Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral

Contra as injustiças sociais!

Estamos aqui, neste já tradicional convívio e magusto anual da organização concelhia do Seixal do nosso Partido e que os camaradas de freguesia da Amora preparam com toda dedicação. Para as organizações do Partido que asseguraram esta bela iniciativa e a todos os que aqui estão presentes endereçamos as nossas mais cordiais saudações.

Esta é a primeira iniciativa realizada no concelho do Seixal após o exigente ciclo eleitoral de três eleições em que todos estivemos empenhados. Por isso, não posso deixar de aproveitar para daqui realçar o êxito alcançado neste concelho pelo nosso Partido e pela CDU em todas as eleições realizadas. Primeira força política nas eleições para o parlamento Europeu, subida de cerca de 600 votos para a Assembleia da República, reforço substancial em todas as Autarquias do concelho, nomeadamente na Câmara Municipal na qual a liderança CDU saiu ainda mais reforçada.

Por tudo isto daqui quero saudar também com uma imensa alegria os muitos construtores destes resultados, candidatos, apoiantes e activistas da CDU e o povo deste concelho que com seu voto reforçaram a sua confiança no nosso Partido e na nossa Coligação Democrática Unitária. Confiança que queremos continuar a merecer e que tudo faremos para a renovar no futuro, com mais trabalho e mais dedicação na solução dos problemas dos trabalhadores e das populações, por uma vida melhor.  

O país acabou de assistir ao debate do Programa do novo governo do PS. Novo governo e não governo novo, porque desde a sua composição às políticas apresentadas e anunciadas é o velho que permanece: – as velhas receitas, as mesmas gastas orientações políticas que ao longo destes últimos anos têm agravado os problemas nacionais.

Neste debate ficou bem patente a falta de soluções e a ausência de uma estratégia, por parte deste II governo do PS de José Sócrates para enfrentar os grandes problemas do país. Trata-se, na verdade, de um programa de continuidade agravada e de aprofundamento de algumas das mais gravosas políticas do seu anterior governo e que traz já no bojo o relançamento da ofensiva contra os direitos laborais, o mundo do trabalho e as suas condições de vida.

Um programa que não reflecte o novo quadro parlamentar e que não tira lições da perda da maioria absoluta por parte do PS. Um programa que passa ao lado de questões essenciais, em matérias como as da criação de emprego, de uma mais justa distribuição do Rendimento Nacional, de uma equilibrada política fiscal, mas também em matérias como as da defesa e valorização dos sectores produtivos e da produção nacional. Isso é desde logo bem evidente nesse já famigerado “Pacto pelo Emprego”, que é uma mão cheia de nada de medidas para a criação de emprego mas que é muito concreto na perspectiva da utilização do desemprego como argumento para avançar na concretização do Código de Trabalho, na desregulação dos horários, na redução da remuneração do trabalho e no aumento da precariedade. Uma perspectiva que a nova Ministra do Trabalho confirma em declarações desta semana, admitindo expressamente a consideração da aplicação da chamada flexigurança.

Um pacto não para o emprego mas para agravamento do desemprego, onde é clara a intenção de cavalgar na velha tese neoliberal de responsabilização dos trabalhadores efectivos e dos trabalhadores mais velhos pela situação de precariedade em que milhares de trabalhadores se encontram e pelo crescente desemprego juvenil.

Para o governo do PS as soluções para o combate ao desemprego e à precariedade não se encontram na alteração ao modelo de desenvolvimento que tem sido prosseguido e na mudança das políticas que têm sido seguidas, mas sim na responsabilização das próprias vitimas desse modelo e dessa política com a acentuação da sua exploração.

É a política do passo a passo, legislatura atrás de legislatura, sempre a apertar o torniquete que esmaga os direitos sociais e laborais e que está a criar as condições não só para impor que a democracia fique à porta das empresas, mas a alimentar uma ideologia fascizante de gestão empresarial que visa reduzir a zero os direitos dos trabalhadores e os trata como autómatos, para os sacrificar no altar da competitividade e da rentabilidade máxima do capital. São os responsáveis pela concretização destas políticas que são os autores morais dos dramas de vida a que vamos assistindo por todo lado e que tem nos acontecimentos da France Telecom o exemplo mais mediatizado.

Mas se esta é uma das pedras de toque da sua política de classe a favor do grande capital, outras há, que são igualmente a marca de água de uma política de direita, como seja a ausência no programa deste governo de uma clara vinculação a uma política de revalorização salarial. Não deixa de ser significativo que as primeiras palavras do novo Ministro da Economia, Vieira da Silva, tivessem sido para secundar e justificar as exigências de congelamento e de desvalorização dos salários e das pensões que a confederação do grande patronato quer impor como orientação para o país.

