público do sector de tratamento de resíduos, promovendo políticas de redução do desperdício e de combate à obsolescência programada;
  • Implementar uma abordagem normativa à redução das emissões que incida directamente sobre estas, e em que se aplique o principio da “responsabilidade comum mas diferenciada”;
  • Afirmar a luta pelo equilíbrio ambiental como intrinsecamente ligada à luta pela paz.
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