Uma política que já está em marcha a pretexto da crise e da anunciada “inflação negativa” que o governo quer fazer passar como se estivéssemos perante uma baixa generalizada de preços. Não é assim e o governo sabe disso. Sabe que muitas despesas, essenciais das famílias continuam a aumentar e a aumentar muito, como são exemplo a educação, a electricidade, os transportes e como se o índice dos preços não reflectisse também o facto de no cabaz de compras não constarem as despesas com a habitação. É por isso que perguntado aos portugueses pela baixa dos preços eles dizem que não se vê, nem se sente.

Mas também nesta matéria não é sério dizer, como se diz, que é preciso conter o crescimento dos salários em nome da competitividade das exportações, mas calar quer a sistemática valorização do euro face ao dólar e o sistemático agravamento dos preços dos factores de produção que estão na origem dos desmesurados lucros dos grandes grupos económicos e que afectam, essas sim, as condições de competitividade da nossa economia. Em vez de cortar nos salários, o governo devia empenhar-se para alterar essas situações.

Mas se todos se calam perante esta perspectiva de perpetuar as desigualdades e a injustiça na distribuição da riqueza nacional é com o PCP que os trabalhadores podem contar para levar para a frente a luta por salários dignos, nomeadamente a elevação do Salário Mínimo Nacional para 475 euros em Janeiro do próximo ano e 500 euros em 2011, conforme o já acordado e para 600 euros em 2013, conforme proposta do PCP.

É  também com o PCP que os reformados e os pensionistas podem contar pela exigência de uma mais justa valorização das reformas e dos mecanismos da sua actualização que estão a conduzir à degradação das reformas actuais e futuras. Isso está bem evidente na situação que hoje está criada e que desenvolveu uma absurda situação de maior injustiça em relação aos reformados e em relação a todos os pensionistas. 
 
As alterações impostas pelo Governo anterior, em 2006, aos critérios de actualização anual das reformas e de todas as prestações sociais que passaram a estar condicionadas ao crescimento do PIB justificam a recente decisão do Governo de suspender a sua aplicação em 2010 (já que levaria à situação absurda de redução do valor nominal das reformas!), procedendo a um aumento extraordinário das reformas de 1,25% para as pensões inferiores a 630 euros, de 1% nas de montante até 1500 euros e de congelamento do valor de todas as prestações sociais. O aumento médio das reformas decidido pelo Governo representa um crescimento médio de 4,4 euros por mês; dez cêntimos por dia para as pensões mínimas mais baixas; nove cêntimos para a pensão da actividade dos agrícolas; oito cêntimos para a pensão social.

A decisão tomada pelo Governo de manter em 2010 o valor em vigor em 2009 do Indexante de Apoios Sociais (injustamente associado ao crescimento do PIB) representa um inaceitável congelamento de todas as restantes prestações sociais com especial gravidade das que são substitutivas do rendimento do trabalho.

O carácter injusto das decisões agora tomadas pelo Governo amplia a perversidade da legislação aprovada em 2006 que condiciona o aumento do Indexante de Apoios Sociais e o aumento das reformas e de todas as prestações sociais ao crescimento do PIB. Portugal é o País da União Europeia a 27 com a média de crescimento do PIB mais baixa nos últimos anos e é paradoxalmente o único país que faz depender a actualização das pensões de tal crescimento!

Os reformados e pensionistas, os trabalhadores portugueses não podem conformar-se com estas opções que são profundamente injustas! É necessário que haja aumentos das reformas em 2010 que garantam o aumento das pensões mais baixas e a revalorização do conjunto das reformas do sector público e privado. É necessário  lutar para que seja alterada uma fórmula de actualização anual das reformas politicamente inaceitável e socialmente injusta.

Mas se para os salários e as pensões a manta é sempre curta ou não há manta, para o grande capital económico e financeiro sobra o pano, até na mesa do orçamento que os portugueses são obrigados a pagar. É um escândalo o que vai por esse mundo fora e por cá. A banca há um ano estava pelas horas da amargura diziam. Vieram os apoios e a roleta a funcionar e aí estão já a distribuir milhões de euros de lucros.

É certo que nunca faltaram milhões de lucro em todos estes últimos anos, mas em tempo de crise aguda os cinco principais bancos portugueses desde o início deste ano estão a arrecadar 5 milhões de euros por dia. Há bancos que quase quadruplicaram os lucros em apenas um ano.

À conta da crise recebem por todos os carrinhos. Pela via dos apoios que não cessam, pelos impostos que não pagam (o cálculo da própria Associação de Bancos anunciava uma média de IRC a pagar pela banca, nos primeiros seis meses deste ano de 9,6%, abaixo do escalão mínimo do IRS de um trabalhador) e pela via dos abusivos spreeds e comissões que penalizam as pequenas e médias empresas e as famílias. 

Mas não é apenas a banca, são também os outros sectores dominados pelo grande capital que vivem debaixo da protecção do poder que os serve e em condições altamente vantajosas de mercado garantido.

Agora que se anuncia a retoma do combate ao défice e dos sacrifícios para os mesmos de sempre, os portugueses têm o direito de perguntar: - quem vai pagar a factura dos apoios? Os que recebem milhões de dividendos pela via dos lucros ou os contribuintes à custa das suas condições de vida?

O governo tem que responder a esta pergunta e dizer muito claramente qual o contributo que a banca dos milhões vai dar para combater a crise. Se vamos continuar a assistir a sonantes declarações de intenção de José Sócrates de combater os paraísos fiscais e de taxação dos movimentos dos capitais especulativos na Europa e em todo o Mundo, à espera de um consenso que nunca chega, para fazer vista grossa e justificar o regabofe fiscal que por cá anda e que vai tão ao jeito dos senhores do dinheiro.
 
O governo anda ufano a anunciar a recuperação de uma décimas no crescimento económico e há meses a pronunciar para breve o fim da crise. Mas o fim da crise se está a chegar é só para a banca e para os grandes grupos económicos. Por muito que puxem pelas estatísticas que o INE acaba de divulgar o que elas confirmam é um ligeiro abrandamento do ritmo da recessão e não a superação da profunda recessão em que o país se encontra. Um país que está hoje mais debilitado e onde a gravidade da situação económica e social e dos problemas sociais nos salta à vista todos os dias, com o continuado aumento do desemprego, dos despedimentos, das situações de lay-off e dos salários em atraso.

Problemas que continuam presentes por todo o lado, como aqui no concelho do Seixal, onde se avolumam as preocupações em relação à Lusocider, SN, na Delphi, para não falar na Pioneer, onde já não trabalham mais que 30 trabalhadores. Problemas sociais graves que não encontram resposta, nem qualquer iniciativa por parte do governo em nenhuma parte do país.

A perspectiva que se apresenta, agora que está a chegar o novo ano que se dizia de viragem na crise, não é da recuperação dos atrasos do país e a solução dos seus défices e problemas sociais, mas o acentuar do processo de divergência com a Europa como se deduz das previsões da Comissão Europeia para 2010 e o avolumar do grave flagelo do desemprego.

Na verdade, não será com o programa e com as políticas que o governo apresentou que se vai dar resposta aos graves problemas que aí estão e inverter a tendência para o continuado empobrecimento relativo dos portugueses com a consequente degradação das suas condições de vida. É por isso que nós continuamos a dizer que a dimensão e a emergência dos problemas nacionais exige não a continuação da mesma política, mas sim a ruptura e a mudança. É essa questão que se continua a colocar como a questão essencial para o futuro do país. E não serão medidas pontuais ou um ou outro recuo parcial em relação a gravosas medidas tomadas no anterior governo que vão alterar a situação, nem a natureza de direita das opções e soluções políticas essenciais do II governo do PS de José Sócrates.

Não serão medidas, como, por exemplo, a do recuo parcial no acesso ao subsídio de desemprego que o governo agora anunciou, medida, aliás, de aplicação muito restritiva que continua a deixar de fora a larguíssima maioria dos trabalhadores no desemprego que vai aliviar o drama em que vivem as dezenas e dezenas de milhares de trabalhadores nesta situação.

Medidas pensadas e tomadas essencialmente para mascarar a continuidade das políticas de sempre e de preparação do terreno para manobras eleitorais futuras que uma empolada vitimização por parte do governo vai deixando adivinhar. Tal como não são as medidas apressadas de rectificação de decisões anteriores do próprio governo do PS, determinantemente motivadas pela necessidade de anular a iniciativa da Assembleia da República, como é caso das taxas moderadoras no internamento e nas cirurgias de ambulatório, que não podem apagar e iludir quer o trajecto de paulatina privatização da gestão dos serviços de saúde, como está bem patente na entrega aos privados da gestão dos hospitais públicos, nem tão pouco fazer esquecer a grave situação criada com o encerramento dos serviços, designadamente das urgências e as carências que permanecem na resposta aos mais diversos níveis do Serviço Nacional de Saúde.  

Da nossa parte, não é este recuo forçado por parte do governo do PS que nos travará no objectivo de continuar a lutar e propor a revogação das taxas moderadoras em todos os actos em que o utente dos serviços de saúde não possa decidir por si, como é o caso do exames complementares de diagnóstico por serem os médicos que os determinam.

As notícias que se sucedem sobre casos de corrupção, de tráfico de influências, de uso de cargos públicos para enriquecimento ilícito, de crimes ligados ao sistema financeiro, causam-nos uma profunda preocupação. Estas notícias dão-nos conta de uma dimensão inquietante da corrupção e da criminalidade económica e financeira e esta criminalidade corrói os alicerces da própria democracia. Inquieta-nos também que estes crimes possam ficar impunes e que a vida venha dar razão a que se diga que os poderosos escapam sempre à Justiça, porque, por uma razão ou por outra, os casos não se esclarecem e os processos  arrastam-se sem fim à vista.

É uma exigência do Estado de Direito, da Democracia, e da decência, que a Justiça tenha condições para levar todos estes casos até a um esclarecimento cabal, que sejam apuradas todas as responsabilidades, que tudo seja investigado, que seja condenado quem tiver de ser condenado e que seja ilibado quem estiver inocente. Exige-se por isso que as autoridades judiciárias possam levar as investigações até ao fim, com os meios necessários e sem quaisquer ingerências do poder político ou económico. Exige-se que haja garantias de que o Ministério Público possa conduzir as investigações necessárias com total autonomia.

As declarações feitas à Antena1 pelo Ministro da Economia, Vieira da Silva, acusando o Ministério Público de fazer “espionagem política” contra o Primeiro-Ministro, são inaceitáveis e impróprias de alguém que assume responsabilidades governativas. Essas declarações são um acto de pressão sobre as autoridades judiciárias que não pode passar em claro e que merece o mais vivo repúdio.

O combate decido à grande criminalidade no nosso país precisa, cada vez mais e com mais urgência, a consideração de outras medidas no plano legislativo que corrijam soluções, da responsabilidade de PS, PSD e CDS-PP, que se estão a revelar erradas e prejudiciais à investigação, aliás, como o PCP alertou, mas também a adopção a curto prazo de outras decisões, como o levantamento do sigilo bancário e a criminalização do enriquecimento ilícito. Este é um combate em relação ao qual os portugueses podem contar com a iniciativa e proposta legislativa do PCP como já está acontecer. 

Se temos hoje um novo governo, com uma política velha e que é um motivo de profunda preocupação, temos também uma nova situação, um novo quadro político e com novas possibilidades diferentes daquelas que se apresentavam na anterior legislatura. A perda da maioria absoluta por parte do PS, constitui um factor positivo que não pode nem deve ser subestimado na resistência à política de direita e na luta por medidas concretas de melhoramento das condições de vida.

E dizemos que se abrem novas possibilidades, não porque os trabalhadores e os portugueses se possam fiar nas promessas de todos aqueles partidos que têm estado no governo no passado, do PSD ao CDS, fazendo o mesmo que o PS tem feito e que agora se dizem decididos a avançar com medidas positivas a favor do povo, mas porque a nova situação permite dar mais eficácia à indispensável luta que é preciso continuar a travar contra a política de direita. 
 
A vida vai mostrar quanto falaciosas e quanta manobra e falsas expectativas encerram as suas promessas e quanto verdadeira é a afirmação de que é com o PCP que os trabalhadores e o povo podem contar no combate às injustiças e às desigualdades sociais. Tão falaciosas como os mistificadores convites do PS ao diálogo que nunca quis. Esse diálogo que propunha fazer dominó para todos os lados. Esse diálogo que propunha convergências à direita em pé de igualdade com os que propõe à esquerda para se desresponsabilizar e armar em vítima.

Não tenhamos dúvidas, um governo que se anuncia a governar “à bolina”, a rodar à esquerda e à direita é um governo que está a pensar governar com a direita e com o seu apoio.

Perante as políticas que se esboçam e os graves problemas sociais que se avolumam, os tempos que aí vêm são tempos de acção e de luta. Acção e luta que exigem um partido reforçado com uma intervenção firme e determinada e diversificada, capaz de responder às expectativas e aspirações a uma vida melhor para o nosso povo.

Esse é o grande desafio que temos pela frente, para que este grande partido possa continuar a afirmar com segurança que é com o PCP que os trabalhadores e o povo podem contar agora e sempre!